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Hoje é quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Ensaio sobre a cegueira

“O pior cego é aquele que não quer ver”. (Provérbio popular)

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divulgação ensaio sobre a Cegueira

Ouça o áudio de "Ensaio sobre a cegueira", do colunista Júlio Vasconcelos:

Recentemente tive a oportunidade de assistir novamente o filme “Ensaio sobre a Cegueira”, dirigido por Fernando Meirelles e lançado em 2008, baseado no romance homônimo do escritor português José Saramago. O filme, assim como o livro, é uma alegoria profunda sobre a condição humana e a fragilidade da civilização diante de crises extremas e, confesso, o seu caráter impactante levou-me a uma profunda reflexão.

A história começa com uma súbita e inexplicável epidemia de cegueira que atinge uma cidade não identificada. Rapidamente, a cegueira se espalha gerando um enorme caos nas casas, no trabalho, nas ruas, no trânsito, nos ares, em tudo! A cidade literalmente é obrigada a parar! Qualquer semelhança com a Pandemia do Covid19 não é mera coincidência! As autoridades, temendo o contágio, isolam os infectados em uma quarentena forçada aprisionando-os em uma antiga instalação, cujas condições eram extremamente precárias e sem nenhuma assistência. Dentro desse confinamento, as normas sociais e morais desmoronam de forma aguda, levando a situações de violência e desumanidade. A bestialidade humana toma proporções desastrosas: disputa de poder, liderança tóxica, briga por alimentos, corrupção, assédio sexual, assassinatos e outras desgraças despontam de forma assustadora. 

A cegueira no filme é uma metáfora para a ignorância e a insensibilidade humana. Saramago utiliza essa cegueira de forma a explorar como a sociedade reage quando as estruturas que mantêm a civilização se desintegram.

Quando as pessoas são privadas de suas visões e isoladas, o filme mostra a rápida deterioração da ordem social. A falta de visão literal se traduz na falta de visão moral, com indivíduos cometendo atos bárbaros para sobreviver. No ambiente de quarentena, os personagens enfrentam desumanização, com o filme destacando a brutalidade que pode emergir em tempos de crise.

As cenas impactantes do filme vão e voltam de forma cíclica na minha memória e fico me perguntando se esse enredo de ficção já não vem se desenrolando de forma concreta nos nossos tempos contemporâneos! …

A pandemia do COVID-19 que teve seu início oficialmente decretado em 31 de dezembro de 2019, apesar de toda a evolução tecnológica, estampou de forma cruel e traumática a fragilidade humana diante do desconhecido. Um minúsculo organismo microscópico, invisível ao olho nu, denominado vírus, derrotou com um golpe letal toda a suposta grandeza da humanidade durante um bom período de tempo! Como nas cenas do filme, o mundo parou e, o pior, os seres humanos perderam o senso de moral e respeito humano. No Brasil, diversos escândalos espocaram por todos os lados envolvendo desvios em contratos para a compra de equipamentos e insumos, fraudes em Hospitais de Campanha, superfaturamento na compra de respiradores, problemas em Programas de Auxílio Emergencial, além de um bate-boca inútil, interminável e cheio de ódio sobre a eficácia ou não das vacinas.

De forma semelhante, mais recentemente, o catastrófico problema das enchentes no Rio Grande do Sul trouxe à mostra um palco de descomposturas éticas e criminais tais como desvios de recursos que deveriam ser utilizados para ajudar as vítimas das enchentes, problemas na assistência, furtos e saques a comércios e residências abandonadas, furto de donativos entre outros. A população já vulnerável devido às perdas materiais e emocionais irreparáveis causadas pelas enchentes se viu ainda mais fragilizada com comportamentos e atitudes deploráveis que comprometeram fortemente sua capacidade de recuperação, aumentando o sentimento de insegurança.

É indiscutível que, diante de uma visão otimista, se mudarmos o foco da nossa lente, foi-nos possível deparar com emocionantes cenas de amor ao próximo e solidariedade em ambas as ocorrências, mas de qualquer forma fica no ar uma pergunta que não quer se calar: será que a cegueira anda tomando conta da humanidade, gerando catástrofes oriundas da sua própria insanidade e comportamentos desumanos próprios de seres brutos e irracionais?

Todos os dias as guerras entre a Rússia e a Ucrânia e entre Israel e o Hamas e as tragédias com a morte de inocentes nas favelas no Rio de Janeiro nos trazem imagens chocantes da destruição que essa maldita cegueira vem nos causando. Qual o nosso papel diante disso tudo? Vale a pena refletir sobre a frase do grande Mahatma Gandhi: “Se quiseres mudar o mundo, comece por ti mesmo”!

Quem tem ouvidos, que ouça!     

Picture of Júlio Vasconcelos
Júlio César Vasconcelos, Mestre em Ciências da Educação, Professor Universitário, Coach, Escritor e Sócio-Proprietário da Cesarius Gestão de Pessoas
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