320 anos da construção do órgão Arp Schnitger

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O órgão Arp Schnitger, instalado na igreja da Sé, em Mariana, é um instrumento de grande importância, tanto pela sua antiguidade e comprovada autoria, quanto por ter sido objeto de um amplo trabalho de restauração. Entre os órgãos da manufatura Schnitger que sobreviveram até hoje, esse é um dos exemplares mais bem conservados e o único que se encontra fora da Europa.

Construído em 1701, em Hamburgo (Alemanha), por Arp Schnitger (1648-1719), um dos maiores construtores de órgãos de todos os tempos, o órgão passou um período em Portugal e, tendo sido colocado à venda em 1747, foi adquirido das mãos do organeiro João da Cunha pelo Rei D. João V que pretendeu enviá-lo à Mariana, mas faleceu antes disso acontecer. Assim, seu filho D. José I fez do órgão um presente à recém-criada Diocese de Mariana que, já em 1748, mantinha em seus quadros, na Sé, um mestre de capela e um organista.

O primeiro mestre de capela da catedral foi o padre Gregório dos Reis Melo, e o primeiro organista o padre Manuel da Costa Dantas. Em 1750, foram construídas as tribunas da Catedral, “se havia de assentar o órgão, para o que se havia de fazer uma varanda”, tendo o órgão soado nas cerimônias quase ininterruptamente, de 2 de julho de 1753 até 8 de dezembro de 1937.

O transporte do órgão de Portugal até o Rio de Janeiro ocorreu por navio e do Rio de Janeiro até Mariana em lombo de animais, havendo relatos bem exatos das condições de chegada: “…um órgão grande com sua caixa e talhas pertencentes a ele, que chegou em 18 caixões numerados, com as advertências precisas para se armar e também em 10 embrulhos grandes e pequenos numerados…”.

Desde sua instalação, em 1753, o órgão Arp Schnitger foi o centro de uma intensa atividade musical na Sé de Mariana, cuja memória escrita é o acervo de partituras do Museu da Música, que abriga obras de compositores do período colonial. São compositores de várias cidades do Estado e do país. Após muitos anos de funcionamento ininterrupto, nos quais por algumas vezes recebeu algumas modificações visando adaptá-lo ao gosto vigente na época, por volta da década de 30 o órgão da Sé parou de funcionar. Somente na década de 70, após pesquisas sobre a sua procedência e do reconhecimento de sua importância para o acervo de instrumentos musicais não só brasileiro, mas também mundial, foi feito um esforço concentrado para a restauração do instrumento.

Foram feitas várias restaurações no instrumento: na década de 1970 o organista alemão Karl Richter esteve em Mariana a convite do Arcebispo D. Oscar de Oliveira e do então presidente da CEMIG, Dr. Francisco Afonso Noronha para fazer uma avaliação do instrumento que continha, no interior de sua caixa, um grande número de peças originais preservadas e considerou esse instrumento um órgão muito importante, saído provavelmente da manufatura de Arp Schnitger.

Entre 1980-1984, quando, pela primeira vez, o órgão da catedral foi restaurado pela firma Beckerath Orgelbau, em Hamburgo, os tubos originais foram reparados e alguns tubos que faltavam foram substituídos por novos. Além disso, foram substituídos os antigos manuais (teclados) por novos exemplares, foi anexado um novo banco para o(a) organista e instalada, pela primeira vez, uma pedaleira. Todo o material removido foi cuidadosamente guardado e reenviado a Mariana.

Entre 2000-2002 foi realizada a segunda restauração do órgão Arp Schnitger, desta vez pela firma Edskes Orgelbau, que reconstituiu o tamanho original dos tubos e a afinação do século XVIII. Durante essa restauração (parte na Suíça e parte em Mariana), foram realizadas outras intervenções técnicas, como a troca daqueles poucos tubos de madeira do século XIX por novos tubos de metal, o retorno dos manuais originais do século XVIII (removidos entre 1980-1984), a troca do banco e da pedaleira por exemplares construídos segundo modelos do século XVIII, bem como a substituição dos tubos instalados pela Beckerath, por tubos mais próximos dos originais. Todo o material inserido pela Beckerath e removido pela Edskes também foi cuidadosamente guardado.

Finalmente em 2010, a partir de um projeto da organista Elisa Freixo, com financiamento da Prefeitura de Mariana e Conselho Municipal do Patrimônio Cultural (COMPAT), o luthier Abel Vargas reuniu as peças retiradas pelas firmas Beckerath e Edskes, que estavam encaixotadas desde 2002, e construiu o órgão do Museu da Música de Mariana, acrescentando apenas o fole, o motor, a caixa externa, mais alguns tubos e algumas outras peças para dar unidade ao instrumento. O órgão do Museu da Música é, portanto, um órgão reciclado! Hoje este instrumento está sendo usado no Santuário de Nossa Senhora do Carmo para aulas e apresentações.

A Sé de Mariana em breve estará aberta e o magnífico órgão poderá ser apreciado pela beleza e pelo som.

(*) Cristiano Casimiro dos Santos é editor da Revista Mariana Histórica e Cultural

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