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Hoje é sexta-feira, 22 de novembro de 2024

CPI das obras ouve primeiras testemunhas em Mariana

Autores do pedido de abertura foram ouvidos nesta semana. Além do depoimento, Manoel Douglas apresentou relatórios com indícios de irregularidades

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Vereadores Ediraldo, Maurício (á esquerda) e Manoel Douglas, juntamente com outros integrantes da vistoria realizada no dia 11 de maio na Capela Velório de Furquim
Vereadores Ediraldo, Maurício (á esquerda) e Manoel Douglas, juntamente com outros integrantes da vistoria realizada no dia 11 de maio na Capela Velório de Furquim. Foto: Reprodução/Relatório Manoel Douglas
A CPI das Obras começou a ouvir as primeiras testemunhas nesta semana, em Mariana. A comissão realizou as oitivas com os vereadores que assinaram o pedido de abertura da CPI e o principal depoimento foi dado na quarta (25), pelo vereador Manoel Douglas (Preto – PV). O vereador também apresentou 3 relatórios nos quais aponta indícios de irregularidades no contrato 447/2019, firmado entre a Prefeitura de Mariana e a empresa Construtora Israel. Além de Manoel Douglas, a CPI ouviu José Antunes (Zezinho Salete – MDB) , Ricardo Miranda (Republicanos), Ediraldo Ramos (Pinico) e Maurício Borges, ambos do Avante.

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Manoel Douglas foi o primeiro a ser ouvido como testemunha da CPI das obras em Mariana. O vereador detalhou os motivos que o levaram a defender a CPI e a buscar o apoio dos colegas para assinarem o pedido de abertura da investigação. “A partir do momento que recebemos as respostas dos requerimentos, nós identificamos algumas inconsistências em medições, principalmente dos contratos 447 [447/2019] e 148 [148/2020], que foram os mencionados na CPI”. 

Durante o depoimento, o vereador disse que visitou, no dia 11 de maio, a Capela Velório Padre Pedro de Furquim, um dos alvos da investigação, inaugurada dois dias antes pela Prefeitura de Mariana. Além das suspeitas levantadas na análise das medições, Manoel Douglas disse ter constatado a inexistência de de placas informativas sobre valores e prazos da obra, situação que, ainda segundo ele, tem acontecido em outras obras em execução no município de Mariana. “Tendo em minha posse a planilha orçamentária, as medições, o projeto e fazendo um fechamento, eu percebi que ali tinham várias inconsistências. Ítens que foram pagos e não executados. Então, o principal motivo [para o pedido de abertura da CPI] foram as divergências da medição para a planilha orçamentária, pelo que condiz a obra com a vistoria in loco que a gente fez”, disse Manoel Douglas. 

Os outros quatro vereadores que assinaram o pedido de abertura da CPI também foram ouvidos nesta semana. Na quarta-feira (26), a comissão ouviu José Antunes, Ediraldo Ramos e Maurício Borges. Já Ricardo Miranda falou à CPI na quinta-feira (27). De modo geral, os vereadores informaram que foram procurados por Manoel Douglas e, após terem sido apresentadas as informações preliminares coletadas pelo colega, entenderam a importância da abertura da CPI das Obras em Mariana.

Além de responder às perguntas dos membros da comissão, o vereador Manoel Douglas apresentou três relatórios com indícios de irregularidades em serviços contratados pela Secretaria Municipal de Obras e Gestão Urbana, por meio do contrato 447/2019, junto à Construtora Israel.

Relatórios

A Agência Primaz teve acesso aos três relatórios entregues à comissão pelo vereador Manoel Douglas ao final de seu depoimento, realizado nesta quarta-feira (26). Em todos eles são apontadas possíveis irregularidades, constatadas em visitas de vistoria realizadas em duas oportunidades: na Capela Velório de Furquim, no dia 11 de maio, e na quadra e UBS de Pombal, no dia 25.

A primeira suspeita de irregularidade apontada pelo denunciante, refere-se a um suposto desrespeito à Lei das Licitações (Lei 8.666/93). De acordo com os relatórios, a reforma da quadra de Pombal teria sido realizada pela empresa APPA; a empresa ART teria sido responsável pela execução da reforma da UBS do mesmo local, enquanto a construção da Capela Velório de Furquim teria ficado a cargo da empresa SN Engenharia e Construções Ltda, sendo que o contrato nº 447/2019 foi celebrado, em 20 de dezembro de 2019, com vigência de 12 meses, pela Prefeitura Municipal com a empresa Construções Israel Eireli, sediada em Brumadinho (MG), mediante adesão à Ata de Registro de Preços nº 07/2019/CISPAR (Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável do Alto Paranaíba).

De acordo com a argumentação apresentada por Manoel Douglas, a subcontratação ou sub empreitada total dos serviços é vedada pela Lei das Licitações. Essa lei, no inciso VI, do Art. 78, prevê que é motivo para rescisão do contrato, “a subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação do contratado com outrem, a cessão ou transferência, total ou parcial, bem como a fusão, cisão ou incorporação, não admitidas no edital e no contrato”. Consultando o contrato nº 447/2019, a Agência Primaz verificou que a cláusula 10.10, estabelece que a contratada (Construtora Israel) “compromete-se a (…) não transferir a outrem, no todo ou em parte, as obrigações constantes no contrato, ressalvando a possibilidade de subcontratação se expressamente autorizado pela Prefeitura”. Porém, nos documentos disponibilizados no Portal da Transparência, relativos ao contrato em questão, não foi encontrado nenhum documento a esse respeito.

Ressalte-se, ainda, que nenhuma das ordens de serviço emitidas pela Prefeitura, vinculadas ao contrato com a Construtora Israel, foi constatada a ordem para a execução das obras de reforma da UBS de Pombal. Em uma delas, juntamente com várias outras obras, encontra-se a ordem de serviço para a execução das obras relacionadas à quadra poliesportiva de Pombal e à Capela Velório de Furquim.

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UBS de Pombal

As supostas irregularidades apontadas pelo vereador Manoel Douglas no relatório específico desta obra, relacionam o pagamento de itens não utilizados (container, depósito de ferramentaria e tapume); não realizados (colocação de rufo e calhas; molas hidráulicas em porta de vidro; vergas em concreto estrutural; contrapiso, revestimento em piso cerâmico e soleiras em mármore branco; tanque séptico e sumidouro retangular em alvenaria), e pagamento de guarda corpo que, segundo informações colhidas junto a funcionários, já existiam no local; bem como o pagamento de quantitativos incompatíveis com os medidos durante a vistoria (colocação e embocamento de telhas; manta isolante; pintura em esquadrias de madeira, volumes de concreto, aço e fôrmas).

Improvisação de apoio para tubo de esgotamento sanitário na UBS de Pombal – Foto: Relatório/Manoel Douglas
Improvisação de apoio para tubo de esgotamento sanitário na UBS de Pombal – Foto: Relatório/Manoel Douglas

Ainda em relação ao tanque séptico e sumidouro, o relatório informa que, “conforme mostra relatório fotográfico de nossa vistoria no local, onde se pode observar claramente que o esgoto corre em tubo direto para córrego lateral, inclusive com estruturas sendo seguras por gambiarras. Além do mais se torna um crime ambiental ao jogar esgotos de unidade de saúde direto em curso d’água”.

Quadra poliesportiva de Pombal

Como resultado da visita de inspeção realizada também no mesmo dia da UBS, (25 de maio), o relatório apresentado pelo vereador Manoel Douglas aponta a seguinte lista de possíveis irregularidades:

– Itens pagos, mas sem comprovação ou identificação na obra (fundo selador em paredes; fundo anticorrosivo em estrutura de aço carbono; pintura em esquadria de madeira; concreto, fôrmas e aço; grade e alçapão de aço; sarjeta em concreto)

– Item pago em quantidades não compatíveis com o verificado no local (portas de sanitário em estrutura de metalon).

Um dos tópicos apontados no relatório é relacionado ao “pagamento da ordem de R$9.825,28 para execução de alambrado e portão em aço galvanizado altura 3 metros com tela de arame galvanizado revestida de pvc. Este item não existe no local sendo que conforme relatório fotográfico anexo mostra claramente que o cercamento do local é antigo, de material completamente diferente e não foi mudado durante esta obra conforme provam fotos anexas e informação de vários moradores presentes que afirmaram que este item não foi executado”.

Portão gradeado na parte exterior da quadra poliesportiva de Pombal – Foto: Relatório/Manoel Douglas
Portão gradeado na parte exterior da quadra poliesportiva de Pombal – Foto: Relatório/Manoel Douglas

Adicionalmente, o relatório aponta que teria sido feito o pagamento de “cumeeira para telha cerâmica embocada com argamassa para telhado conforme item 7.6, sendo que em vistoria in-loco não foi detectado este item de execução mesmo porque a cobertura no local e em telhas metálicas”; “pagamento de 2 Kits de porta de madeira para pintura semi-oca sendo que este item não foi detectado no local, visto que as portas no local não mostram substituição sendo aparentemente itens antigos”; “pagamento de divisória de granito branco no total de R$ 7.535,35 item não detectado no local que consta de divisórias de cor divergente e que conforme pessoas presentes, incluindo uma funcionária da escola, já existiam anteriormente a reforma”, e ainda o “pagamento referente a traves para futebol item que não detectamos no local visto que segundo analise as traves no local são antigas e foram apenas repintadas colaborando inclusive com presença de moradora que afirmou que não ouve troca”.

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Capela Velório de Furquim

O relatório da Capela Velório de Furquim, inaugurada no dia 9 de maio, aponta também uma particularidade, além da questão referente à suposta sub empreitada ou subcontratação. Ocorre que, o contrato 447/2019, prevê a “execução de serviços de reforma ou ampliação a serem realizados em prédios públicos, praças, parques e equipamentos públicos do Município de Mariana, incluindo serviços de pavimentação e drenagem em vias públicas”. Para o vereador Manoel Douglas, conforme se lê no relatório específico dessa obra, “pois a Capela Velório foi uma construção totalmente nova, conforme informações do próprio responsável pela execução que participou da vistoria em 11/05/2021, além dos relatórios fotográficos, incluindo foto da placa da obra e demais documentos apresentados pelo executivo a Câmara Municipal. Destaca-se inclusive que os relatórios de medição constam como Reforma da Capela Velório e não como execução de obra de construção da capela Velório o que foi o verdadeiro objeto”.

Fachada da Capela Velório Padre Pedro Celestino, situada no distrito de Furquim – Foto: Relatório/Manoel Douglas
Fachada da Capela Velório Padre Pedro Celestino, situada no distrito de Furquim – Foto: Relatório/Manoel Douglas

Um dos pontos de maior destaque no relatório é a constatação do “total de 660 horas pagas a Encarregado geral de obra mostrando assim um acréscimo de 50% no quantitativo fato que causa estranheza visto que para os demais profissionais técnicos até esta medição não havia acréscimos”.

Outra questão apresentada refere-se ao pagamento dos seguintes itens não observados na visita de inspeção, de acordo com a 6ª medição do contrato 447/2019, relativa ao período entre 09 de novembro e 08 de dezembro de 2020: amarração de telhas; 641,13 m² de pintura anticorrosiva a base de óxido de ferro (zarcão) em esquadrias e superfícies metálicas (“fato não detectado no local visto que as esquadrias em questão instaladas são de madeira e apenas um portão tipo grade e um guarda corpo vazado em grade são metálicos obtendo medidas nestes dois itens insignificantes em relação ao total pago”); cobertura em telha metálica galvanizada; escada tipo marinheiro em tubo galvanizado, e meio fio e sarjeta em concreto.

O relatório ainda aponta discrepâncias entre quantitativos pagos e medidos no local: “acumulado pago de alvenaria de 1.219,39 m² de alvenaria conforme item 6.1, sendo que em vistoria in-loco detectamos aproximadamente apenas 194,40 m², quantidade esta obtida sem desconto de vãos de esquadrias e passagens internas”; “quantidades de chapisco e reboco totalmente incompatíveis com a área de execução apresentando quantidades superiores em até 3 vezes a real conforme vistoria realizada”; “50m² de passeio em concreto sendo detectado no local em torno de 20 m²”; e “quantidade de aço utilizado em estruturas diversas (exceto Lajes) no total paga até a 6ª medição de 6.067,48 KG volume que nos parece incompatível com área de execução e a estrutura executada no local, inclusive em relação a planilha original da obra que previa 2.688,96 KG”.

Nota da Redação

A reportagem da Agência Primaz não teve acesso às planilhas básicas referentes aos quantitativos e custos unitários dos itens integrantes de cada uma das obras citadas, uma vez que tais documentos não estão disponíveis no Portal da Transparência. Verificamos ainda que, as planilhas de medição disponibilizadas, aparentemente são globais, ou seja, relacionadas ao conjunto de obras contratadas pelo município junto à Construtora Israel. Na próxima semana serão encaminhados pedidos à Prefeitura Municipal de Mariana para disponibilização dessa documentação específica para que possamos fazer uma auditoria independente das questões levantadas nos relatórios entregues à CPI pelo vereador Manoel Douglas.