O assassinato de Cristo
“O homem conhece a verdade, mas o medo o arrasta a um silêncio mortal. Onde estava a multidão que uma vez gritou ‘Hosana nas alturas´, quando Cristo carregava sua cruz em direção ao Gólgota”? (Wilhelm Reich)
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Ouça o áudio de "O assassinato de Cristo", do colunista Júlio Vasconcelos]:
Wilhelm Reich (1897-1957) foi um psicanalista austríaco de origem judaica, discípulo de Freud no princípio de sua carreira, conhecido por suas ideias controversas e inovadoras no campo da psicologia, sexologia e terapias corporais. Suas teorias sobre energia orgônica e suas práticas terapêuticas foram amplamente criticadas e o levaram a conflitos com a comunidade científica e autoridades governamentais da época. Em 1954, a Food and Drug Administration (FDA) dos EUA considerou suas práticas relacionadas à energia orgônica fraudulentas, levando à destruição de seus dispositivos e livros. Acabou sendo preso em 1956 por desacato ao Tribunal e morreu na prisão de um ataque cardíaco, um ano depois. Deixou um legado polêmico, mas influente, que continua a ser debatido e explorado. Suas ideias influenciaram movimentos como a terapia corporal, a terapia bioenergética e o movimento de contracultura dos anos sessenta. Uma de suas obras mais polêmicas foi o livro “O Assassinato de Cristo”, uma abordagem contundente que provocou e continua provocando grande debate e controvérsia e que vale a pena ser comentada, com foco em uma reflexão para os dias turbulentos que estamos vivendo atualmente.
Em “O Assassinato de Cristo”, Reich apresenta uma análise profunda e provocativa sobre a relação entre a sociedade, a repressão sexual e a religião. Ele argumenta que a figura de Cristo vem sendo simbolicamente assassinada ao longo da história, com a matança de inocentes e de grandes líderes mundiais, alguns assassinados pela própria igreja, como Giordano Bruno e Joana D’Arc, condenados à fogueira pelo Tribunal da Inquisição na Idade Média e muitos outros. Afirma que, na verdade, o responsável pelo assassinato de Cristo não foram os Sumos Sacerdotes, nem Pilatos com seus soldados romanos, mas a grande massa que antes cantava “Hosana ao Filho de Davi” e depois decidiu por libertar Barrabás e condená-lo a ser crucificado. Deixando de lado suas ideias polêmicas e bastante questionáveis a respeito da sexualidade e mesmo de outros temas, vale trazer aqui em destaque para reflexão, na íntegra, algumas das suas famosas frases que, confesso, muito me tocaram:
“O homem conhece a verdade, mas o medo o arrasta a um silêncio mortal. Onde estava a multidão que uma vez gritou “Hosana nas alturas”, quando Cristo carregava sua cruz em direção ao Gólgota? Ausente! Se ele se mostrou digno de confiança, não deveria o povo, se houvesse problemas, correr em seu socorro cantando Hosana nas Alturas e então libertá-lo e apoiá-lo?”. Vale a pena refletir sobre a nossa realidade dos dias de hoje: novas e antigas religiões despontam por todos os lados, da mesma forma templos enormes abarrotados de pessoas, cantos litúrgicos são proclamados em altos brados, bem como orações vazias, repetitivas e decoradas! Ao mesmo tempo uma quantidade enorme de inocentes perde a vida por balas perdidas, são abusados sexualmente, estuprados e assassinados e assim caminha a humanidade! …
“O abismo que assim se abre nunca mais fecha: é o grande abismo que se abre entre a impotência efetiva da multidão e sua identificação mística com o orador. Nesse abismo, os Hitlers, os Stalins, os Mussolinis, os Barrabás, os malfeitores de todos os tempos e de todos os países despejam sua influência sobre a multidão. Esta não sabe, evidentemente, como eles procedem. Aí está, exatamente, a origem da miséria que se abateu sobre o século vinte. Mas ninguém fala sobre isso”. O que se percebe é que a ignorância da multidão ou mesmo a tomada de decisões tremendamente equivocadas continua abrindo espaços para líderes tóxicos e corruptos. Afinal, quem colocou no poder os tiranos responsáveis pelo discurso do ódio e pelas guerras que estão acontecendo nesse instante nos diversos países do mundo? Enquanto escrevo essas linhas, um Hospital em Kiev, capital da Ucrânia, especializado em tratamento de câncer para Crianças foi bombardeado e totalmente destruído. Segundo as autoridades ucranianas, ao menos 37 pessoas morreram, incluindo três crianças, outras 170 ficaram feridas.
“É preciso concluir um acordo com o imperador pagão para assegurar ofícios sagrados nos templos, mesmo se esses ofícios forem a sombra cadavérica de uma religião outrora viva e brilhante”. Sei que é uma pergunta muito incômoda, perigosa, mas que tipo de religião vem sendo praticada pelas grandes multidões e pelos seus líderes religiosos nos diversos países do mundo? …
“Há promotores públicos que agem como verdadeiros advogados, estabelecendo a verdade, recorrendo a múltiplas fontes. Há outros cujo único objetivo é a morte da vítima, seja essa morte certa ou errada, justa ou injusta”. Creio que se olharmos com esmero ao nosso redor, infelizmente encontraremos exemplos concretos dessa afirmação nos vários tribunais judiciários.
“Você não pode imaginar Cristo recitando litanias ou aceitando a dignidade de Doutor Honoris Causa da Universidade de Direito da Universidade X. Em qualquer outra cidade em qualquer época da história escrita da humanidade, ele era um estrangeiro (eu diria estranho) em Jerusalém e teria sido em qualquer outra cidade. Em geral, os homens não agem como ele”. Quanta pompa, quanta ostentação, quantos templos grandiosos, quanta vaidade estampada publicamente por alguns que se dizem representantes do Cristo e de seus Evangelhos! Quando reflito sobre essa afirmação fico imaginando o que aconteceria se o Cristo chegasse por aqui nos dias de hoje! Alguém se arrisca? …
Várias outras citações similares contidas no livro poderiam ser trazidas em pauta, mas confesso que particularmente já me sinto bastante incomodado e prefiro parar por aqui.
Afinal, de qualquer forma, fica no ar uma pergunta que não quer se calar: quem são, na verdade, os responsáveis pelo assassinato de Cristo nos dias de hoje?
Quem tem ouvidos, que ouça!
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