Grupo de maior risco, idosos têm dificuldades de adaptação ao isolamento

Falta de acesso à internet aumenta tédio e solidão

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Alypio Faria gosta de passar o tempo tomando café - Foto: Lui Pereira/Agência Primaz

Desde março, com o avanço do Coronavírus no Brasil, estados e prefeituras tomaram medidas de isolamento para tentar conter a expansão das contaminações, achatar a curva de contágio e evitar a sobrecarga dos sistemas de saúde para conseguir oferecer tratamento para todos. Os idosos formam o maior grupo de risco para desenvolver complicações e muitos não conseguem acessar ferramentas de comunicação capazes de tornar o isolamento menos tedioso e solitário.

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Um consenso entre a comunidade médica e científica mundial sobre o Covid-19 é que as pessoas idosas formam o maior grupo de risco para desenvolver complicações caso sejam contaminados. Doenças crônicas, como a diabetes, cardiopatias, obesidade e tabagismo são outras patologias associadas às complicações e o aumento de mortes para essa população.

De acordo com o 15º boletim epidemiológico especial do Covid-19, no Brasil, quase 70% das mortes confirmadas pela doença são de pessoas com mais de 60 anos e mais de 60% tinham alguma doença associada. Como ainda não existe vacina eficaz para imunizar a população contra o novo vírus, o único remédio comprovado para frear a pandemia é o isolamento social.

“A gente ficou de pés e mãos amarradas, não pode sair, não pode se arriscar, não pode ficar sem a focinheira (máscara). A gente tem que ficar ai esperando pelo final, Deus permita que seja um bom final.” (Alypio Faria)

Alypio Faria tem 86 anos, ou como ele prefere dizer, quase 87 e se considera uma pessoa realizada apesar de não ter um diploma. Com cinco filhos e oito netos o aposentado construiu casas e fundou comércios na cidade de Mariana, atualmente mora com a esposa e apesar de acompanhar as notícias pela televisão, sente falta de poder bater papo com os amigos e da liberdade de sair de casa. “A gente ficou de pés e mãos amarradas, não pode sair, não pode se arriscar, não pode ficar sem a focinheira (máscara). A gente tem que ficar ai esperando pelo final, Deus permita que seja um bom final.”, confia.

Apesar de assistir  tv e ouvir músicas, o aposentado acredita que um “bom papo fiado” é a melhor coisa para se distrair e se informar. Sem acessar a internet, Seu Alypio se mantém distante das prosas comuns antes do isolamento social.

O jornalista Chico Daher tem 59 anos, não é legalmente idoso, mas possui comorbidades, por isso, também integra o grupo de risco para o Coronavírus. De acordo com um estudo recente realizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), esse é o caso de 80 milhões de brasileiros com mais de 18 anos, cerca de 57% dessa população.

Chico mora com a esposa e filha, é coordenador de comunicação da Ufop e está em home office desde março. Ele mantém uma rotina intensa de trabalhos e isso ajuda a “preencher o dia. Nem deu tempo de descobrir um novo hobby”, afirma. Entretanto “o tempo da atividade remota é diferente, porque imaginamos que funcionamos como uma máquina. O número de mensagens que você troca com os seus pares é muito maior, é cansativo. A atividade presencial é mais saudável, porque você discute aspectos do próprio trabalho, mas também tem o encontro com o outro, troca impressões e tem uma capacidade melhor de interagir com seu próximo”, explica.

Chico Daher, totalmente adaptado, não tem dificuldades em trabalhar a partir de casa - Foto: Samira Daher

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Por outro lado, vários idosos neste período perderam parte de suas rotinas e hábitos cotidianos. De acordo com Keyla Lacerda, enfermeira responsável pelo Lar São Vicente de Paulo de Ouro Preto, os idosos não recebem visitas desde o início de março. O número de visita de familiares já era reduzido e as relações sociais aconteciam principalmente graças aos voluntários que prestam serviços à unidade. Atualmente, os médicos são acionados apenas em casos de urgências e toda a equipe passou por treinamentos específicos para evitar a propagação do vírus entre os internos.

A enfermeira explica que “os idosos mais lúcidos perguntam sobre a pandemia e o que está acontecendo do lado de fora, ficaram sabendo sobre o primeiro caso em Ouro Preto e perguntam se já está acabando e como está a situação”.

Para minimizar a solidão dos idosos do lar São Vicente, Keyla conta sobre um projeto ainda em fase de implantação, em parceria com a Ufop e com a Prefeitura de Ouro Preto. O Lar conseguiu uma conexão com a internet e a doação de um computador para realizar videochamadas com parentes e voluntários. “Recebemos um primeiro computador que não funcionou bem, mas já temos a doação de outro e assim que possível faremos chamadas com eles”, explica.

Apesar do momento delicado, Seu Alypio mantém a esperança “meu pai me contava que muito tempo atrás teve um surto de Bexigueira (varíola) em Mariana, precisaram construir um cemitério só para enterrar aquelas pessoas, mas depois não teve mais, igual a Febre Espanhola, teve naquele tempo e nunca mais deu, esse vírus vai ser a mesma coisa, daqui a pouco encontram um veneno ou uma vacina para acabar com esse corona”, sorri.

Rua Dom Viçoso, 232 – Centro – Mariana/MG