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Hoje é sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Com alta de valores e poucas ofertas, estudantes passam aperto para encontrar moradia em Mariana

Demanda de imóveis por estudantes no retorno presencial da UFOP expõe, novamente, problema imobiliário no município

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Arte: Karla Rezende/Agência Primaz
Filas de espera, locais distantes com preços altos e, às vezes, em condições precárias. O retorno presencial das aulas para alguns estudantes da UFOP, principalmente aqueles que estudam em Mariana, veio acompanhado de dificuldades, dentre elas a carência de um local para moradia. Mesmo com auxílio moradia através das repúblicas federais e conjuntos habitacionais, além das próprias repúblicas particulares, há uma grande demanda que não está sendo atendida.

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Diante da situação de carência de oferta de imóveis para locação, muitos alunos têm buscado formas alternativas de se manter na cidade, seja através de “bate-volta”, hotéis ou, até mesmo, procurando lugares para ficar em Ouro Preto. Esse é o caso do estudante de Jornalismo, Mateus Nascimento, que está próximo de concluir o curso e resolveu, por fim, se alojar na cidade vizinha. “Assim que soube que a volta presencial seria real, entrei em contato com cinco donos e donas de kitnet em Mariana, mas tive os mesmos problemas em todas: distância do ICSA, casa em péssimo estado de conservação, ou os donos não respondiam. Por fim, decidi que seria uma boa ideia dar uma olhada em Ouro Preto”, relata.

Entre as histórias distintas dos estudantes, as similaridades são bem perceptíveis. Para além dos valores exorbitantes dos aluguéis e a falta de oferta, essas escolhas puramente adaptativas têm alterado ainda mais a rotina desses alunos em razão da necessidade de deslocamento, além da continuidade da suspensão de funcionamento do Restaurante Universitário.

É o que conta outra estudante de Jornalismo, Joyce Emanuele, que atualmente intercala suas vindas para Mariana, ficando em hotéis durante dois dias na semana. “Minha rotina tem sido um tanto atribulada. Para ‘caber’ no meu orçamento, pago duas diárias por semana em hotel, que fica em R$220,00. Saio de casa na segunda de madrugada, por volta de 3h da manhã e chego em Mariana entre 10h30 e 11h. Meu ‘check in’ inicia às 12h, ‘aí’ posso entrar para o quarto, tomar um banho, estudar, etc. O hotel me serve o café da manhã, apenas almoço e jantar eu faço dessa forma, trago marmitas prontas de casa e, quando não é possível, ou elas estragam pela viagem, compro marmitex em restaurantes da cidade. Confesso que a falta do RU tem me afetado bastante, pois não consigo a mesma qualidade alimentar que temos no restaurante universitário”, conta.

Segundo o agente imobiliário da AW Imobiliária, o que se tem percebido é um aumento desproporcional dos valores do mercado em razão da presença de grandes empresas, como Vale e a Fundação Renova, que impulsionam os preços. “Existe procura e não existe oferta. Primeiro porque os valores de aluguel em Mariana são muito caros. Se não está tendo oferta e os valores estão altos, tive procura [repúblicas], mas não tive como fechar. Eu acho que eles [estudantes] não estão conseguindo imóveis em Mariana. Muita procura por parte das empresas como a Renova e Vale, principalmente a Renova. Os valores são muito acima do valor normal de mercado. É um novo valor de mercado extremamente inflacionado. Eu vejo que a comunidade estudantil está tendo muita dificuldade”, diz.

Outra representante de imobiliária constatou um aumento no interesse por lugares menores e o avanço da procura de imóveis por parte dos funcionários das empresas. “Eu não vejo uma procura para montar república. O pessoal tem procurado apartamentos pequenos, ‘pra’ no máximo duas pessoas. Tudo que nós temos pequeno foi locado, mas antes da UFOP voltar. Então eu acho que, na realidade, foi as empresas que vieram. O profissional de fora não quer ficar alojado, quer trazer a família. Então ele prefere alugar um lugar pequeno, mais barato para que consiga ficar com a família, do que ficar locado. Praticamente eu tenho mais de dez kitnets e apartamentos menores alugados com esse intuito”, comenta.

Montagem: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Um ponto comum trazido pelas imobiliárias contactadas indica que, nesta competição entre empresas e universitários, as companhias têm capacidade de cobrir os valores requisitados, mantendo, portanto, o ciclo inflacionário. No entanto, a representante apontou que, muito além de supor que o crescimento dos valores vem em razão dos proprietários, é necessário perceber a participação de algumas imobiliárias. Além disso, ressalta que algumas dessas mesmas empresas estão entrando em processo de contestação da alta desses valores, trabalhando com avaliadores próprios. “A imobiliária hoje é um consultor. Hoje, tanto a Renova quanto a Vale trabalham com avaliadores, então além da sua avaliação, tem os avaliadores deles ‘pra’ poder chegar no valor real de mercado. Não adianta a gente fazer com que o proprietário exponha alto e depois a gente tem que que condizer com o valor que realmente o imóvel tem naquele momento”, explica.

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Atualmente, a UFOP conta com dois conjuntos habitacionais em Mariana com capacidade total para 204 residentes. Já em Ouro Preto, a universidade oferece 12 apartamentos, a Vila Universitária com 8 residências, e as repúblicas federais com 59 casas, somando 1008 residentes nas duas cidades, além dos 120 auxílios-moradia concedidos a estudantes do Campus João Monlevade. Logo, apenas 20% das vagas de moradia estão localizadas em Mariana.

Em resposta à atual situação, a pró-reitora de Assuntos Comunitários e Estudantis (Prace), Natália de Souza Lisboa, indicou a participação da instituição em uma reunião Comissão Permanente de Participação Popular da Câmara de Mariana que tinha como pauta políticas públicas de habitação e os valores de aluguéis praticados no município. “O conhecimento do assunto pela universidade surgiu por um convite da Comissão Permanente de Participação Popular da Câmara de Mariana, a partir de uma reunião realizada em 15/02/2022, com o objetivo de discutir medidas e regulamentações que podem ser aplicadas para fomentar a redução do preço dos aluguéis praticados em Mariana, a curto prazo, bem como construir formas de avaliações de aluguéis compatíveis com a condição dos imóveis e a realidade dos trabalhadores da cidade de Mariana, não levando em conta apenas o fator oferta e procura”, explicou.

Mesmo diante do estrangulamento e alta do mercado imobiliário de Mariana e Ouro Preto, a UFOP não tem planos ou outra ação efetiva. “Tendo em vista as vagas existentes nas moradias socioeconômicas e nas repúblicas federais, bem como o cenário orçamentário, atualmente não há discussão sobre auxílio moradia”, completou.

Para a estudante, Isabella Garcia, não ter um lar fixo tem causado descontentamento. Após ter cursado seu 1º período na universidade de forma online, a caloura continua buscando por um lugar acessível para morar. Enquanto isso, ela permanece no Conjunto I em Mariana, em uma vaga de acolhimento. “Eu acho um absurdo a gente só encontrar imóveis caros, que não cabem no nosso bolso. A gente é estudante! Nós dependemos um pouco da ajuda da família, de bolsas e ‘aí’ tem essas casas muito ruins, longe e em bairros que não tem boa infraestrutura”, desabafa.

A crise imobiliária impacta, também, a própria comunidade do município que precisa lidar com um alto custo de vida. Essa questão, um antigo debate, tem se intensificado cada vez mais. “E assim, não é só nós estudantes que estamos sofrendo com isso. A população de Mariana mesmo, as pessoas que moram aqui há anos, trabalham, têm família aqui, estão sofrendo. É um problema da cidade mesmo, um problema que o poder público tinha que resolver”, declara Isabella.

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