Tum, tum, tum: Zé Pereira! Tum, tum, tum, tum: Zé Pereira. Tum, tum, tum: Zé Pereira! Tum, tum, tum, tum, tum, tum: Zé Pereira. Praça Tiradentes, Janeiro, 1968. Ou seria fevereiro? Só sei que era tempo de carnaval. Recém chegado na cidade, viera tentar uma vaga na Escola Técnica, estava eu ali, perdido naquela praça, tentando decifrar aquele batuque diferente. Até então, de carnaval, só conhecia marchinhas, sambas e frevos. O som vinha do outro lado da Praça. Guiado pelo batuque fui descendo a interminável ladeira. Vielas tortas, igreja, uma ponte. Enfim, um largo e alegria só. E tome bumbos, caixas, taróis, cornetas e uns bonecões.
E seguiram-se vários carnavais pela Padre Faria. Em 1979 fui para a Império do Morro Santana, a mais antiga de Ouro Preto (1957), levado pelo grande compositor Vandico. Lá interpretamos vários sambas-enredos, como o belíssimo samba-afro, Mãe Preta: Urubá, Olelê Nagô. Foi assim que a Mãe Preta ensinou. Aliás, Vandico já havia composto vários sambas para a Charanga de Carlota, como o maravilhoso 1711, o engraçadíssimo Nem tudo que balança é brinquedo de criança e o samba que satirizava o encontro do Mercosul em Ouro Preto – Minhocuçu – Surucucu- Cascavel. Vandico e Edmundo Guedes são, sem dúvida, os maiores compositores da música popular ouro-pretana. E o Carnaval foi sempre a maior fonte de inspiração. Vandico, aliás, tem histórias e músicas que merecem várias crônicas.
Na verdade o refrão retratava exatamente a irreverência típica do Chacrinha, irreverência, que aliás, é a marca do carnaval e de muitas composições do Vandico. A partir do próximo ano, Vandico não foi mais convidado para fazer samba para a Escola, claro. Eu acabei fazendo o samba do próximo ano com o enredo: Carnaval de Ouro Preto: Ontem, Hoje, Zé Pereira, onde eu descrevo o Zé Pereira comandando a festa de momo e convidando todo mundo: o Banjo de Prata, O Balanço da Cobra, A Charanga de Carlota, A Bandalheira e até a Janela Elétrica, criação do fotógrafo Eduardo Trópia. O samba fala ainda de todas as Escolas e termina exaltando o Conjunto Brito Filho, que é hoje a Charanga de Lata. Como podem ver, aquele Zé Pereira Clube dos Lacaios que me encantara em 1968, já com 101 anos de existência, continua comandando a festa nos dias de hoje. Com seus 152 anos, mantém-se como o bloco de carnaval mais antigo do Brasil, em atividade. Ainda tem muito “pano pra manga” ou fantasia para falarmos do carnaval de Ouro Preto.
Jorge Adílio Pena é professor aposentado da Ufop e músico