A mística ecológica na visão do Yoga Verde: Um olhar pós-moderno para além do antropocentrismo

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A vida planetária somente pode ser compreendida pelas redes de solidariedade que a alimentam. Se olharmos para as espécies isoladamente jamais compreenderemos o todo. Esta leitura é ponto passivo entre os teóricos progressistas que estudam a ecologia.

A ciência tradicional formulou uma representação da vida como uma instância singularizada por meio de uma representação positivista. O enfoque que se homogeneizou apontou para uma visão em que as partes são mais importantes e efetivas que o todo, para se compreender a dimensão ecológica da vida. A essência da biosfera passou a ser submetida a uma mera representação racionalista, esvaziada de sua dimensão sensível e hierarquizada por categorias explicativas levadas através um olhar antropocêntrico.

A crise na visão cega do progresso defendida pela Modernidade resultou em contínuos desequilíbrios ecológicos. Para se sobrepor a este projeto destrutivo, novas perspectivas como a ecologia profunda e eco feminismo, tem ganhado cada vez mais notoriedade entre pesquisadores e ativistas.

A ênfase na visão do mundo da vida para estas novas teorias, passa a ser alicerçada na espiritualidade sutil, que vislumbra uma integração profunda da realidade com alteridade em face de outras formas de vida que sustentam a biodiversidade. Sem o místico e o espiritual, para mediar a realidade em estados de consciência para além do racional, nenhum projeto sustentável é possível.

É nessa seara que a utopia de um Yoga verde, como um projeto alternativo na pós-modernidade, vem adquirindo cada vez mais adeptos. George e Brenda Feuerstein no livro “Yoga Verde” apontam que uma há interconexão entre ativismo e consciência ambiental cujo projeto utópico visa conduzir a humanidade para uma mente sensível e espiritual em um mundo luminoso e qualitativamente mais positivo. A vida humana somente faz sentido em um mundo em que natureza e a biodiversidade não estão colocadas em lados opostos.

O yoga como filosofia mística, promove enfaticamente uma visão libertadora da racionalidade instrumental ao colocar a perspectiva do sujeito para além do ego. A mente ecológica e visão mística sincronizam-se e se colocam de forma antagônica ao senso comum da modernidade, que se assenta no “homo economicus”. É esta representação distópica que parte do falso princípio de que o homem é naturalmente mal e que coloca o indivíduo mônada mesquinho, como uma alternativa ao progresso, que segue uma lógica de coisificação do mundo e das pessoas, identificando-as apenas como recursos na lógica de maximização dos lucros.

Na visão cósmica do yoga verde, o consumismo irresponsável é criticado, pois induz a produção em escala geométrica de lixo e resíduos industriais. Por outro lado, consumo de alimentos agroecológicos, sobretudo alimentos vegetais, são considerados centrais para um mundo mais saudável. Os consumidores de carne necessitam sete vezes mais terra do que os vegetarianos e, cada quilo de carne bovina necessita de 13 mil litros de água. Além de que animais de fazenda são responsáveis por 65% da produção de gás nitroso e 18% dos gases do efeito estufa, advertem Feuerstein & Feuerstein.

A desconstrução do ego promovido pelo yoga visa compreender a nossa dimensão de seres finitos e que, portanto, da mesma forma que todas as espécies vivas, somos mediados pela experiência da morte. Não estamos apenas na condição de consumidores de alimentos, mas também somos alimentos para que outras formas de vida que precisam continuar existindo. Por isso no Yoga-sutra de Patanjali, escrito o século. III A.C. coloca como uma das principais razões do sofrimento é o apego excessivo à vida humana, termo em sânscrito designado de Abhinivesha.

A promoção da saúde do yoga integra-se também com as medicinas tradicionais xamânicas, ao encontrarem nas florestas a fonte para o equilíbrio e o bem-estar. As medicinas oriundas da floresta e os alimentos saudáveis estão entre os principais ingredientes do ayurveda.

Esta ciência médica, concebida nos períodos védicos da Antiga Índia tal como o yoga, articula-se com esta para edificar um conjunto de saberes holísticos que promovem o bem-estar e a saúde integral. O sagrado e a saúde constituem-se como partes de um mesmo universo e, por isso, acredita-se que a aplicação de técnicas corporais enseja o desbloqueio dos canais energéticos que uma vez obstruídos, podem induzir a processos patológicos.

E, por fim, para além das teses malthusianas que fazem apologia à morte, O Yoga verde propõe o controle do crescimento populacional da vida humana como parte estratégica de uma agenda ecológica para promover a vida. Esta é considerada uma condição sine qua non para estimular o ahimsa, isto é, uma ação propositiva para promover a paz e a não-violência seja para humanos ou não humanos que coabitam o planeta Terra.

(*) Sarah Tempesta é bióloga, residente em São Lourenço (MG)

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