Notícias de Mariana, Ouro Preto e região

Hoje é sábado, 23 de novembro de 2024

Operação da Polícia Federal não tem conotação política, afirma Procurador Jurídico de Mariana

Em encontro com a imprensa, realizado nessa terça-feira (23), Juliano Barbosa esclareceu os motivos da ação, determinada pela Justiça Federal

Compartilhe

Sobre fundo branco, a logomarca da Agência Primaz, em preto, e a logomarca do programa Google Local Wev, em azul, com linhas com inclinações diferentes, em cores diversasde cores diversas
Encontro do Procurador Jurídico com a imprensa teve o objetivo de esclarecer a finalidade de operação da Polícia Federal em Mariana
Juliano Barbosa pediu que a população permaneça tranquila, uma vez que a operação da Polícia Federal não afeta a Administração Municipal – Foto: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Ao lado de Alex Bruno, Assessor Técnico de Comunicação da Secretaria de Governo, e de Juliana Flávia Cardoso, advogada da Procuradoria Jurídica Municipal, Juliano Barbosa recebeu os veículos de comunicação locais e regionais na manhã dessa terça-feira (23), para prestar esclarecimentos a respeito da operação da Polícia Federal, em Mariana, agendada para ter início na próxima segunda-feira (29). De acordo com o Procurador Jurídico, é necessário que a população marianense entenda os reais propósitos da investigação, que não tem qualquer relação com a já instável situação política do município. Juliano ressaltou, ainda, eu a posição da Administração Municipal é de total transparência, e que a Prefeitura e a Câmara, enquanto instituições, sequer figuram como parte da ação judicial proposta pela Fundação Renova.

*** Continua depois da publicidade ***

*** 

A gente está querendo tratar essa coisa com muita transparência. Não é alvo o governo do Leitão [Edson Agostinho] ou de ex-prefeitos, [quero] deixar isso muito claro. A Renova está buscando, via a Polícia Federal, que as declarações do Novel sejam avaliadas a fundo, e parece que nós tamo tratando de número de 4 mil declarações de Mariana, de pessoas que procuraram o Novel, para se cadastrar, para receber suas possíveis indenizações, e talvez alguma fraude tenha sido detectada, mas ela precisa ser ratificada. (…) Então, volto a frisar, não é o governo do Leitão, não é sobre governos anteriores. Não envolve atos de secretários, envolve as declarações que foram emitidas, e quem as emitiu, óbvio”, ressaltou o Procurador Jurídico.

Em contatos preliminares, com a Polícia Federal, ficou estabelecido que a força-tarefa vai iniciar seus trabalhos, em Mariana, na próxima segunda-feira (29), de acordo com a decisão do Dr. Michael Procópio Ribeiro Alves Avelar, da 4ª Vara Federal Cível e Agrária da Subseção Judiciária de Belo Horizonte, emitida em 16 de maio deste ano.

De acordo com a decisão judicial, no período de 29 de maio a 06 de julho, duas peritas da A. T. Kearney Consultoria de Gestão Empresarial Ltda, vão fazer diligências em diversos órgãos de Mariana e Barra Longa, em atendimento à solicitação da Fundação Renova, para obter informações e documentos que comprovem, ou não, as informações cadastradas no Sistema Indenizatório Simplificado – NOVEL.

A Polícia Federal está vindo a Mariana, como já foi em outras cidades, para obter essas informações e ela precisa ter acesso aos bancos de dados públicos, seja da Câmara Municipal, seja da Prefeitura de Mariana”, informou Juliano Barbosa.

O que tem que ser dito aqui, é que a transparência, os documentos, computadores, tudo que ela [perita] quiser lacrar e levar, ela vai levar. A bem da verdade, nós não temos nada a esconder. Por isso, a gente frisa muito, não é uma ação contra governos e sim contra a questão das indenizações da Novel, e a gente entende que a Renova tem todo o direito de questionar. (…) Então, que pena que chegou a isso, talvez as coisas poderiam ter um outro caminho. Mas, paciência, a gente tem que entender, e acatar. A gente sabe que a decisão do judicial se cumpre, não é para ficar discutindo”, acrescentou.

Inscreva-se nos grupos de WhatsApp para receber notificações de publicações da Agência Primaz.

Tanto Juliana Cardoso quanto Juliano Barbosa fizeram questão de frisar que a Prefeitura, assim como a Câmara, não são investigadas no processo judicial, mas foram citadas como instrumento de verificação da veracidade das informações prestadas, assim como gabinetes de vereadores e cartórios da cidade. “Nós não fazemos parte do processo, nós fomos só comunicados, tendo em vista que as declarações são de Mariana. Foram dadas, talvez, através de órgãos públicos, de agentes políticos, então a determinação vem para a gente franquear [as documentações e informações]. (…) As secretarias não são investigadas. Quem são os investigados são os 4 mil que emitiram as declarações. Nós só somos produtores de documentos que podem corroborar ou desmentir a declaração feita. Então, nós não somos investigados em nenhum ponto. (…) Só somos o meio para se descobrir a verdade, se aquilo que foi dito é verdade ou mentira”.

Decisão judicial

A ação judicial foi iniciada a partir da denúncia feita pela Fundação Renova, de indícios de irregularidades em documentos registrados no Sistema Indenizatório Simplificado – NOVEL, instituído também por decisão judicial, para análise dos pedidos de indenização decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em novembro de 2015.

Em função disso, e a partir de petição da empresa de consultoria, foi deferida a solicitação de realização de diligências, em Mariana, sendo citados diversos órgãos como secretarias municipais (Administração, Cultura, Defesa Social e Desenvolvimento Social), setores de protocolo e arquivo da Prefeitura e da Câmara, gabinetes de vereadores e cartórios.

A Secretaria de Desenvolvimento Social e Cidadania foi um dos setores da administração municipal relacionados como fonte de consulta de documentos pela Polícia Federal

De acordo com o deferimento do Juiz Michael Avelar, “os órgãos em questão deverão disponibilizar à perita, na data da solicitação, quaisquer informações, realizar entrevistas e entregar as documentações solicitadas pela equipe pericial”, de modo a comprovar a veracidade da “documentação emitida por agentes públicos e órgãos públicos”.

Está estabelecido, na decisão, que, “na eventualidade de que algum documento não seja encontrado no momento da diligência em campo, os órgãos aos quais tenham sido encaminhados os ofícios deverão diligenciar para fornecê-lo posteriormente aos peritos, em até 5 dias corridos ao da primeira atividade de pesquisa que tiver sido frustrada”.

Por fim, além de determinar que o trabalho de perícia seja acompanhado pelas polícias militares federal e estadual, o Juiz Michael Avelar adverte que “a ausência de colaboração injustificada ensejará a instauração de apuração por crime de responsabilidade, improbidade administrativa e crime de desobediência(em negrito no original).

*** Continua depois da publicidade ***

Supostas irregularidades em documentação do Novel

Juliano Barbosa, informou que não teve acesso ao total ao processo, uma vez que a Prefeitura não é investigada, mas revelou ter conhecimento de algumas possíveis irregularidades apontadas na investigação. “Representando o município, como Procurador Geral, eu nunca tive acesso ao processo e nem a essas declarações. (…) [Mas], pelo que eu consegui acompanhar no decorrer do processo, existem falsificações grosseiras, de alterar documentos originais das pessoas”, ressaltando que não acredita na possibilidade de existência de declarações emitidas por agentes públicos que não sejam embasadas em sistemas oficiais, como cadastros do Data SUS (Sistema único de Saúde) ou do Bolsa Família.

Caso sejam encontrados indícios de conduta indevida de servidores, o Procurador Jurídico afirmou que serão tomadas providências internas para apuração das responsabilidades. “Sem ainda adentrar muito, se foi identificado [comportamento de improbidade administrativa], se a Justiça manifestar que algum servidor público forjou [documentos] aí nós teríamos que tomar, via Controladoria Geral do Município, via Corregedoria, algum processo administrativo. Em qualquer outra situação, se não tem envolvimento do servidor nisso, vai ficar tudo na esfera da Justiça Federal”, afirmou Juliano Barbosa.

Por e-mail, a Agência Primaz solicitou esclarecimentos à Fundação Renova, em relação a:

– Quais tipos de supostas irregularidades foram detectadas em documentos registrados no Sistema Novel, especificamente relativos a requerentes com domicílio em Mariana?

– Quantos desses requerentes, ainda no caso específico de Mariana, já receberam ou ainda recebem indenizações da Fundação Renova?

– A avaliação feita pela Fundação Renova foi feita por amostragem ou na totalidade dos documentos apresentados por requerentes com domicílio em Mariana?

– De acordo com a análise feita pela Fundação Renova, quantos requerentes, com domicílio no município de Mariana, tiveram sua documentação considerada isenta de supostas irregularidades.

Em resposta, também por e-mail, a Renova respondeu apenas que “A Fundação Renova reforça seu compromisso na reparação dos atingidos em atendimento ao Termo de Transação e de Ajustamento de Conduta (TTAC). Dentro deste objetivo, os casos identificados de possíveis irregularidades em solicitações de indenizações são encaminhados para apuração e providências das autoridades competentes”.

Fernando Sampaio e Tenente Freitas

Fernando Sampaio (PSB), atual presidente da Câmara de Mariana, e Antônio Marcos Ramos de Freitas, ex-vereador e ex-secretário municipal de Segurança Pública, foram nominalmente citados, com a inclusão de seus gabinetes parlamentares listados entre os locais para as diligências da operação da Polícia Federal.

Tenente Freitas ocupou a Secretaria de Segurança Pública durante os governos interinos de Juliano Duarte e Ronaldo Bento (PSB)
Tenente Freitas ocupou a Secretaria de Segurança Pública durante os governos interinos de Juliano Duarte e Ronaldo Bento (PSB) – Foto: Luiz Loureiro/Arquivo Agência Primaz

Candidato a vice-prefeito na eleição municipal de 2020, integrando a chapa encabeçada por Newton Godoy (Cidadania), Tenente Freitas não dispõe mais de um gabinete parlamentar, tendo chefiado a Secretaria Municipal de Segurança Pública, em 2021 e 2022, durante os governos interinos de Juliano Duarte (Cidadania) e Ronaldo Bento (PSB).

Em contato telefônico com a reportagem da Agência Primaz, o atual integrante da Guarda Civil Municipal, revelou que forneceu declarações para utilização no Novel já como secretário municipal, ressaltando que elas eram baseadas em autodeclarações dos interessados, na condição de atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão.

Como secretário eu fiz declarações afirmando isso, que as pessoas realmente me procuraram eu estava falando que ela tinha sido atingida lá atrás. (…) Que elas me procuravam desde a época do rompimento, a gente conhece todo mundo que é artesão, que é comerciante, e se sentiu prejudicado pelo rompimento da barragem”, esclareceu, afirmando que não consegue se lembrar de quantas declarações assinou, e que não guardou cópias desses documentos.

Tenente Freitas ainda lamentou o episódio, dizendo que não consegue entender como, em Mariana, existe tanta dificuldade em demonstrar os prejuízos decorrentes do rompimento da barragem. “Eu vi isso, ninguém me contou. Eu era presidente da Câmara e acompanhei tudo de perto, conheci as pessoas, sei que perderam muito com o rompimento [da barragem]. E não entendo por que, em Mariana, é tão difícil provar, enquanto em Brumadinho o reconhecimento aconteceu de forma mais simples”, finalizou o ex-vereador.

*** Continua depois da publicidade ***

FErnando Sampaio (ao centro), foi o único dos atuais vereadores citados nominalmente na decisão judicial que autorizou a operação da Polícia Federal em Mariana
Fernando Sampaio (PSB) ocupa a Presidência da Câmara de Mariana, desde janeiro deste ano – Foto: Luiz Loureiro/Arquivo Agência Primaz

Também por telefone, Fernando Sampaio declarou à Agência Primaz que, ao longo dos anos, foram feitas diversas reuniões, na Câmara, com pessoas da sede do município, e de distritos, que se sentiram lesadas com o rompimento da barragem de Fundão, como artesãos e comerciantes.

“Por exemplo, as pessoas que procuravam e declaravam o que tinham perdido. ‘Eu fazia artesanato e, depois do rompimento, o turismo em Mariana e Cachoeira [do Campo] acabou, porque todo mundo achava que Mariana tinha sido atingida, ninguém vinha para Mariana”, declarou Sampaio.

O presidente da Câmara, entretanto, ressalta que as declarações dadas, nesse caso, tinham ainda o respaldo da Associação de Artesãos. “Eu estive com a Associação dos Artesões de Cachoeira do Brumado e muitas dessas declarações estão acompanhadas das declarações de que a pessoa é associada, entendeu?

Segundo o vereador, as declarações reproduziam as informações prestadas pelas pessoas, sendo responsabilidade do Novel a verificação dessas informações antes de liberar o pagamento das indenizações. ““Eu só fazia o relato, colocava um papel o relato [das pessoas]. Agora o Noel, antes de pagar, tinha que investigar se aquilo é falso ou verdadeiro”.

Em relação aos comerciantes, Fernando alega que suas declarações eram embasadas no conhecimento das perdas sofridas devidas às dificuldades econômicas decorrentes do rompimento, que motivaram, inclusive, a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que nunca foi cumprido pela Fundação Renova. “Quando eu era presidente, nós assinamos um TAC com a Renova, que compras R$3 milhões tinham que ser feitas em Mariana, e a Renova nunca cumpriu”, declarou, como prova de seu conhecimento da situação dos comerciantes locais.

Indagado pela Agência Primaz, sobre a inclusão apenas de seu nome e do Tenente Freitas, Fernando afirmou não ter entendido isso, uma vez que é de seu conhecimento que outros vereadores, sem citar nomes, também tenham dado declarações semelhantes.

Sistema Indenizatório Simplificado – NOVEL

Quando começaram as negociações para o estabelecimento do processo de indenizações, a elaboração da matriz de danos e a identificação dos atingidos era responsabilidade da Fundação Renova. Entretanto, diante de muitas queixas contra a morosidade e dificuldades encontradas para obtenção da reparação, por iniciativa do Promotor da Comarca de Mariana, Dr. Guilherme Meneghin, foi decidida a participação da Cáritas, exclusivamente para o município de Mariana, como assessoria técnica aos atingidos.

Posteriormente, no Espírito Santo, comissões de atingidos conseguiram uma decisão judicial, estabelecendo no estado o Sistema Indenizatório Simplificado – Novel, posteriormente estendido para Mariana.

O novo sistema, com uma nova matriz de danos, com valores fixos estabelecidos, permitiria que os requerentes pudessem cadastrar seus pedidos, mediante o preenchimento de certas condições prévias, entre elas o registro de boletim de ocorrência, a interposição de medida judicial ou, ate mesmo, de comprovação de ter tido algum pleito registrado junto à Samarco, Vale, BHP, Fundação Renova ou órgão público, até 30 de abril de 2020, inclusive estabelecendo condições especiais para a comprovação do exercício de atividade econômica eventualmente prejudicada, direta ou indiretamente, pelo rompimento da barragem de Fundão.

De acordo com a apuração da Agência Primaz, são as declarações ou comprovações apresentadas, com a finalidade de cumprir esses requisitos estabelecidos judicialmente, que constituem o objeto de comprovação de veracidade a ser analisado durante a coleta de informações a ser realizada, em Mariana, pela perícia nomeada pela Justiça, em 15 dias úteis, a partir da próxima segunda-feira (29), como informado por Juliano Barbosa, Procurado Jurídico do município.

***