Editorial: A conta do chá

Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “editoriais”

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A expressão popular “a conta do chá” significa “fazer o suficiente, o mínimo necessário para atingir determinado objetivo”. Na linguagem futebolística, a expressão pode ser utilizada, por exemplo, quando um time vence o adversário por 1 x 0, ou empata a partida, e com isso garante o título ou a passagem para a fase seguinte de um torneio.

A Agência Primaz de Comunicação empenhou-se para fazer a mais completa cobertura presencial das convenções dos partidos políticos em Mariana, mas constatou que praticamente todos estão fazendo “a conta do chá” na questão do preenchimento de vagas destinadas às mulheres nas chapas para a eleição à Câmara Municipal. De acordo com a legislação eleitoral, cada partido pode inscrever até 23 candidatos e candidatas ao legislativo em Mariana, número correspondente a uma vez e meia o número de integrantes da Câmara local. Pela cláusula chamada de “cota de gênero”, tornou-se obrigatório o preenchimento do percentual mínimo de 30% com candidaturas femininas.

Não possuo os requisitos para legitimar um “lugar de fala” nesta questão mas, como jornalista responsável pela Agência Primaz, arrisco-me a escrever e falar do tema, incomodado também como cidadão e por entender que a participação feminina na política não condiz com a distribuição da população por gênero, tanto em Mariana quanto no estado e no país.

Em Mariana, de acordo com as informações disponíveis na noite desta quinta-feira, dia 17, alguns partidos ainda não fecharam a composição das chapas das eleições proporcionais. Mas a Agência Primaz verificou que, pelo menos por enquanto, apenas o partido Republicanos tem candidaturas femininas em número superior ao mínimo estabelecido pela lei: são 8 mulheres e 15 homens, ou seja, apenas uma candidata à Câmara acima do piso estabelecido. Repito: pelas informações coletadas pela Agência Primaz até o momento da gravação do áudio deste editorial, os demais partidos vão apresentar candidaturas femininas que representam, no máximo, 30% do total. Durante a realização de uma das convenções que acompanhamos, houve até a tentativa de convencimento de uma filiada para aceitar se candidatar, de modo a evitar o corte de um homem aspirante à condição de candidato.

Fico me perguntando a razão da ínfima participação das mulheres marianenses na política. Em entrevista concedida na última segunda-feira, Danielly Alves, única vereadora da atual legislatura marianense – e que inclusive não é candidata à reeleição -, levantou algumas possibilidades de resposta, uma delas a de que existe preconceito entre as próprias eleitoras. Sem entrar no mérito dessa afirmação, a Agência Primaz de Comunicação entende que talvez o problema seja mais complexo, talvez seja estrutural.

Pesquisando e entrevistando algumas mulheres cujos nomes integram as chapas de diversos partidos, descobrimos que muitas foram procuradas por ocasião do prazo final de filiação partidária, ou seja, alguns meses antes da eleição, para estarem aptas à candidatura. Depois disso nenhum trabalho específico de inserção das mulheres na prática política teria sido desenvolvido.

Mas o pior mesmo é que nenhum partido tem um programa permanente e consistente de participação e engajamento das mulheres. Nada que as aproxime da militância política, que as prepare para o exercício de funções públicas ou que as insira na discussão e encaminhamento de soluções dos problemas enfrentados pela população. Não sabemos como isso se dá em outros municípios, mas é possível imaginar que não seja muito diferente.

Na verdade, o que é ruim ainda pode piorar. Em Belo Horizonte, na manhã desta quarta-feira, dia 16, o PMB, Partido da Mulher Brasileira, lançou a candidatura do… Cabo Xavier, policial militar há 26 anos, teólogo, e que diz defender o direito das mulheres mas não as pautas ideológicas femininas.

Novamente: mesmo arriscando um posicionamento sem ter “lugar de fala”, fica aqui registrado um conselho às mulheres marianenses. Sejam proativas, imponham-se e conquistem seu espaço, pois nada lhes será concedido de graça nessa sociedade patriarcal e profundamente machista. Se não forem protagonistas nessa luta por maior participação, a política marianense continuará sendo feita à base da “conta do chá”.

(*) Luiz Loureiro é jornalista, graduado pela Universidade Federal de Ouro Preto, e editor-chefe da Agência Primaz de Comunicação.

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