Sonetos: uma trilogia
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Ouça o áudio de "Sonetos: uma trilogia", do colunista Saulo Tete de Oliveira Camêllo:
// Correspondência poética com Gabriel Bicalho
Amigo Gabriel, na minha estrada,
poucos ainda sabem o que é poesia.
Preferem águas calmas, rasa fala,
mas eu preciso do que corta e incendia.
A palavra é minha faca, minha sina,
com ela aprendi feitiço e rebeldia.
Se a rima suja, que seja divina,
que seja sangue, que seja agonia.
Meus versos são revoltos, desmedidos,
não cabem nos lábios distraídos,
nem se moldam à mudez do dia.
Minha mente explode em tempestade,
transborda em fogo, em insanidade,
e só encontra paz na poesia.
// À minha geração
Somos líquidos, mas em ebulição,
somos a fenda, a voz, a tempestade.
Se o mundo pesa em bruta estagnação,
somos o sopro da nova verdade.
Confio na chama da universidade,
no verbo que o saber faz insurgente.
Se a história é grades, reescrevo a grade,
invento um mundo que siga em frente.
Não quero este mundo feito de aço,
que morre em muros e em hipocrisia.
Se a Terra é estática, eu me desfaço,
mudo-me a Marte — ou faço poesia.
// Canta Atabaque
Se forem cantar, que cantem o grito,
não só a voz que o branco escolheu.
Atabaque, que injusto este mito:
só um canto existe, só um se ergueu?
O mundo é penumbra e dor ecoando,
o tom do racismo em sombra e abismo.
Cantam os corpos, cantam sangrando,
mas cala a história em seu falso lirismo.
Tenho vergonha dos meus passados,
dos que roubaram terra e verdade.
Colonizaram até os fados,
o ser, o saber, a identidade.
Se resta a loucura, que seja brasa,
para incendiar o que ainda atrasa.

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