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Hoje é sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Ingrid Achiever e Luiz Loureiro/ Agência Primaz (*)

Fotos: Eduardo Rodrigues e Luiz Loureiro

A tradicional Procissão das Almas, ou Procissão do Miserere, é realizada anualmente aos 5 minutos do sábado da Aleluia pelas ruas de Mariana. A procissão é a encenação de duas lendas do folclore marianense.

A primeira, recolhida e publicada pelo jornalista Prof. Waldemar de Moura Santos, no livro Lendas Marianenses, conta que Maricota de Todos os Santos, mulher de língua ferina, moradora do bairro São Gonçalo, passava o dia falando da vida alheia e, por desentender-se com os vizinhos, mudou-se para a Rua Dom Silvério. Carregando má fama, fechava-se em casa durante o dia, e, à noite punha-se à janela, para no dia seguinte relatar aos quatros ventos tudo que havia visto.

Na noite de uma Sexta-feira da Paixão, ouviu o soar de um bumbo. Pendurou-se ainda mais na janela e ouviu o soar de uma matraca, acompanhada pelo canto de vozes esganiçadas.

Reza mais, reza mais

Reza novena e trezena

Reza mais, reza mais

Pra alma que morreu sem cumprir pena!

Em procissão, figuras sem rostos vestidas de negro, carregavam velas, seguindo uma cruz negra, ladeada de véus da mesma cor, que abria o cortejo. ao centro, a morte com a foice. O cortejo chegou à janela de Maricota e um dos participantes aproxima-se dela e lhe diz:

Mulher, a noite é dos mortos. Guarde esta vela para mim.

Maricota fica felicíssima, pensando ter recuperado a confiança popular. No retorno da procissão, outro participante aproxima-se dela e diz:

Mulher, guarde a sua língua, amanhã estaremos juntos em outras paragens.

Pegue a minha vela!

Na manhã seguinte Maricota procura a vela, mas encontra um osso de canela humana. Desmaia, chamam o padre e o médico, mas Maricota havia morrido.

Uma segunda versão, recolhida pela recolhida no distrito de Padre Viegas pela Profª. Hebe Rôla, fala de uma senhora que cuidava de tudo na igreja local, lá permanecendo dia e noite, foi apelidada de “Barata de Igreja”. Quando uma jovem fazendeira local formou-se no Colégio Providência, foi convidada pelo padre para secretariar as reuniões pastorais e ensinar catecismo às crianças, a velha “Barata de Igreja“ desesperou-se. Ninguém poderia substituí-la. Arquitetou, então, um plano para desmoralizar a honesta jovem, noiva de importante figura local.

Divulgou na localidade que a moça era mula sem cabeça, ou seja, namorada do padre. Como o boato não surtiu efeito, intensificou o ataque. Pegou os sapatos velhos do padre e colocou-os à noite sob a cama da moça. Assim conseguiu então seu intento: o pai expulsou a jovem de casa e o noivo desfez o casamento. Desiludida, a bela jovem transformou-se em peregrina, vivendo ao relento.

Quando voltou ao lugarejo, abatida pela falta de alimentação, não foi reconhecida. Bateu à porta de uma casa e pediu água. A caridosa alma que a atendeu, encontrou-a morta quando voltou com o copo d’água. Segundo o costume do lugar, foi velada na igreja, como acontecia com qualquer pessoa estranha. À noite, a Barata de Igreja chegou ao velório e é surpreendida pela defunta que se levanta do caixão e acusa:

Está aqui entre nós quem me caluniou! Quem me matou!

A velha caluniadeira sai correndo para se confessar, recebendo como penitência recolher as penas de todas as aves abatidas pelos moradores do município de Mariana. Tarefa cumprida, recebe do padre nova incumbência: levar os balaios de pena para o alto do Morro do Galego, esperar um vento forte espalhar as penas e aí catar tudo de novo, pena por pena. Por essa razão, na noite de Sexta-feira da Paixão ouve-se o caminhar de uma mulher resmungando:

Balaio de pena pesado.

E, junto com a figura da morte, vai a Mulher da Pena, espalhando pena pela cidade.


(*) Adaptado de texto cedido à Agência Primas pelo colaborador/colunista Prof. Cristiano Casimiro dos Santos