- Mariana
Academia Marianense de Letras, Ciências e Artes recebe novos membros
Conheça o trabalho do artista Hélio Petrus, novo membro efetivo, e do jornalista Rogério Faria, novo membro correspondente da instituição
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Em 22 de julho, a Casa de Cultura de Mariana empossou dois nomes importantes para as artes e para a intelectualidade na cidade e no estado de Minas Gerais. O artista Hélio Petrus, conhecido por seu trabalho com escultura e entalhe em madeira, tornou-se membro efetivo da Academia Marianense de Letras, Ciências e Artes, enquanto o jornalista Rogério Faria, presidente da Academia Mineira de Letras, sediada em Belo Horizonte, tornou-se membro correspondente.
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Criada em 1962, pelo jornalista e escritor Waldemar de Moura Santos, a Academia Marianense de Letras completa 60 anos em 2022. Sua primeira reunião foi chefiada por Dom Oscar de Oliveira, e teve o escritor e político Wilson Chaves como presidente por dois anos, sucedido por seu fundador, que permaneceu no cargo até seu falecimento. Entre 1986 e 2017, a Casa foi presidida pelo professor Roque Camêllo. Hoje, a presidência é de Hebe Rôla, professora emérita da UFOP.
A Academia é formada por 40 cadeiras, cuja posse é vitalícia, e que devem ser sempre preenchidas. Com o falecimento de um dos membros efetivos, há o processo de indicação de um possível nome para ocupar a vaga, sendo avaliado o seu histórico de publicações e contribuições à produção artística ou intelectual, sendo então submetido à diretoria para aprovação. Em geral, tais indicações partem dos próprios membros, mas é possível que uma sugestão seja feita por outros cidadãos, como no caso de José Benedito Donadon-Leal, atual vice-presidente da Casa, indicado (assim como outros poetas do movimento aldravista) por um artista plástico sem envolvimento com a Academia.
Sua sede fica localizada no centro da cidade, na Rua Frei Durão nº 84, em um imóvel colonial desapropriado em 1969 pelo então governador do estado de Minas Gerais, Israel Pinheiro da Silva, através do Decreto 11.653, com o propósito de abrigar a instituição. Após uma mudança de estatuto, o nome, originalmente registrado como Casa de Cultura – Academia Marianense de Letras passou a incluir as ciências e as artes, em reconhecimento de seu lugar como parte da cultura.
Com a função de congregar escritores, artistas e intelectuais da cidade mineira e sua região, a Academia promove reuniões abertas ao público ao longo do ano. Nelas ocorrem discussões sobre temas determinados em um planejamento de atividades anual. “Sempre há essa possibilidade de estabelecer debate com os participantes. Neste ano, já discutimos a respeito da poesia marianense, a história dos escravos marianenses, com o lançamento do livro do Moacir Maia. A posse do Hélio Petrus foi uma oportunidade incrível de discussão sobre a própria arte”, informa José Benedito.
Além disso, há alguns departamentos, como o Movimento Renovador de Mariana, contando com um grupo de bordadeiras que se reúne às quintas feiras, para produzir e ensinar a arte do bordado. Outro grupo é o coral Madrigal Mariana, que retornou às suas atividades em 2022, após dois anos parado devido à pandemia de covid-19, cujas apresentações costumam ocorrer em festividades católicas do município, como a Semana Santa e o Natal. Há ainda um departamento para formação de poetas e escritores, a Academia Infanto-juvenil de Letras, criada e coordenada pela professora Hebe, onde são promovidas oficinas de criação literária, com apresentações públicas, em forma de sarau.
Hélio Petrus
Nascido em 1943, no distrito de Felipe dos Santos, Hélio Petrus não imaginava que se tornaria um artista. Filho de pai comerciante e mãe professora, ele se mudou para a cidade de Mariana aos sete anos de idade e, após finalizar o curso primário, passou a estudar no Seminário Menor Nossa Senhora da Boa Morte. Segundo ele, os estudos seminaristas não foram motivados por vocação para a vida religiosa: “Foi mesmo uma questão de ensino, porque na época, década de 1950, Mariana só tinha dois institutos de ensino, o masculino [Seminário] e o feminino [Colégio das Irmãs]. Então, não tinha opção”, relembra Petrus. Apesar disso, o escultor dá crédito à formação religiosa por parte de seu conhecimento em arte sacra, além de ter contribuído para o exercício da fé e religiosidade que mantém em sua vida particular.
Hélio começou a trabalhar como professor de português e decidiu frequentar o curso de Letras, na Escola Profissionalizante do Senai, em Ouro Preto, como forma de aprofundar seus conhecimentos para a prática educacional.
Teve um curto mandato de dois anos como prefeito de Mariana, entre 1970 e 1972, ao mesmo tempo em que frequentou o curso de Direito em Lafaiete, que nunca concluiu. “A questão da política foi mesmo uma passagem intempestiva, porque eu nunca tive essa vocação, e foi [motivada pelo] convite de amigos”.
Curiosamente, foi também nesse período em que teve início a sua aproximação com o trabalho artístico, em que, influenciado pelas obras dos mestres Aleijadinho e Ataíde, começou a fazer suas primeiras experiências em madeira, utilizando o cedro como principal matéria prima. Sua primeira exposição foi realizada em 1973, em Belo Horizonte. A partir de então, passou a se dedicar inteiramente à arte. Seus 20 primeiros anos de trabalho foram solitários. “Depois eu tive a inspiração de associar jovens talentosos ao meu trabalho, formando então um ateliê, com vários ajudantes”, revela, lembrando que os grandes nomes do barroco também possuíam ajudantes, aprendizes da técnica e do estilo dos mestres. Com o ateliê, foi possível um aprimoramento de sua obra. Nas diversas peças que atendem aos pedidos de clientes e são exibidas em exposições, se observa o uso de uma vasta quantidade de materiais e técnicas.
Seu estilo, no entanto, não se resume à cópia da arte barroca carregada pela dramaticidade feita por nomes consagrados dos séculos XVII e XVIII. Classificada como neobarroca, a obra de Hélio Petrus chama a atenção por aliar a tradição à inovação ao representar figuras religiosas. “Eu procuro fazer uma releitura nos meus trabalhos imprimindo uma nova conotação de suavidade através da pátina, da policromia suave. As expressões dos meus santos, das madonas, são suaves, joviais; os querubins, os anjos são alegres”, explica o escultor, observando e apontando as peças expostas na sala de recepção do ateliê. Ele conta ainda que se sentiu mais livre ao trabalhar com o entalhe em madeira, planejando suas próprias composições visuais, enquanto nas esculturas, se apegou às tradições da representação religiosa. Alguns dos materiais também se modernizaram. Em lugar do revestimento com gesso, que se desgasta devido à ação do tempo, as peças recebem uma base de tinta látex, melhor absorvida pela madeira. Há a aplicação de uma camada de ouro, o que garante o tom dourado às imagens. Já a técnica de policromia é feita sobre a folha de ouro, trabalho realizado por colegas de profissão. Se o efeito desejado for o envelhecimento, é possível utilizar materiais como cera e graxa, explica o artista.
Em seu ateliê, localizado na Rua Dom Silvério, no centro da cidade, Hélio mostra uma imagem de São Francisco de Assis. Uma escultura similar, de sua autoria, foi entregue ao Papa Francisco pelo presidente da Embratur na ocasião da “Jornada Mundial da Juventude”, em 2013. Em outra sala, mostra uma escultura encomendada pelo Padre Fábio de Melo, um dos grandes divulgadores de sua obra, além de colecionador pessoal de diversas de suas peças. Hélio explica que já não mora na casa, preferindo deixá-la à disposição de sua arte e daqueles que procuram conhecer e adquirir as imagens. Por isso, os cômodos tiveram suas portas retiradas e suas paredes pintadas com cores vivas, o que dá ao ateliê a aparência de museu ou galeria de arte.
Hélio explica que não possui conhecimento sobre antepassados que exerceram o ofício em sua árvore genealógica, mas desconfia da possibilidade de ascendentes portugueses terem se envolvido com a arte barroca europeia. Seus filhos não herdaram a profissão do pai, mas um de seus netos, Vinícius, o ajuda com o ateliê, as vendas e com a divulgação das peças em redes sociais.
Ao explicar sua percepção quanto à prática artística, Hélio descarta a ideia de hereditariedade na arte e defende a existência de um dom que pode ser aprimorado. “Eu tenho para mim que a arte é um dom. O que pode acontecer é o aprimoramento através da técnica, do esforço pessoal. Foi o que eu procurei fazer com os meus ajudantes. Eu nunca disse que eu ensino arte. Eu procurei orientar esses jovens para o meu trabalho”.
Completando 53 anos de carreira, Hélio comemora a exibição de sua obra na sede da Casa de Cultura, intitulada “Uma Estrela do Neobarroco”, cuja abertura coincidiu com a data de sua posse como acadêmico. O escultor contabiliza cerca de 5 mil peças produzidas, dentre aquelas em exibição no ateliê e as adquiridas por colecionadores tanto no Brasil quanto no exterior. Sua indicação para a Academia Marianense de Letras, Ciências e Artes partiu da artista plástica e escritora Andréia Donadon-Leal, como forma de dar continuidade à representação das artes visuais na Academia. A cadeira número 40 tem como patrona Erna Antunes, professora de artes responsável pela formação de alguns dos principais artistas plásticos de Mariana. Em versos, sua contribuição foi relembrada por Hélio em seu discurso de posse, como define a tradição.
A exibição na sede da Casa de Cultura segue até 30 de agosto.
Rogério Faria
Nascido em 1971 em Belo Horizonte, Rogério Faria Tavares foi criado em um ambiente em que desde cedo foi incentivado à leitura. Seu pai, Expedito de Faria Tavares, era advogado, e sua mãe, Diana de Vasconcelos Faria Tavares, professora de português, latim e grego. Tinha o hábito de frequentar a Biblioteca Pública Estadual de Belo Horizonte, na Praça da Liberdade, desde a infância, com suas atividades de férias, cursos de teatro e oficinas de arte. “Essa convivência com o mundo da cultura sempre foi muito natural, talvez por ter pais sensíveis e atentos à importância da cultura na formação de um indivíduo”, afirma. Dentre os autores que marcaram as leituras daquela época, Rogério destaca Lúcia Machado de Almeida, João Carlos Marinho, Pedro Bandeira, Lygia Bojunga Nunes e Monteiro Lobato. Aos 12 anos, publicou seu primeiro livro pela Imprensa Oficial, uma novela policial chamada “A Noite dos Mascarados” (1983). Segundo conta, a história foi fruto de um exercício infantil e da paixão precoce pela escrita.
Rogério optou pelo bacharelado em Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) após terminar o ensino médio. A escolha ocorreu devido à sólida formação humanística proporcionada pelo curso. Contudo, ao concluir a graduação, em 1993, optou por seguir uma carreira profissional no jornalismo, graduando-se em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG) logo em seguida, em 1995. “Quando a gente tem 17 anos, temos à nossa frente à necessidade de escolher um curso universitário, mas provavelmente a gente ainda não tem, com essa idade, os elementos suficientes para tomar uma decisão definitiva. Eu não tive, pelo menos. Então, eu fui começar por algum lugar”, explica. Rogério comenta como sabia desde cedo que sabia que iria optar por uma formação humanística, e pensa que as profissões exercidas pelos pais podem tê-lo influenciado na escolha.
Na formação acadêmica, além de cursar especializações em instituições nacionais e internacionais, concluiu o doutorado em Literatura de Língua Portuguesa, também pela PUC-MG, em 2020. Com esta experiência, pôde entrar em contato com estudos voltados à leitura crítica de textos literários, e produziu uma tese sobre a escritora carioca Elvira Vigna.
Foi produtor de TV, repórter e apresentador, somando experiências no Canal 23, na Rede TV, na Rede Minas, na TV Justiça e na PUC TV. Ao relembrar os anos dedicados à profissão, Rogério transparece sua admiração pelo mundo de perguntas e respostas. “É como se os jornalistas fossem historiadores do presente. Eles são encarregados de registrar, para a contemporaneidade, os fatos da vida corrente. São muitas vezes os jornalistas que nos alertam, que nos esquentam a consciência dos problemas, das dores e dos dramas do mundo”, ele pontua, reconhecendo o jornalismo como uma atividade socialmente relevante. Dentre outras atividades no mercado de trabalho, destaca a atuação voltada à cultura, quando esteve à frente do BDMG Cultural, que faz parte do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais.
Sua chegada à Academia Mineira de Letras, onde ocupa a cadeira número oito, ocorreu em 2016. Assumiu o cargo de presidente em 2019, com mandato de quatro anos, e enfrenta o desafio de revitalizar uma instituição tradicional, criada ainda em 1909. Para isso, compreende os investimentos editoriais como uma forma de manter o conhecimento em circulação. Leitor de periódicos literários contemporâneos, como o Suplemento Pernambuco, o Jornal Rascunho e a revista Quatro Cinco Um, Rodrigo promove a modernização da Revista da Academia Mineira de Letras, mantida desde 1922. “O fenômeno literário hoje é complexo. Não há apenas escritores nas faixas de renda privilegiadas. Há escritoras e escritores de todos os lados, nos quilombos, nos presídios, nas periferias das grandes cidades, nas aldeias indígenas. Então, a Academia precisa escutar o fenômeno literário com atenção para não perder sua riqueza e vigor no século XXI”, declara.
Sempre robustos, com mais de 400 páginas, os volumes têm investido em uma maior diversidade de temas e autores, como demonstra seu número mais recente, que inclui os dossiês “Literaturas africanas de língua portuguesa”, organizado por ele e por Maria Nazareth Soares Fonseca, e “Poesia indígena de Minas Gerais”, organizado por Ailton Krenak e Maria Inês de Almeida. Outros empreendimentos recentes são a antologia “20 contos sobre a pandemia de 2020”, em parceria com a Autêntica Editora, e um livro em parceria com a Editora Del Rey em comemoração aos 25 anos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), com lançamento previsto para 20 de agosto. “Nós estamos em 2022. Não há mais espaço para uma instituição voltada para si mesma, cultivando o seu próprio ego. Isso não faz mais nenhum sentido”, afirma. Também por isso, mantêm-se hoje perfis da Academia nas redes sociais e um site na internet onde foram disponibilizados, de forma gratuita, todos os volumes da revista centenária.
Em reconhecimento por sua atuação frente à Academia Mineira de Letras, assim como seu trabalho com o jornalismo, a cultura e a produção intelectual, Rogério Faria foi convidado a ser membro correspondente na Academia Marianense. Seu discurso voltou-se para a importância das Academias de Letras, além do papel dos livros físicos e digitais na sociedade.
A Academia Mineira de Letras pode ser acompanhada no Facebook e Instagram. Rogério ainda mantém um perfil nas redes sociais para divulgações e publicações autorais, o Literatura na Net.