- Ouro Preto
Ouro Preto recria, 290 anos depois, o Triunfo Eucarístico
Cortejo levou milhares de pessoas às ruas da cidade
- Milena Reis Silva
- Supervisão: Luiz Loureiro
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A releitura do Triunfo Eucarístico, o “Triunfo Barroco”, foi realizada no último sábado (21), após 290 anos. O cortejo faz parte da programação do Festival de Inverno de Ouro Preto e contou com estimativa superior a 10 mil pessoas nas ruas, acompanhando o evento, mais de 700 participantes. Entre eles, membros do executivo e legislativo de Minas Gerais, atores, dançarinos, músicos, grupos de congados e cavalhada, além de Reynaldo Passanezy, presidente da Cemig, patrocinadora do evento.
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Recriação do Triunfo Eucarístico começou na manhã de sábado
O Triunfo Eucarístico foi registrado por Simão Ferreira Machado no livro O Triunfo Eucarístico – Exemplar da Cristandade Lusitana, publicado em Lisboa, em 1734. Nele o autor apresenta o relato da primeira união do sacro com o profano, na então Vila Rica, no translado do Santíssimo Sacramento da Igreja de Nossa Senhora do Rosário para a Basílica Matriz de Nossa Senhora do Pilar. Após essa data, o cortejo foi encenado em 1983,1993, 2006 e 2011.
As celebrações começaram na manhã do último sábado com o repique dos sinos nas Igrejas de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos e na Basílica Menor de Nossa Senhora do Pilar. À tarde foi realizada a missa Solene na Igreja de Nossa Senhora do Rosário e, no início da noite, às 18h, aconteceu a Sinerata das igrejas históricas, seguida do Cortejo Comemorativo do Triunfo Eucarístico, que durou aproximadamente 1h30.
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Em entrevista à Agência Primaz, a Secretária Adjunta de Cultura de Ouro Preto, Margareth Monteiro, ressaltou a importância desse evento para a história do município. “O evento foi um marco para a história religiosa, barroca e artística. Retomar isso é reviver a história, é preservar a nossa memória, e trazer de novo essa beleza para as ruas de Ouro Preto”, afirmou a secretária.
O cortejo contou com diversos figurinos cedidos pelo Palácio das Artes/Fundação Clóvis Salgado, criados pelo cenógrafo, arquiteto e figurinista mineiro Raul Belém Machado (1942-2012), para a edição do Triunfo Eucarístico de 1993.
Também foram utilizadas algumas roupas de época vindas de Sabará, utilizadas na Semana Santa, e trajes utilizados em festas de reinado, cedidos pelo prefeito de Itapecerica (MG), Wirley Reis.
Em coletiva de imprensa, realizada antes do desfile, o prefeito de Ouro Preto, Ângelo Oswaldo (PV), explicou o significado do nome Triunfo Barroco. “Triunfo Barroco é para fazer uma distinção da cerimônia religiosa e do fenômeno cultural que aconteceu”, destacou Angelo, ressaltando a característica da união entre o sacro com o profano. “Estamos resgatando uma festa que é profana e sacra, vemos nos desfiles os ventos, os planetas, figuras da mitologia greco-romana, tudo que podia enriquecer esse desfile foi incorporado a ele”, comentou.
Personagens do cortejo
Essa mistura, no desfile, foi representada, entre outros elementos, pela apresentação da “Luta entre cristãos e Mouros”, apresentada pela Cavalhada de Amarantina, mostrando o eterno embate entre as forças do bem contra o mal, representadas por São Jorge e pelo Dragão. Presentes também a “Fartura do Ouro”, representando a riqueza que fez surgir a organização das Minas, a “Eucharistia in Translation Vietrix”, que foi a Eucaristia vitoriosa na translação da Igreja do Rosário até à Igreja do Pilar, e os “Romeiros”, representando a caminhada de fé.
O desfile também contou com a apresentação dos “Quatro Ventos”, representando os ventos Norte, Sul, Leste e Oeste, que promovem encontros e desencontros entre lugares distantes, e com apresentações das quatro estações, representando o passar do tempo dos homens sobre a Terra.
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Personificando Ouro Preto, Weslen Xavier revelou à Agência Primaz, o sentimento dessa participação. “Estou muito feliz, é uma responsabilidade muito grande representar Ouro Preto”, declarou.
A guardiã dos tesouros das montanhas e dos rios, “Mãe do Ouro”, também foi representada, acontecendo também o desfile de um grupo representando “A Fama”, uma alegoria como anúncio de algo que acontece ou está para acontecer. Presentes também a representação de personalidades da cidade, com figuras dos séculos XVIII, XIX e XX, compondo o “Séquito de Ouro Preto”.
Por fim, foi a vez do “Séquito Clerical”, representando a fé, a religiosidade e a memória do Padre Simões.
Contexto histórico do “Triunfo Eucarístico”
Em 1733, uma festa triunfal eucarística, síntese da contrarreforma e do barroco, foi realizada em Vila Rica, atual Ouro Preto. Essa festividade ficou conhecida como “um dos eventos sociais mais exuberantes da América Portuguesa”, sendo narrada em detalhes pelo português Simão Ferreira Machado, na crônica “O Triunfo Eucarístico – Exemplar da Cristandade Lusitana.
A celebração que contagiou toda a cidade com cores, sons e imagens, foi antecedida pela guarda do Santíssimo pelos negros do Rosário até culminar na construção da Matriz do Pilar. No cortejo foi realizado o traslado do Santíssimo Sacramento entre essas igrejas. Em sua obra, o autor destaca o evento como um momento de grandeza do país: “Que visse o Brasil, nem consta, que se fizesse na América ato de maior grandeza”.
Machado exemplificou as sugestões místicas e profanas do cortejo numa grande apoteose cultural e artística das Minas Gerais, relatando os trajes enfeitados com pedras preciosas, alegorias, efeitos visuais e sonoros das danças e músicas, teatro, jogos públicos, toque dos sinos, uso constante de estampidos, rufares de tambor, apitos, clarins, trombetas, tiros de mosquetes, poesias junto ao Palácio do Bispado e cavalhadas.
Esse esplendor, resultou no Triunfo Eucarístico como um bom caracterizador da apoteose barroca e, mais ainda, como aglutinador da alegoria e do espírito das festas brasileiras. O Triunfo Eucarístico foi a consequência de uma série de fatores, que condicionaram o aparecimento de uma cultura, iniciada com a exploração aurífera do interior do país.