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Hoje é sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Mariana sedia 15º Encontro do Fórum de Prefeitos da Bacia do Rio Doce

Reunião foi marcada por fortes críticas à lentidão do processo de reparação e compensação dos efeitos do rompimento da barragem de Fundão

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Sobre fundo branco, a logomarca da Agência Primaz, em preto, e a logomarca do programa Google Local Wev, em azul, com linhas com inclinações diferentes, em cores diversasde cores diversas
Salão do Centro de Convenções de Mariana, onde foi realizada a reunião do Fórum de Prefeitos da Bacia do Rio Doce
Ainda sem a presença de Romeu Zema, a abertura do evento foi conduzida por José Roberto Gariff Guimarães, prefeito de São José do Goiabal (MG) e presidente do Fórum – Foto: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Com breve participação do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), o 15º Encontro do Fórum de Prefeitos da Bacia do Rio Doce (Consórcio Público de Defesa e Revitalização do Rio Doce – CORIDOCE) foi realizado no Centro de Convenções Alphonsus de Guimaraens, em Mariana, nessa sexta-feira (26). Contando com a participação de representante do Ministério Público; do escritório de advocacia Pogust Goodhead e do presidente da Associação Mineira dos Municípios (AMM); o evento foi marcado por críticas à Fundação Renova, à lentidão do processo de reparação e compensação pelos efeitos do rompimento da barragem de Fundão e, até mesmo, por algumas propostas de rebeldia.

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Fórum de Prefeitos da Bacia do Rio Doce

De acordo como presidente da entidade organizadora do evento, José Roberto Gariff Guimarães, conhecido como Beto, todos os municípios da bacia do Rio Doce, mineiros e capixabas, devem ser indenizados pelas empresas vinculadas ao rompimento da barragem de Fundão. “A responsabilidade é das empresas e elas têm sim que reparar, têm sim que nos compensar e tratar todas as cidades da bacia do Rio Doce. E nós estamos falando de 200 municípios em Minas e 33 no Espírito Santo”, afirmou.

A reunião foi iniciada sem a presença de Romeu Zema e do prefeito interino de Mariana, Edson Agostinho, bem como do ex-prefeito de Mariana, Duarte Júnior, secretário executivo do CORIDOCE. A informação foi dada por Beto, na abertura do evento, explicando que eles estavam reunidos com a Comissão de Atingidos de Mariana, em uma outra sala do Centro de Convenções.

Mesmo assim, foi iniciada uma rodada de apresentação e falas de prefeitos presentes, com destaque para a unanimidade das reclamações pela lentidão da reparação devida aos municípios, queixas sobre as dificuldades de reconhecimento como atingidos, e ênfase na intenção de obter recursos destinados, prioritariamente à educação, saúde e saneamento básico.

Dar solução aos problemas é a tarefa mais difícil e mais árdua do gestor hoje. E eu não tenho dúvida que o bom gestor hoje, um bom prefeito, ele se preocupa muito mais em cuidar de pessoas, satisfazer as necessidades no sentido de saúde, educação, cultura das pessoas, dos munícipes”, destacou o prefeito de São José do Goiabal.

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Na rodada inicial de manifestações dos prefeitos, ainda sem a presença do governador de Minas Gerais, também foram feitas críticas à destinação de recursos para obras do metrô de Belo Horizonte e do rodoanel, provenientes do acordo de reparação da tragédia de Brumadinho.

Também foram destacados alguns casos de aplicação de recursos já recebidos da Fundação Renova, por municípios como Bugre e Dionísio, destinados à saúde, à educação e ao saneamento, com a ressalva de que ainda não são suficientes para a reparação ou compensação dos prejuízos causados pelo desastre.

Romeu Zema

Terminada a reunião com os atingidos, Romeu Zema teve uma rápida participação no Fórum de Prefeitos da Bacia do Rio Doce
Terminada a reunião com os atingidos, Romeu Zema teve uma rápida participação no Fórum – Foto: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Acompanhado de Edson Agostinho e Duarte Júnior, o governador de Minas, Romeu Zema (Novo) participou da reunião do Fórum de Prefeitos, inicialmente ouvindo as falas dos prefeitos que ainda não haviam se manifestado no encontro.

Em sue pronunciamento, Zema destacou os esforços que, segundo ele, estão sendo feitos por seu governo. “Uma das nossas propostas é usar e até melhorar aquilo que já se usou e provou ser melhor, que é o termo utilizado na tragédia de Brumadinho”, declarou o governador, sem que houvesse qualquer manifestação dos participantes do fórum, quanto à ressalva sobre a destinação dos recursos exclusivamente aos municípios atingidos.

Zema ainda criticou o modelo de reparação instituído, que resultou na criação da Fundação Renova, afirmando que as múltiplas instâncias criaram uma situação de “assembleísmo, com pouco recurso para quem foi afetado chegando de fato”.

Para o chefe do executivo estadual, “ficou nítido, após esse acordo da tragédia de Brumadinho, que o que foi desenhado há oito anos atrás, referente à tragédia aqui de Mariana, não estava dando os devidos resultados”, o que, segundo Zema, justifica o trabalho representado por “centenas de reuniões que já ocorreram” para costurar a repactuação.

Em outro trecho de sua manifestação, o governador transferiu ao Governo Federal a responsabilidade pela concretização da repactuação: “Para esse acordo ser sacramentado está dependendo só do Governo Federal. Minas e Espírito Santo estão totalmente alinhados, tivemos uma mudança na esfera federal que tem atrasado esse processo. É importante que o Fórum se movimente para chamar atenção do Governo Federal, e repito, nós, do Governo do Estado, não estamos medindo esforços para a reparação”, finalizou Zema.

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Outras manifestações e descontentamento

Após a saída do governador, foram apresentados relatos dos representantes do Ministério Público de Minas Gerais, a respeito das tratativas da repactuação e demais ações judiciais, e da representante do escritório Pogust Goodhead, responsável pela ação em curso na Inglaterra, contra a BHP Billiton, com julgamento marcado pela justiça britânica para outubro de 2024.

Em nova rodada de participação dos prefeitos, tiveram destaque duas manifestações mais contundentes de descontentamento, como foram os casos de Padre Aníbal, prefeito de Bom Jesus do Galho (MG), que sugeriu a paralização do trem de passageiros da Vale, no percurso entre Belo Horizonte e Cariacica, na região metropolitana de Vitória (ES).

Outro que foi veemente em sua descrença na repactuação e na ação da Fundação Renova, foi Lastênio Cardoso, chefe do Poder Executivo de Baixo Guandu (ES), para quem “interesses ocultos” dificultam o recebimento, pelos municípios, da justa reparação e compensação dos prejuízos causados pelo rompimento da barragem.

A descrença é a realidade. Temos oito anos aí essa luta com os governos, com a justiça brasileira e nada resolvido. Então, o que que acontece? A ação inglesa, ela não tem interesse oculto nenhum, o interesse dela é resolver o problema. Agora, aqui no Brasil têm vários interesses ocultos em todos os setores, por parte dos governos, por parte da justiça. Enfim, eu não acredito que isso [repactuação] ocorra rápido”, desabafou Lastênio.

O prefeito capixaba diverge da posição de Romeu Zema, acreditando que as críticas do governador são decorrentes do fato do governo de Minas Gerais não ser parte da ação na Inglaterra. “O governo [de Minas] quer o recurso não para os municípios, aonde foi realmente atingido. (…) O Rio Doce não passa lá no metrô em Belo Horizonte, né? Passa aqui nos municípios. É aqui que, realmente, tem que ficar o recurso, e não lá!”, finalizou.

Em entrevista à Agência Primaz, o presidente do Fórum comentou as manifestações, em tom de apaziguamento. “O posicionamento dos prefeitos de Baixo Guandu e de Bom Jesus do Galho, eu vejo com absoluta normalidade. Eu acho que esses prefeitos têm autonomia para escolher aquilo que é melhor para os seus municípios. E a visão divergente faz parte da democracia. Se formos nos opor a todos que divergem de nós, nós não convivemos coletivamente, correto?”, declarou Beto.

O ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, assessora o CORIDOCE no acompanhamento da ação na Inglaterra
O ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, assessora o CORIDOCE no acompanhamento da ação na Inglaterra – Foto: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Contratado pelo Consórcio Público de Defesa e Revitalização do Rio Doce (CORIDOCE), José Eduardo Cardozo fez uma veemente defesa por uma reparação justa aos municípios atingidos, o que, segundo ele, somente seria conseguido por meio de uma condenação da BHP Billiton na Inglaterra.

Respondendo a um questionamento da reportagem da Agência Primaz, Cardozo classificou como “equivocado”, o posicionamento de Romeu Zema em relação à ação internacional. “Eu acredito que essa observação do governador [Romeu Zema] é meio equivocada, porque a ação na Inglaterra é um dos fatores centrais de pressão contra essas empresas que fizeram o que fizeram no Brasil. Ou seja, tanto a justiça brasileira como a justiça da terra deles tem que cobrá-los duramente por aquilo que foi feito. E claro, é nosso interesse fazer um acordo, mas um acordo digno, um acordo que os municípios sejam ouvidos, que os prefeitos tenham liberdade de poder utilizar os recursos”.

Para o ex-ministro da Justiça, “a União tem que receber os seus recursos, os estados têm que se receber os seus recursos, os municípios têm que receber e gerir os recursos, assim como todas as pessoas atingidas, como os índios, como os quilombolas. (…) Essa ação na Inglaterra é uma justa reação que os municípios encontraram para conseguir ter uma indenização justa. E acho que as empresas temem muito a ação na Inglaterra, e por isso querem que prefeitos e outras pessoas façam acordo renunciando à ação na Inglaterra”, finalizou José Eduardo Cardozo.

Sem declarações à imprensa

A reunião de Romeu Zema, acompanhado de Duarte Júnior e Edson Agostinho, com a Comissão de Atingidos de Mariana, não pôde ser acompanhada pela imprensa, mas a assessoria do governador informou que ele iria conceder uma rápida entrevista coletiva após sua participação no Fórum de Prefeitos da Bacia do Rio Doce.

Cercado de ostensivo aparato de segurança, com controle de entrada no Centro de Convenções e distribuição de pulseiras de identificação, os repórteres dos veículos de comunicação locais e regionais tiveram seu trabalho dificultado, confinados a um diminuto espaço demarcado, no fundo do salão, enquanto o cerimonial do governo estadual e as assessorias dos prefeitos tinham livre acesso a todo o recinto.

“Cercadinho” destinado aos repórteres durante a participação de Romeu Zema no Fórum de Prefeitos da Bacia do Rio Doce
“Cercadinho” destinado aos repórteres durante a permanência de Romeu Zema no Centro de Convenções – Foto: Luiz Loureiro/Agência Primaz

Depois que o governador fez seu pronunciamento, o cerimonial do governo do estado informou, sem apresentar qualquer justificativa, que não haveria mais a entrevista coletiva e, pouco depois, Romeu Zema se retirou do local, utilizando uma saída alternativa, com acesso direto ao estacionamento do Centro de Convenções, evitando o contato com os repórteres. Imediatamente em seguida, todo o aparato de segurança e de restrição ao trabalho da imprensa foi desmontado.

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