O nosso legado às futuras gerações

Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “editoriais”

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Ensinamos às crianças que a natureza é perfeita, mas esquecemos, muitas vezes, de falar das nossas falhas a elas. Se somos racionais, por que aniquilamos parte do que também nos constitui? Talvez, isso venha de uma certa dificuldade para compreender o sentido do que seja razão, afeto e pertencimento, e empurramos, portanto, cotidianamente, a responsabilidade dessa reflexão para as próximas gerações. Fato é que o resultado desse entrave é gravíssimo, porque, de algum modo, ações irresponsáveis, em maior ou menor grau, têm contribuído para a destruição da nossa casa e de quem nela habita. 

A realidade mostra, já há algum tempo, que a interferência humana na natureza tem sido altamente nociva ao planeta. Alteramos paisagens; descartamos, de forma deliberada, o lixo que produzimos; poluímos o ar, a água e o solo; e não nos importamos com a vida animal. Vai desde o resto de material de construção jogado numa trilha ao desmatamento da Amazônia. Vai também dos maus-tratos com o pet do vizinho, ou do que vive na rua, ao tráfico de animal silvestre e à matança como esporte. Mas o que parece generalização, aqui, deve ser entendido como um alerta, porque o silenciamento diante das variadas ações é, em certa medida, consentimento, reforçando a gradativa perda da nossa casa e, consequentemente, da nossa humanidade.

Se entendemos que a razão está ligada à faculdade de estabelecer relações lógicas, de raciocinar, logo, estendido ao bom senso, o desmonte do planeta é necessariamente o oposto à lógica. Além disso, não estamos falando de uma propriedade particular sobre a qual teríamos, supostamente, plenos poderes, já que a Terra é o lar de milhares de seres vivos que dependem do estabelecimento de uma relação harmônica para se manter em equilíbrio, reproduzir e perpetuar as espécies. Nessa perspectiva, cada ser humano precisa olhar para si mesmo como parte importante dentro desse sistema maior, avaliando a sua interferência no meio ambiente. Ironicamente, é o único ser vivo com toda a possibilidade de destruição em massa. E se chegamos ao ponto de delimitar em uma década o prazo limite para o controle do clima no globo, isso significa que somos realmente letais. 

É o limiar da perda da razão e, consequentemente, do afeto. Falta-nos apreço pela vida, e o planeta está cada vez mais exaurido. A pandemia da Covid-19 nos obrigou a ficar em casa, e vimos animais silvestres à vontade pelas ruas de algumas cidades, pois estavam livres da nossa presença ameaçadora. O ar também ficou mais respirável nos grandes centros. Mas tudo isso vai se perdendo na medida em que retomamos os espaços. Vemos, agora, a natureza sangrar, pedindo socorro no Pantanal e em localidades dos Estados Unidos.  Em meio à cena desesperadora, grupos seguem, incansáveis, no resgaste às espécies em perigo. Eles são a esperança, para que o cenário de completa tristeza se transforme minimamente em algo bom.

 Iniciamos a segunda década, desse século, invadindo as reservas ambientais sem nenhuma espécie de pudor. E isso me faz pensar que jovens, como a ativista sueca Greta Thunberg, têm um papel importantíssimo para as gerações vindouras, visto que eles exigem mudanças efetivas para a resolução do problema provocado pelo desenfreado sistema capitalista, ao enfrentarem de frente a hostilidade dos adultos. São pessoas com a coragem de cuidar da casa que habitamos, entendendo que, em poucos anos, possa ser insustentável a vida nesse planeta, caso a mudança não ocorra agora. Esses jovens não acreditam mais, de olhos fechados, no que supostamente deixaríamos para eles. Salvo da ficção, sabem também que não há solução milagrosa para uma realidade tão preocupante, e por isso já fazem o dever de casa com responsabilidade. Sigamos o seu exemplo.

 

(*) Giseli Barros é professora, mestra em Literatura Brasileira pela UFMG, membro efetivo da ALACIB-Mariana.

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