- Mariana
Câmara decreta proibição total de fogos com estampido em Mariana
Projeto aprovado retira as solenidades religiosas das exceções estabelecidas na lei aprovada em 2021
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Na última reunião ordinária do ano, realizada na quinta-feira (22), a Câmara de Mariana aprovou, por unanimidade, o Projeto de Lei nº 183, de autoria dos vereadores Juliano Duarte (Cidadania) e Ricardo Miranda (Republicanos), que modifica legislação aprovada em 2021, proibindo totalmente a utilização de fogos de artifício com estampido em qualquer tipo de solenidade, cerimônia ou evento no município. Durante a discussão da proposta, um representante da Comissão de Pais e Mães de Autistas de Mariana fez um pronunciamento, seguido da exibição de um vídeo sobre os efeitos dos estampidos em crianças e animais.
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Em 2021, o Projeto de Lei nº 23/2021, proposto pelo então prefeito interino Juliano Duarte (Cidadania), foi aprovado pela Câmara Municipal de Mariana por unanimidade, mas alterado pela emenda modificativa nº 01/2021, de autoria do vereador José Sales (PDT).
O texto aprovado, transformado na Lei nº 3.415, de 7 de abril de 2021, previa a proibição de utilização, queima e soltura de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos com estampido em todo o território de Mariana, “resguardado apenas o direito de soltura de fogos em dias de festas religiosas em eventos comemorativos em todo Município”.
Na justificativa, o autor da emenda, na condição de representante da população marianense, considerada como de maioria cristã, que professa a religião católica, argumentou que a modificação proposta buscava a preservação da cultura e dos costumes locais, listando uma série de festividades religiosas tradicionalmente realizadas na cidade e em seus distritos, assim como o réveillon de Furquim e os aniversários de fundação das bandas de música, ressaltando o dia 12 de outubro, consagrado a Nossa Senhora Aparecida, quando são realizadas grandes queimas de fogos em todo o Brasil.
Para a compatibilização do texto da lei, a emenda ainda estabeleceu a retirada do parágrafo 2º, que estabelecia, como ressalva, a possibilidade de uso fogos de artifício chamados fogos de vista, que não causam poluição.
No projeto aprovado na quinta-feira (22), encaminhado para a sanção do Executivo Municipal, o texto retorna à redação proposta em 2021, retirando a exceção feita às festas religiosas e restabelecendo o parágrafo 2º do artigo 1º.
Justificativa e discussão do projeto de lei
Na apresentação da justificativa do Projeto de Lei nº 183/2022, os autores referem-se ao oficio encaminhado à Câmara de Mariana pela Comissão de Pais e Mães de Autistas, pela Comissão de Defesa dos Animais, pelo Conselho de Proteção Animal, e pelas ONG’s (Organizações Não Governamentais) IDDA e Cãodominio, solicitando a revisão do artigo 2º da Lei nº 3.415/2022, acompanhada de petição online com 543 assinaturas digitais e de ofício da Arquidiocese de Mariana, concordando com a proibição total do uso de fogos de artifício com efeito sonoro.
Adicionalmente, foi junto ao ofício, uma comunicação da Sociedade Musical São Sebastião, de Passagem de Mariana, informando a não utilização de fogos de artifício em sua festividade de aniversário, ocorrida em janeiro deste ano, renunciando à prerrogativa estabelecida na Lei nº 3.415.
Na discussão do PL 183/2022, Ricardo Miranda fez manifestação em nome das entidades signatárias do pedido, bem como dos idosos, ressaltou alguns aspectos relacionados aos cães, chamados de melhores amigos do homem, e em relação aos costumes e fé religiosa.
Para Ricardo, “já que estamos falando da questão da causa dos animais, você faria mal ‘pro’ seu melhor amigo? Acredito que nenhum de nós faríamos. E a gente sabe que a questão dos fogos não diminui a fé de ninguém. Então, o que dizer de uma pessoa que não soltou fogos? A fé dela é menor do que a outra [que soltou]?”, questionou o também autor do projeto de lei, ressaltando que, como no caso do ovo de Páscoa, muitas vezes houve apropriação comercial de festividades religiosas.
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Referindo-se aos portadores do espectro autista, o vereador solicitou permissão para um pronunciamento de Alessander Lopes Thomaz, representando a Comissão de Pais e Mães de Autistas.
Autorizado pela Presidência da Câmara, Alessander, autista e pai de um menino autista, declarou sua dificuldade de estar no ambiente, devido ao barulho produzido pela assistência, nos corredores da Câmara e, até mesmo, dos pronunciamentos dos vereadores. “Essa causa é muito, muito crítica ‘pra’ gente. Eu estou aqui na plenária agora, e fiquei um pouco incomodado, esse barulho de corredor, com barulho da Mesa falando, querendo prestar atenção… Já me incomoda muito”, afirmou.
Em relação às crianças, Alessander mencionou os sustos e as dificuldades para acalmá-las, ressaltando a importância de se evitar tais situações. “Vocês imaginam o som inesperado que é um fogo de artifício? É muito crítico, porque as nossas crianças, muitas vezes, elas entram em crise. Quando uma criança entra em crise, não sei se vocês presenciaram, é desesperador! O conselho que a gente tem é tentar segurar a criança ao máximo, não deixar ela entrar em crise. Mas quando a criança entra em crise, ela se bate, se machuca, agride os outros. E não tem o que fazer, a gente tem que esperar a crise passar”.
Solicitando a aprovação do projeto de lei, o representante da comissão enfatizou o posicionamento da Arquidiocese de Mariana e recorreu ao ditado do ‘é melhor prevenir que remediar’, lembrando a infinidade de eventos que podem ser considerados religiosos, fazendo com que, na prática, a exceção se torne regra.
“Quando é uma coisa que a gente consegue controlar, a gente evita ao máximo. Mas quando é um fogo de artifício, que é do nada, a gente não tem controle. (…) A igreja católica mesmo deu um parecer que a gente anexou, né? A igreja já considera essa prática ultrapassada, e a exceção é muito crítica. Porque se você permite uma exceção para eventos religiosos a gente tem dezenas, talvez centenas de santos na Igreja Católica. Se pegar os orixás das raízes africanas, tem também de dezenas de orixás. Em todas as religiões, provavelmente, todo dia vai ter mais de uma entidade, uma divindade, um santo, alguma figura religiosa. Então na prática não tem a exceção, acaba virando regra”, argumentou Alessander.
Veja o vídeo produzido pelo vereador Ricardo Miranda, exibido durante a discussão do projeto de lei:
Lembrando que existem fogos sem estampido, Juliano Duarte mencionou a dificuldade de aplicação da lei, em decorrência da exceção incluída na lei anterior. “A lei foi aprovada, porém não em sua totalidade, permitindo que, em certas datas, os fogos pudessem ser soltos. E acabamos tendo uma dificuldade de fiscalização por parte da polícia e da Guarda Municipal. Os fogos atingem principalmente idosos, autistas, crianças, animais e doentes. O risco de ocorrer acidentes é muito grande, e várias cidades do país já proibiram por completo a utilização de fogos. É uma cultura completamente ultrapassada. Quer soltar fogos? Hoje, nós temos fogos sem estampido”, declarou o atual presidente da Câmara.
Antes de colocar a matéria em votação, Juliano mencionou sua própria postura, em eventos e inaugurações ocorridas durante seus 18 meses de mandato, bem como uma experiência recente, em um evento esportivo. “Na minha gestão, não autorizei nenhuma soltura de fogos. Fui em um evento em Monsenhor Horta, com a minha cachorra, soltaram uma bateria de foguetes lá e eu quase a perdi, porque ela sumiu. Graças a Deus a encontrei. Vi lá mães tampando o ouvido das crianças e pensei ‘Isso é legal? Que graça que tem?’. Há outras formas de se comemorar”.
Legislação municipal anterior
A aprovação da Lei nº 3.415, em 2021, havia revogado a Lei nº 2.276, de 7 de julho de 2009, que proibia “a queima de fogos de artifício, rojões e explosivos de qualquer natureza, no Centro Histórico de Mariana”
Sancionada por Roque Camêllo, a lei considerava como “Centro Histórico aquele definido pela Portaria 66 de 26/06/2009 do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional” (IPHAN), atribuindo a fiscalização e autuação ao Serviço de Fiscalização de Posturas Municipais e à Guarda Municipal, além de determinar que, em “todo e qualquer evento, para o qual a queima de fogos for liberada, a atividade deverá ser acompanhada pela Polícia Militar, Guarda Municipal ou Corpo de Bombeiros”.
Em Ouro Preto, um projeto de lei de proibição de fogos, apresentado em 2021 pela vereadora Lilian França (PDT) ainda se encontra em tramitação, a despeito de uma consulta popular, realizada pela Prefeitura Municipal, no mesmo ano, ter apontado apenas 6% dos respondentes contrários à proibição.
Entretanto, de acordo com apuração feita pela Agência Primaz, o réveillon deste ano, na praça Tiradentes, será realizado com a utilização de artefatos sem pólvora e sem emissão de ruído.