O jogo e o hospital de campanha

Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “editoriais”

Compartilhe:

[wpusb layout="rounded" items="facebook, twitter, whatsapp, share"]

Não é de hoje o debate sobre a volta do futebol. De uma quarentena pouco eficaz, era de se esperar que não demorasse tanto.

Ao contrário do que muitos pensam, o futebol não é um mundo que gira em torno de seu próprio eixo, com decisões alheias ao que acontece no “mundo exterior. Principalmente no Brasil, país em que boa parte da população ainda respira o esporte e o usa como metáforas para explicar diversas situações do cotidiano. Logo, é impossível não perceber como as discussões sobre o futuro das competições de calendários estaduais e nacionais refletem o contexto que vivemos: uma sociedade que se recusa a enxergar os fatos e os estudos científicos que apontam o isolamento social como a melhor medida de combate a disseminação do coronavírus.

Hoje, o futebol se torna uma ferramenta para o “novo normal” ser instaurado no Brasil. Ignorar os quase um milhão de casos confirmados, as mais de quarenta e cinco mil mortes, vidas que foram levadas pela covid-19, única e simplesmente por um jogo. Um jogo que gira milhões de reais, é verdade, mas que não tem o menor clima para acontecer no Brasil.

Jair Bolsonaro, presidente do Brasil, é um dos defensores dessa volta e conta com o apoio de presidentes de clubes de massa, como Alexandre Campello e Rodolfo Landim, de Vasco e Flamengo, respectivamente. Se utiliza do futebol como ferramenta popular para internalizar suas ideias e preceitos.

Protocolos de ações foram criados, é verdade, mas de forma descoordenada e vazia, tudo para a volta de um campeonato que, até pouco antes da pandemia, era desvalorizado pelo seu hoje maior interessado, o Flamengo.

Botafogo e Fluminense, contrários à volta, foram votos vencidos na reunião arbitral. Não treinavam e terão que entrar em campo na próxima segunda-feira (22). Sem tempo para se preparar, colocando em risco a integridade dos atletas e ainda tendo que ouvir comentários do presidente da Ferj, Rubens Lopes, comparando a estudantes que não se prepararam para a prova, alegando que os treinos já estavam liberados há semanas.

A CBF se omitiu do caso, jogando a responsabilidade para as federações estaduais. Por quê? Porque, goste-se ou não, os Estaduais, que precisam de poucas datas para serem finalizados e os deslocamentos dos times são curtos, são os torneios que voltarão primeiro, antes do Brasileiro e da Libertadores. Mas desordenadamente, como se projeta, vai impactar nas Séries A e B e criar um calendário caótico para o futebol brasileiro em 2020.

É muito mais difícil para um país do tamanho continental programar a volta do futebol do que Espanha, Itália, Inglaterra ou Alemanha, que têm dimensões de estados brasileiros. Justamente por isso, a CBF falhou em não preparar um protocolo nacional de retorno aos jogos que evitasse, por exemplo, o que poderá ocorrer no Rio com a retomada do Carioca no pico da pandemia do novo coronavírus no estado e no Brasil.

Hoje volta o futebol no Brasil, com o Maracanã entre o jogo e um Hospital de Campanha. Poucas vezes isso poderia ser tão bem ilustrado.

(*) João Vitor Nunes, 23 anos, é jornalista no Jornal Tribuna do Leste e Rádio Manhuaçu, criador do twitter.com/lacancha_fc

Veja também:

Rua Dom Viçoso, 232 – Centro – Mariana/MG