- Mariana
Novo álbum do Circovolante passeia pela memória circense da região
“O Circo de Cada Um” foi produzido a partir de consultas a partituras históricas do Acervo do Museu da Música de Mariana
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Em parceria com o Museu da Música de Mariana, João e Xisto tiveram acesso às partituras datadas do final do Séc. 19, início do Séc. 20. Essas composições foram concebidas a partir da conexão criada entre os artistas circenses que passavam pela região com seus espetáculos e os artistas locais. Xisto Siman contou um pouco sobre essas marcas deixadas pelo circo itinerante. “Os circos vinham ‘pra’ essa região de Ouro Preto e Mariana e para fazer parte dos espetáculos, para compor, ilustrar, enfeitar e abrilhantar os números, eles convidavam os músicos locais ‘pra’ tocarem nesses espetáculos. Os circos iam embora e esses músicos inspirados pela experiência que viveram no circo e por aquela música que tocava no circo naquela época, compunham as suas partituras”, narra.
Um repertório com cerca de 20 partituras foi apresentado pelos pesquisadores e musicistas Sidione Viana e Vítor Gomes do Museu da Música de Mariana. Durante a pandemia, o Circovolante ganhou o prêmio da Lei Aldir Blanc para gravação de álbuns, possibilitando a produção do “O Circo de Cada Um”. Com a participação de instrumentistas locais, letras compostas por João Pinheiro, editoração realizada por Sidione e os arranjos musicais e direção das gravações por conta de Vítor, o álbum é um projeto cultural que trabalha tradição, memórias e música.
Vale ressaltar que, segundo Xisto, naquela época não se usavam letras nas músicas, logo, as canções eram todas instrumentais. As letras do álbum buscam alcançar aquele contexto. “Então, a atmosfera que as músicas sugeriram é que deram a inspiração que possibilitaram a construção das letras. O que elas realmente tinham e essa essência do circo. Tinha algumas partituras com a levada mais poética, outras com a levada mais cômica, divertida. Muito interessante imaginar qual historinha que cada música sugeria”, conta.
João explica, também, que as letras foram construídas pensando no circo de hoje e no circo de antigamente, que apesar de estarem em momentos distintos no tempo, continuam muito presentes um no outro. “O circo tem como característica que eu acho muito valiosa que é reinterpretar o mundo. Seja através das paródias que os palhaços fazem, seja apresentando um esquete inspirado no cinema ou até músicas. É parodiando a vida, vamos dizer assim, mas me incomodava um pouco a ideia de apenas narrarmos algo do qual fazíamos parte porque somos um circo agora mais de cem anos depois, mas não somos diferentes daquele circo lá”, conta.
Assim, Xisto e João produziram “O Circo de Cada Um” transportando suas próprias experiências de circo para dentro das melodias. A dupla compartilhou algumas histórias por trás das canções. Em “Gisele”, sexta faixa do álbum, os versos sobre uma bailarina que, “faz a face corar”, também são parte das memórias dos próprios intérpretes. “A primeira vez que a gente foi junto ao circo, tinha uma mulher linda chamada Gisele. Como no circo todo mundo faz, toda mulher ‘tava’ na bilheteria, depois ela era bailarina, depois ela fazia um número e depois ela ‘tava’ ali vendendo pipoca. Ela era muito linda, tinha cílios enormes. Então assim, a música “Gisele” mesmo foi inspirada nesta moça”, detalha Xisto.
Para além das vivências pessoais, o álbum também é a construção coletiva da ideia do circo. Segundo João, este é o maior significado de “O Circo de Cada Um”, uma experiência partilhada. “São vários circos que tem aqui dentro da minha cabeça, mas eu acho que todos os seres humanos compartilham sentido de circo. Então, a impressão que eu tenho é que é meio arquetípico. Eu tenho vários circos na minha cabeça, eu tenho impressão sobre o palhaço, sobre a lona, sobre aquela visão ali romantizada, uma visão da luta do dia a dia e tenho a impressão que isso é algo de todos. O circo tem esse poder de criar vários aspectos similares em pessoas diferentes”, afirma.
“O Circo de Cada Um” está disponível em todas as plataformas digitais, dentre elas Spotify, Soundcloud e Youtube. Além disso, para ficar por dentro de todas as novidades acompanhe o Instagram e Facebook do Circovolante. Para conhecer mais da história da dupla, acesse Circo Volante: Página Inicial.
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Circovolante e a resistência da cultura durante a pandemia
Um período no qual o palco e as ruas se tornaram espaços virtuais e onde a plateia passou a assistir a vida de seu próprio esconderijo particular. A pandemia trouxe vários desafios para o campo cultural. “A classe cultural sobrevive do público, né? E a gente teve esse impacto direto no nosso labor, no nosso fazer, que é a não aproximação das pessoas que impossibilitou que a classe artística mantivesse as suas atividades”, começa Xisto em seu relato sobre a experiência do Circovolante nesses últimos dois anos.
Inicialmente, foi um processo de estudos e adequação. Apesar de já estarem familiarizados com as redes sociais, adaptar os espetáculos e as ações exigiu um cuidado em se aproximar cada vez mais do audiovisual e de uma outra linguagem. “O Circovolante já exercitava um pouco de rede antes disso. A gente não estava totalmente cru em relação a isso. Isso fez diferença, mas é uma readequação de linguagem. É tentar entender que às vezes o mínimo diz muito mais. Estamos acostumados a fazer a rua de braços abertos. Às vezes é muito mais expansiva a comunicação e esse foi um dos aspectos que a gente teve que desenvolver. A economia do texto, trabalhar o essencial. Houve uma evolução nessa busca pela síntese, na capacidade de comunicação mais precisa”, explica João.
Neste período de isolamento, o Circovolante desenvolveu diversos produtos audiovisuais. No canal é possível encontrar atividades educativas e ações com as escolas como a série de vídeos do “Circovolante Educativo” e vídeos sobre técnicas circenses. Além disso, realizaram um festival online e lançaram o documentário Samba no Pé de Moleque em parceria com a Macaca Filmes.
Outro ponto que surgiu durante essa fase foi a discussão do lugar da arte naquele momento. Muito se ouviu dessa perspectiva em que área é vista com menos importância. Contudo, vale lembrar que todas as formas artísticas, que lutaram para se manter de pé, também foram essenciais para a sobrevivência da alma. Ao ser questionado sobre essa questão, Xisto aponta a cultura como uma forma de teletransportar a mente. “A arte é que te muda ou muda o teu cotidiano, a arte é o que te leva ‘pra’ outro lugar. A arte é que faz um ponto de comunhão entre as pessoas e o momento pandêmico. Ela salvou a minha história e eu acho que ela salvou muita gente”.
João ainda complementa ao dizer que a arte está em tudo ao nosso redor e que, portanto, esse discurso anticultural é contraditório. “Se você for pegar o seu carro, o desenho dele é arte. A sua bicicleta, o seu computador, o designer, o seu celular, onde é que a arte não está? Nós temos a indústria de comércios e de todo segmentos, mas sem a arte nenhum deles conseguiria se projetar. Então o discurso antiarte é um discurso se não é político é de uma burrice extrema”, conclui.
O lançamento do álbum incentivou o desenvolvimento de mais projetos. Ao longo do ano, muitas novidades vão acontecer, dentre elas o retorno do 12º Encontro Internacional de Palhaços, que acontece de 8 a 11 de setembro, com homenageada especial que ainda será revelada. Os palhaços também farão espetáculos nas escolas. Outra boa nova é o projeto Vem Ver Mariana, onde os palhaços visitarão patrimônios históricos de Mariana, apresentando um olhar diferente e trazendo as peculiaridades destes espaços. Como uma agenda cheia e muitas expectativas, o Circovolante está pronto para abrir as cortinas e deixar o público entrar.