Planejamento orçamentário familiar: uma importante ferramenta para os tempos de bonança e os tempos de crise

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Em meio aos resultados catastróficos da pandemia de COVID-19 na vida de mais de 65.000 brasileiros e brasileiras e suas famílias, um outro impacto significativo e que, infelizmente, alcançou a maior parte dos brasileiros, refere-se aos aspectos econômicos do afastamento social imposto pelas medidas de prevenção.

Enquanto na perspectiva da saúde o afastamento social, o reforço das práticas de higiene e o uso de máscaras são apontados como meios eficientes para minimizar os impactos da pandemia, quando o assunto são os impactos financeiros muito pouco ouvimos falar na imprensa e nas nossas redes sociais além do número de desempregados e da redução de salários. Parece até mesmo que não há muito o que se fazer contra esse particular impacto.

Porém, é possível aos consumidores adotarem algumas medidas capazes de minimizar (mas que infelizmente, em muitos casos, não evitará) os impactos negativos advindos dos problemas econômicos da pandemia. Sim, é possível pensarmos em adotar certas práticas relacionadas às nossas finanças como medidas de prevenção ou mitigação desses impactos.

Bom, mas esta coluna é sobre direito do consumidor, qual a relação desse tema com o consumidor? Pois bem, tudo! Afinal, a maiorias dos nossos gastos do dia a dia estão relacionados às nossas necessidades como consumidores. E é o nosso comportamento de consumo que acaba por demandar por recursos financeiros para satisfazer essas mesmas necessidades.

Nesse contexto, iremos tratar sobre a importância e como dar os primeiros passos para realizar um planejamento orçamentário familiar.

O planejamento orçamentário familiar é uma maneira muito eficaz para auxiliar o consumidor na gestão dos seus recursos financeiros, contribuindo para a redução do consumo exagerado e na manutenção do equilíbrio da economia familiar.  

Como já destacado, as necessidades de consumo são responsáveis por grande parte das dívidas dos brasileiros. Dados da Confederação Nacional do Comercio indicam que mais de 60% das famílias brasileiras estão endividadas com o pagamento de cartão de crédito, cheques pré-datados, carnês de lojas, empréstimos pessoais, parcelamento do carro, dentre outros, ou seja, grande é a chance de conhecermos alguém que esteja nesta situação.

É importante ressaltar que organizar o orçamento familiar não é garantia de sobrar mais dinheiro para outras compras, mas sim, estabelecer um mecanismo de previsibilidade de quais são os gastos possíveis e quais deverão aguardar outro momento para serem realizados. Em tempos de crise financeira essas medidas precisam ser vistas como essenciais.

Para facilitar a compreensão do tema e gerar até mesmo um debate necessário sobre a sua relevância, é importante conhecer ao menos três etapas basilares do planejamento orçamentário familiar.

A primeira etapa, e sem o qual não se torna possível realizar o planejamento do orçamento, é o engajamento de todos os membros da família.

Sim, todos os membros da família são responsáveis pela implementação e até mesmo os resultados do planejamento orçamentário. Tanto daqueles que trabalham e, por isso, colaboram ativamente para a composição dos recursos financeiros, como daqueles que, de alguma maneira, realizam as despesas. Sem esse envolvimento e compromisso, que deve ser assumido por todos os membros do grupo familiar sem exceção, certamente já no final do primeiro mês o planejamento entrará em colapso.

Uma que vez os membros da família percebam a importância e a necessidade de realização do planejamento orçamentário, todos os gastos familiares mensais devem ser devidamente identificados e separados em dois grandes grupos: os gastos permanentes e fixos e os gastos variáveis.

Como gastos permanentes deverão ser assim identificados aquelas despesas que se repetem todos os meses e que estão relacionadas, principalmente, com a contratação de serviços públicos (água, esgoto, energia elétrica e telefonia), com as despesas de supermercado, de alimentação, com o aluguel, as despesas de condomínio, bem como de internet, TV por assinatura, entre outros. E aqui, não importa o valor, todos os gastos, sem exceção, precisam ser listados e levados em consideração.

Já os gastos variáveis são aqueles que ocorrem com alguma frequência, porém não de forma contínua e permanente, por exemplo, os gastos com vestuário, sapatos, a compra de um aparelho celular, a compra de um fogão novo, aquela pizza pedida pelo delivery, o cabelereiro etc. Ah, e não se esqueça de incluir aqui os gastos com o cartão de crédito.

A identificação das despesas e a sua divisão nestes dois grupos permitirá aos consumidores conhecerem o seu padrão de gasto ou, no caso da família, o padrão de gasto familiar. Conhecido esse padrão, deve-se dar início à fase de planejamento do teto de gasto.

Nesse contexto, é muito importante que as despesas fixas representem no máximo 50% do orçamento familiar. Claro que essa é uma projeção apenas, pois em muitos casos as despesas permanentes acabam por comprometer quase que a totalidade dos recursos financeiros das famílias.

Já as despesas variáveis devem representar, no máximo, 30% do orçamento. E não mais do que isso.

Esta proporção deve variar de acordo com o impacto das despesas fixas no orçamento. Caso as despesas fixas representem 60% do orçamento, os gastos eventuais não devem ultrapassar 20%; caso as despesas fixas representem 70%, os gastos eventuais não devem superar 10%. A prioridade, portanto, deve ser sempre a garantia de recursos para as despesas fixas.

Contudo, independentemente da proporção entre as despesas fixas e eventuais é muito importante que 20% do orçamento familiar seja destinado à duas funções (e em tempos de crises financeira, é exatamente nesse ponto que o planejamento familiar faz mais falta): a reserva de emergência e a poupança. Essa proporção poderá variar de acordo com o impacto das despesas fixas no orçamento familiar, porém, entre a realização de despesas eventuais e a destinação de alguma quantia para a reserva de emergência e a poupança, deve-se dar prioridade para estas últimas.

A reserva de emergência serve para cobrir aqueles gastos excepcionais e que, por isso, não eram esperados, de modo que o consumidor tenha condições de arcar com novos custos sem que coloque em risco a sua saúde financeiras. O ideal é que 10% do orçamento mensal seja destinado a esta finalidade. Já a parcela destinada à poupança, que também deve ser de 10% deve ser encarada como uma garantia para a realização despesas que estejam contempladas no planejamento de gastos de médio e longo prazo. Por exemplo, a compra de um eletrodoméstico, um móvel para a casa, dentre outras, que por serem mais caros acabam indo para o cartão de crédito. Com uma poupança bem planejada é possível adiar temporariamente a compra de um produto de forma parcelada, evitando-se, assim, criar gastos variáveis.

Mas suponhamos que os gastos mensais, depois dos problemas econômicos advindos da pandemia, passaram a representar mais de 80% ou até mesmo 100% das despesas familiares. Como proceder?

Neste caso, será necessário a realização de um remanejamento dentro do orçamento, que precisa ser efetivado o mais rápido possível. Momento em que será essencial conhecer cada uma das fontes das despesas.

Comece pelas despesas variáveis. Sim, em momentos de redução de recursos financeiros o primeiro ajuste deve ser neste grupo de despesas. A aquisição de um novo celular, a troca de um eletrodoméstico… estes tipos de gastos não encontram pertinência neste caso.

A segunda medida é começar a rever os gastos com as despesas fixas. Avaliar formas de economia de energia (como a redução do tempo de uso do ferro de passar roupa e do chuveiro elétrico), pesquisar por planos de telefonia mais baratos, avaliar a redução do pacote de dados de acesso à internet, abrir mão da TV por assinatura, optar por produtos mais baratos na hora da compra do supermercado. Enfim, será necessário aos consumidores passarem por uma redução do padrão de vida até então adotado.

Essa mudança não é fácil e gera grandes frustrações, mas será necessária para que, neste momento, os impactos da crise econômica não gerem danos ainda maiores e que se prolonguem no tempo.

(*) Felipe Comarela Milanez é professor do curso de Direito da Universidade Federal de Ouro Preto e coordenador do Núcleo de Direito do Consumidor da UFOP.

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