ESPECIAL: Dia Mundial do Rock para os não roqueiros de Mariana e Ouro Preto

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Tal qual o dia dos namorados, o dia mundial do rock brasileiro surgiu de uma ideia muito mais mercadológica do que cultural.

Se o primeiro, mais romântico, foi criado por João Doria (pai do atual governador do estado de São Paulo), para alavancar as vendas do comércio durante o mês de junho, o segundo, com foco nos roqueiros, foi pensado por algumas rádios de São Paulo no meio da década de 90 para alavancar seu número de ouvintes com inspiração no aniversário do Live Aid — evento com vários astros da música, realizado em 1985, a fim de arrecadar fundos para auxiliar o combate à fome no continente africano. O que não quer dizer que o dia mundial do rock não seja comemorado no dia 13 de julho também em outros países (ao contrário do dia dos namorados tupiniquim, que é basicamente uma jabuticaba do calendário de vendas).

Só que ao invés de se celebrar o gênero musical, nesta data o que mais acontece é vermos jornais e blogs discutindo a morte ou não do rock. E, apesar de ser uma pauta bem batida, dá pra entender o porquê dela ainda existir: cada vez menos vemos o rock sendo agraciado pelo grande público.

Há 7 anos atrás, em 2013, o rock já perdia feio para o sertanejo nas paradas das rádio — ainda que existam divergências sobre como esses dados são coletados e tratados, como você pode conferir nesse artigo da Reverb. Uma tendência que vemos em uma escala ainda maior nas cidades do interior, onde as rádios (ainda responsáveis por criar parte da cultura musical dos pequenos municípios) focam mais no pop e no sertanejo.

Porém, acredito que discutir a morte ou a importância do rock seja pregar para convertidos. Penso que o melhor a se fazer, principalmente nesta data, seja mostrar a relevância do estilo para aqueles que de alguma forma deixaram ele de lado, ou que passam a vida ouvindo apenas as mesmas bandas da época da adolescência, dizendo que naquela época sim é que haviam bandas de rock.

Portanto, hoje, no dia mundial do rock, um pedaço considerável da minha conversa vai pra você, ex-roqueiro ou não roqueiro.

A música como válvula de escape (e o problema do sertanejo)

Estranhamente, muita gente tem descoberto só agora que algumas de suas bandas de rock favoritas sempre falaram sobre política. Isso aconteceu com alguns fãs pouco atentos do Rage Against the Machine, do Pink Floyd e até da Plebe Rude (pra não falar que a culpa é das letras em inglês). No entanto, é bom ter em mente que ter um posicionamento político e servir como válvula de escape, principalmente para a parcela mais jovem da sociedade, não é uma exclusividade do rock.

O rap também faz isso, assim como a MPB e até o Pop em alguns momentos. No entanto, o sertanejo, o ritmo mais tocado nas rádios e nos festivais locais, não costuma ir por este caminho.

Tirando os raríssimos casos de músicas como Inversão de Valores, do Milionário e José Rico (“Queria que essa gente ambiciosa, a sua ambição então freasse, num gesto de ternura e amor dos que nada possuem se lembrasse”), e do movimento Feminejo, o sertanejo, desde que largou o braço do estilo caipira e se afivelou no country, se tornou um gênero monotema, contendo em sua vasta maioria apenas letras sobre relacionamentos (quase sempre com o ponto de vista hétero e dos homens) e esquecendo completamente o meio de onde surgiu: o campo.

Nada disso seria um problema — afinal, no meio de uma pandemia mortal e o nível de desemprego lá no alto, não dá pra esperar que todo mundo tenha paciência pra música cabeçuda e engajada o tempo todo — , se não estivéssemos falando de um gênero que basicamente vem canibalizando o mercado da música e criando dificuldades para que artistas de outros estilos consigam se apresentar até mesmo em bares e casas de show, como você pode conferir na entrevista que fiz com o pessoal do coletivo Rock Generator, aqui de Mariana e Ouro Preto, e que está neste áudio aqui:

Portanto, dar mais espaço e atenção para o rock é uma maneira não apenas de valorizar quem fala de temas que nem sempre estão nas rádios (e que precisam ser discutidos dentro da arte), mas também de diversificar a própria cultura.

A diversidade do rock mineiro

Berimbau, tambor africano e viola caipira. Muita gente não espera ouvir esses instrumentos em uma música de rock, porém, não só é possível como quem fez essa mistureba foi um pessoal aqui de Minas: o Sepultura. Se você não acredita, então confira aqui a maravilhosa Kaiowas, gravada em 1993 para o brilhante Chaos A.D, um dos marcos do Heavy Metal mundial. Uma das dezenas de músicas onde o grupo formado no bairro Santa Tereza, de BH, fez questão de misturar com as guitarras e o vocal gutural, vários instrumentos da cultura nacional.

Ah, não gosta de metal? Não gosta de tambor e viola caipira? Sem problemas. Pra mostrar a enorme diversidade que temos no rock mineiro de hoje, fiz essa playlist pra você lá no Spotify com nomes como:

  • Congadar (Sete Lagoas) — mistura de rock com blues e
  • Di Souza (Belo Horizonte) — meio Mutantes, meio tudo que você
  • Churrus (S. João Del Rei) — bem rock britânico dos anos
  • 2 Dedo (Mariana) — stoner marianense com jeito de Type O Negative.
  • Seu Juvenal (Uberaba/Ouro Preto) — uma mistura de punk com outros

Confira a playlist com vários outros nomes aqui.

A força econômica (aqui mal explorada) da música independente

Por fim é bom pensarmos também no rock independente como parte de algo mais amplo: o mundo indie.

Sem apoio de gravadoras e, com isso, das rádios, as bandas indie — e vale lembrar que independente não é um gênero musical e sim a forma como a música é produzida e distribuída — costumam se juntar, criando não apenas coletivos, como também festivais, que não raro se tornam importantes para a economia local.

Em Minas posso dar 3 exemplos de cidades onde esses festivais impactam diretamente na economia da região.

Patos de Minas

Com mais de 10 edições já realizadas, o Festival Marreco, de Patos de Minas, já levou dezenas de bandas para o triângulo mineiro, atraindo milhares de pessoas interessadas em conferir todo tipo de som (sempre independente), indo de nomes como Liniker e os Caramelows (MPB) até Vurro (rock).

Brumadinho

Realizado desde 2016 no Inhotim, o MECA festival é um grande evento de tendências que mescla bandas independentes com grandes nomes da música, como Jorge Ben Jor e Elza Soares, criando uma aura que só funciona por causa dessa mistura.

Hoje o evento é tão importante para Brumadinho, que desde o rompimento da barragem de Córrego do Feijão, em 2019, a cidade vem colocado o MECA como uma das principais peças para reerguer a economia local através da cultura e turismo.

Jaboticatubas/Itabirito

Desde 1997 os mineiros fãs do rock independente têm um festival só seu: o Camping Rock.

Já tendo passado por Jaboticatubas, Itabirito, Baldim e São José de Almeida, o evento vem há mais de duas décadas atraindo um público bastante diverso para as pequenas cidades onde é realizado. E isso sempre com nomes do cenário independente do rock.

Por fim é bom pensarmos também no rock independente como parte de algo mais amplo: o mundo indie.

Geradores de Rock 100% locais

Apesar do rock na região dos inconfidentes ser mais lembrado por causa de sua versão mais pop, graças ao (muito bom) Ao Vivo do Skank, gravado na Praça Tiradentes no começo dos anos 2000, a verdade é que existe há muito tempo nomes de bandas de rock 100% locais que não contam com o mesmo prestígio que os autores de Garota Nacional e Jackie Tequila.

Criado em 2011, o coletivo Rock Generator conta com artistas das cidades de Mariana e Ouro Preto que aproveitaram espaços do bairro Cruzeiro do Sul e até do Morro da Forca para criar suas apresentações, sempre abertas ao público das cidades. Tudo com foco nos diversos segmentos do rock e também em bandas que tenham apenas músicas autorais (ou seja: sem cover).

Para quem acha que hoje em dia não existe nada de novo sendo feito no mundo do rock, acredito que vale a pena dar uma conferida no som de algumas dessas bandas que eu coloquei na playlist ali de cima e também na entrevista do áudio desse post, até para entender como é ter uma banda de rock na região e qual tipo de apoio os artistas costumam receber ou não dos agentes locais.

Dê uma chance ao rock

Com tudo isso, o que eu gostaria que você, leitor, fizesse talvez apenas hoje, pegando aí o hype do dia mundial do rock, fosse dar uma chance ao estilo.

Ouça novamente os clássicos (agora, talvez, com mais atenção), descubra novos sons e dê espaço para essa galera em suas lives, editais ou até postagens nas redes sociais.

Ah… e aproveite para comentar aqui no artigo ou nas redes sociais, quais bandas você sempre curtiu ou descobriu por aí. Já para todos aqueles que nunca deixaram de ouvir os Stones, os Beatles, o Rush, o AC/DC e nunca deixaram de dar play nos novos e antigos clássicos, We Salute You.

Kelson Douglas, Diretor criativo da I Love Pixel, fundador do Valin, o vale de inovação de Mariana e Ouro Preto, embaixador do Montreal International e lider local do Startup Weekend e da IxDA, a associação mundial de design de interação

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