Envelhescência e etarismo: Entre o respeito e o preconceito
“Envelhecer é como escalar uma grande montanha: enquanto se sobe, as forças diminuem, mas o olhar é mais livre, a vista mais ampla e serena." (Ingmar Bergman).
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Ouça o áudio de "Envelhescência e etarismo: Entre o respeito e o preconceito", do colunista Júlio Vasconcelos:
Nos últimos tempos, a velhice vem aumentando significativamente nos quadros estatísticos do nosso país. De acordo com o Censo Demográfico de 2022, o Brasil possui 32,1 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, representando 15,8% da população total, refletindo um processo acelerado de envelhecimento populacional. Em meio a essa onda preocupante, o termo envelhescência, conjuntamente com o termo etarismo, vem tomando conta das mídias, gerando vários debates e estudos que merecem uma pequena pausa para reflexão.
O termo envelhescência foi criado pelo psicólogo e gerontólogo Jorge Felix e está relacionado com uma etapa da vida que começa por volta dos 50-60 anos, quando o indivíduo ainda não se considera idoso, mas já vive sinais de mudanças físicas, sociais, afetivas e existenciais típicas do envelhecimento, características do processo que, em meio aos meus 66 anos de jornada, venho vivenciando.
Os estudos indicam que esse período é caracterizado pelo início de alterações físicas, doenças crônicas, alterações na libido, diminuição de energia, avaliação das conquistas, saída dos filhos de casa, aposentadoria ou mudanças profissionais, redefinição do lugar na família e na sociedade, busca por sentido para o que fazer daí para frente e oscilações emocionais entre liberdade e medo, autonomia e vulnerabilidade, potência e finitude.
Nos tempos atuais, as pessoas estão vivendo mais e chegam aos 60, 70 anos com saúde, energia e projetos de vida. No entanto, a sociedade ainda valoriza excessivamente a juventude, podendo gerar nesses indivíduos conflitos internos e sentimentos de exclusão, inutilidade, solidão e invisibilidade, consequências provocadas pelo tão debatido etarismo.
O etarismo é a discriminação baseada na idade, atingindo especialmente os idosos. Trata-se de um preconceito muitas vezes sutil, mas profundamente enraizado na cultura e nas práticas sociais, afetando desde oportunidades no mercado de trabalho até o convívio familiar e os atendimentos em serviços públicos.
No Brasil, o etarismo se manifesta tanto de forma institucionalizada quanto no cotidiano das relações pessoais. A cultura da juventude como ideal de produtividade, beleza e valor social contribui para a marginalização dos mais velhos, que são frequentemente vistos como ultrapassados, lentos, inflexíveis ou incapazes de aprender.
No mercado de trabalho, grande parte das empresas ainda preferem candidatos jovens mesmo para cargos que exigem experiência. Currículos de pessoas com mais de 50 anos frequentemente são descartados antes mesmo da entrevista. Os Programas de trainee normalmente limitam a faixas etárias até 30 anos.
No convívio familiar, às vezes as opiniões dos avós sejam consideradas ultrapassadas e encarados como lentos, teimosos ou inúteis. Impera uma impaciência por parte dos filhos e netos ao tentar ensinar ou explicar novas tecnologias.
Na mídia, percebe-se a ausência de protagonistas idosos em novelas, filmes e publicidade. Infelizmente, ainda encontramos atitudes que excluem ou infantilizam essas pessoas, como se estivessem “em fim de linha”, quando, na verdade, a velhice é uma fase legítima da vida, cheia de possibilidades, potência e dignidade, por mais restrições que pareçam existir.
Valorizar os idosos não é apenas uma questão de educação ou cortesia, é reconhecer a dignidade de quem já percorreu uma longa estrada de vida, acumulando saberes, experiências, dores, superações e histórias que formam a memória viva de um povo!
Finalmente, por falar em idosos, não poderia deixar de comentar que, enquanto navegava por essas reflexões, recebi com pesar a notícia da partida de um dos maiores líderes espirituais dos tempos modernos e por que não dizer o maior, o nosso querido Papa Francisco! Creio que não precisamos de maior exemplo de fé, espiritualidade e sabedoria centradas em um ser humano que se foi em uma idade avançada, portanto, que venha a envelhescência!
Quem tem ouvidos, que ouça!

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