Seis maneiras de não ser iludido pela política de Mariana em 2021

Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “editoriais”

Compartilhe:

[wpusb layout="rounded" items="facebook, twitter, whatsapp, share"]

Força.

Eu gostaria de começar meu primeiro texto de 2021 para a Agência Primaz desejando exatamente isso: força para você que conseguiu vencer o ano de 2020 a ponto de ter energia para ainda ler o que tem sido produzido na web e ter grana para continuar bancando a internet. Não foram todos os brasileiros e brasileiras que conseguiram isso e… bem, você viu o que aconteceu nos últimos meses, então não preciso ficar explicando muita coisa por aqui.

Também acredito que não preciso ficar explicando muito a respeito do que aconteceu na política marianense no ano passado, afinal, tem boas chances de você morar na região e saber de cor e salteado o enredo da história. No entanto, acho importante frisar que se eu pudesse resumir as eleições municipais de 2020 em uma palavra, ela seria desconfiança.

Muita gente não fez sua escolha durante as eleições por acreditar em um candidato e sim por desconfiar dos outros. E em alguns casos, a desconfiança era até maior: era de todo o sistema econômico e político ao qual estamos inseridos.

Sem entrar muito nos méritos de cada escolha, eu separaria os motivos dessa desconfiança do eleitor marianense em dois segmentos: social e neurológico.

No social temos o fato de que moramos em uma cidade pequena, com pouco mais de 60 mil habitantes, onde metade da classe trabalhadora divide os mesmos empregadores: estado ou mineradoras. E aí, neste cenário onde todo mundo conhece todo mundo, fica fácil saber um pouco mais sobre os bastidores do lado podre da política.

Indo para a neurologia, é preciso levar em consideração a quantidade de stress que uma pandemia mundial pode causar em uma comunidade. Digo isso porque, como podemos ver no texto The Neuroscience of Trust (“A neurociência da confiança”), da Harvard Business Review, quando estamos mais estressados, tendemos a interagir e arriscar menos, dando preferência para aquilo que já conhecemos. O que, no caso de uma eleição, dá menos brecha para que confiemos em novos nomes.

A questão agora é que em breve teremos uma nova eleição na cidade e é preciso estar atento para não ser iludido pela política local, tendo em vista que essa ilusão pode ser responsável por aumentar ou diminuir a nossa confiança no poder do estado em resolver os nossos problemas e melhorar a nossa qualidade de vida.

Como já trabalho com comunicação on-line há 20 anos e atuei em campanhas de âmbito estadual e municipal, resolvi pegar um pouco da minha experiência e transformar em uma pequena lista para que você, eleitor, não seja iludido pelo marketing político — que, vale dizer, não funciona apenas em épocas de eleição — em 2021.

Vamos lá.

1  – Não caia no velho conto das obras

Emprego, educação, meio ambiente… tudo isso é extremamente importante para a população, no entanto, nada disso traz tanto impacto para um político do que uma boa foto de um tratorzão abrindo uma baita d’uma estrada. Ou um vídeo de uma betoneira virando aquele caldo de concreto para uma nova obra de hospital — que, via de regra, leva anos para ser entregue.

Tratores e aquelas obras boas para parar no Instagram dos candidatos

Isso quer dizer que não devemos cobrar por obras na cidade? De maneira alguma! No entanto, quantas obras já foram entregues sem planejamento, apenas para sair bem na foto (e servir aos anseios dos donos de empreiteiras)?

É preciso cobrar obras de qualidade, que realmente resolvam a nossa vida e da forma mais permanente e sustentável possível.

2  – Seja realista quanto ao turismo em Mariana

Se tem um discurso que é completamente vazio, mas que foi utilizado à exaustão na última eleição foi o do incentivo ao turismo em Mariana.

Sejamos realistas, com base nos dados oficiais do governo apontados no Observatório do Turismo de Minas Gerais:

  • Em 2019, apenas 1712 pessoas estavam empregadas em segmentos ligados ao turismo em Mariana. Para efeitos de comparação, Ouro Preto tinha 2215.

Além disso, mesmo com um número razoavelmente baixo de empregados, é importante destacar ainda que o segmento “turístico” que mais empregava aqui na cidade é o de transporte (671 pessoas), que tem mais a ver com empresas que fazem o transporte local e das mineradoras do que de turistas em si.

A título de curiosidade, repare que todas as cidades vizinhas de Mariana participaram.

  • Mesmo Ouro Preto sendo um dos maiores cartões postais do país, a cidade conta com a participação do turismo em menos de 10% do seu PIB. Logo, dizer que a diversificação econômica de Mariana deveria partir do turismo, um setor que para nós representa uma porcentagem ainda menor no PIB, é apontar um desconhecimento completo do que acontece na cidade.
  • O nosso tão alardeado ICMS cultural não se converteu em quase nenhuma nova atração ou atualização do programa turístico do município — aliás, ele existe?
  • Nosso problema não é falta de opções de turismo. Já temos várias, em melhor ou pior situação para receber os turistas.

O nosso problema é a falta de um programa de atração destes turistas.

Colocados estes pontos, deixo claro que o investimento no turismo do município é mais do que importante, mas fique de olho em como isso será apresentado nas próximas eleições.

3  – Analise o que acontece com a nossa economia

Quem mais emprega em Mariana é o estado, não a mineração. Quem paga os maiores salários em Mariana também é o estado.

Em diversos relatórios realizados por grandes nomes como FIEMG e Fundação Getúlio Vargas, a economia de Mariana aparece há anos como sendo bastante problemática, seja por apresentar uma péssima distribuição entre os habitantes, seja por não ter nenhum tipo de resiliência perante a indústria extrativista.

No ano de 2020, durante a maior pandemia dos últimos 100 anos, tivemos cerca de 4 nomes diferentes à frente da secretaria de desenvolvimento econômico.

Pense bem a respeito destas informações.

4  – Stalkeie os políticos em busca de fake news

De acordo com vários levantamentos, a quantidade de desinformação compartilhada nas redes sociais caiu 73% depois que Donald Trump teve suas contas suspensas

Você confiaria em um candidato ou candidata que acredita em, ou divulga, informações falsas? Pois então, dê aquela stalkeada nas redes sociais para saber o que ele ou ela pensa e aproveite para ficar de olho em quem só posta foto e zero conteúdo.

Precisamos de um bom político e não um digital influencer.

5  – Fique mais atento com a comunicação institucional

Aqui o recado é mais ligado à administração atual, já que uma comunicação institucional partidária não aponta necessariamente o que um candidato pensa.

Como eu disse no ponto anterior, é importante ficar atento às notícias falsas, porém, acho problemático quando uma prefeitura começa a se comportar como uma agência de fact-checking (checagem de fatos). E o motivo é simples: não dá para acreditarmos que ela está fazendo a checagem e publicação de todas as notícias, inclusive daquelas que são verdadeiras e impactam negativamente na administração.

Ainda que o (entre muitas aspas) “serviço” de checagem de fatos seja entregue pela prefeitura, eu confiaria mais na mídia local em realizá-lo, desde que o veículo (seja ele jornal, rádio ou outro) não tenha nenhuma ligação direta com os nomes à frente da administração pública.

6  – Veja o que o seu político acha sobre o Pelourinho

Os pretos e pardos em Mariana são a maioria, assim como acontece no restante do Brasil. E, assim como também acontece no restante do país, eles compõem o grupo que recebe menos e têm menos acesso às oportunidades.

Pois bem, eu acredito que é necessário ter empatia para conseguir resolver os problemas do outro, e por isso é preciso medir o grau de empatia de um político para saber o quão empenhado ele estaria na resolução destes problemas.

Temos um pelourinho no centro histórico da cidade. Um ícone da escravidão e da crueldade humana, onde negros e negras foram espancados por brancos da elite marianense até a reta final do século XIX, quando a construção foi derrubada após a declaração do fim da escravidão no Brasil. Este monumento, ou melhor, a réplica dele, foi levantada novamente no final do período militar, sem muitas explicações para o turista interessado em saber o que de fato acontecia ali.

O passado branco, colonizador e nada glorioso, simbolizado pelo pelourinho

Acredito que como está hoje, este pelourinho — que, aliás, é um dos poucos ainda de pé em solo brasileiro — não serve para mostrar o que os antepassados dos moradores negros da cidade passaram e nem mesmo para educar as futuras gerações. Na minha opinião, a própria existência dele já é um problema, mas, acredito que ouvir do seu candidato o que ele pensa sobre o pelourinho seria uma forma de calcular o quão conectado ele está com o maior e mais abandonado grupo de Mariana.

Eu gostaria de encerrar este texto com uma pegada mais otimista quanto ao futuro de Mariana. Queria mesmo. Mas acho que ainda é cedo para dizer que iremos sair do buraco em que estamos.

Desejo novamente força para você, porque mesmo seguindo todas as dicas dessa lista, força é o que mais precisaremos para passar por esse 2020 — Parte II.

(*) Kelson Douglas é Diretor criativo da I Love Pixel, fundador do Valin, o vale de inovação de Mariana e Ouro Preto, embaixador do Montreal International e lider local do Startup Weekend e da IxDA, a associação mundial de design de interação

Veja Mais