O Senhorio Terrível e a Nostalgia
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Ouça o áudio de "O Senhorio Terrível e a Nostalgia", do colunista Aalexandre Amorim
Nos últimos dias, dediquei tempo para refletir sobre nossos relacionamentos, especialmente aqueles cuja essência vive na memória e na consciência — essa eterna vilã. A consciência, com o passar dos anos, ganha um potencial destrutivo formidável, transformando ações e pensamentos juvenis em recordações amargas. Na juventude, nossas escolhas parecem justas, impulsivas e muitas vezes descompromissadas. Mas, ao envelhecermos, surge um juiz interno implacável, um reflexo da maturidade que pouco ou nada perdoa.
Como já dizia o filósofo Sêneca, “O maior obstáculo para viver é a expectativa, que depende do amanhã e desperdiça o presente.” Vivemos presos em memórias de um passado que não podemos mudar e em expectativas de um futuro que não controlamos. Esse ciclo de julgamentos internos muitas vezes leva a uma autocrítica feroz, onde o perdão para si mesmo é raro e o peso das falhas passadas é esmagador.
Essa severidade autoimposta pode ser especialmente devastadora para os homens, que, como revelam as estatísticas, são as principais vítimas do suicídio. David Foster Wallace expressa isso de forma impactante: “A mente é um excelente servo, mas um senhorio terrível.” Essa citação ressoa profundamente ao ilustrar o tormento mental que muitos enfrentam, levando à triste realidade de que, frequentemente, a mente pode se tornar o maior inimigo.
Ao entrar em setembro, o mês do Setembro Amarelo, é essencial refletirmos sobre a prevenção do suicídio. Dados do estudo “Worldwide suicide mortality trends (2000-2019): A joinpoint regression analysis,” publicado no World Journal of Psychiatry, indicam que cerca de 70% das vítimas de suicídio no mundo são homens. Esse dado é um sinal de alerta, não apenas para focarmos em intervenções específicas, mas também para entender a complexidade dessa questão e a necessidade de um olhar mais compassivo e abrangente.
O filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard, considerado o pai do existencialismo, escreveu sobre o desespero humano como um estado de não ser capaz de viver consigo mesmo. Ele descreveu o desespero como uma forma de não ser capaz de encontrar sentido na própria existência. Essa ideia se conecta diretamente com a forma como muitos de nós se apegam ao passado, tentando reavivar sentimentos que não mais florescem, sustentando amores comatosos ou relacionamentos que drenam nossa vitalidade e tempo.
Insistir em manter vivo o que já deveria ser passado é como tentar sustentar brasas apagadas, esperando que reacendam sem combustível. Continuamos sacrificando pedaços de nossas vidas, pedaços de nossa juventude e potencial, para manter uma chama que já não aquece. Como dizia Friedrich Nietzsche: “Aquele que tem um porquê para viver pode suportar quase qualquer como.” Precisamos encontrar nossos “porquês”, e isso muitas vezes significa deixar o passado descansar e focar no presente e no futuro.
Se você ama alguém que não te ama de volta, é imperativo que saiba quando e como sair dessa relação. A nostalgia não deve se tornar um investimento emocional insustentável, crescendo até o ponto onde somos incapazes de deixá-la partir. Como Aristóteles sugeriu, a virtude está no meio-termo — não na indulgência da dor nem na sua supressão completa, mas na gestão sábia dos nossos afetos.
Se você se encontra nesse ciclo ou sente que precisa conversar, lembre-se de que não está sozinho. O Centro de Valorização da Vida (CVV) oferece apoio e atendimento 24 horas pelo telefone 188. Acesse cvv.org.br para saber mais e encontrar o apoio necessário.
Escrito em meados de setembro, de 2024, este texto espera o(a) encontrar bem e tranquilo. Obrigado pela sua companhia! Um abraço do autor!
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