Hoje é o quarto dia chuvoso dessa semana. Desde quinta-feira, o sol quase não deu as caras e a chuva roubou os planos de muita gente. Quando chove, tudo fica mais difícil. As ruas parecem que ficam mais cheias, os ônibus se atrasam, as pessoas estão mal-humoradas, as nossas roupas ficam sujas e os sapatos, molhados.
A família de Dona Joana – seus cinco filhos, o marido e uma irmã – mora num bairro longe da cidade, numa casinha de amianto e madeira. São dois quartos, uma sala, um banheiro e uma cozinha.
– Dona Joana, essa chuva já encheu a paciência, não é?
– Muito! E o pior é que, com esse tempo, os meninos todos ficam dentro de casa fazendo bagunça porque não dá para ir à escola.
Me respondeu, com um sorriso no rosto.
– Uai, como assim?
– Nossa casa fica bem no meio da terra, né. Então, quando chove, não dá para sair. Até dá, mas o barro fica tão alto que é difícil andar. Outro dia mesmo, a Mari, minha mais velha, não queria faltar à aula porque tinha prova e teimou em sair no barro. Você acredita que tive que ir lá e resgatar a menina da lama? As botas ficaram grudadas e ela não saía do lugar. Os irmãos riram até, tadinha. Eu também ri, mas, quando vi que ela começou a chorar, parei. Ver filho chorar chateia a gente, né?
– Ainda bem que já não chove mais na casa toda. Só no quarto que fica no fundo e numa parte do banheiro. As coisas estão melhores desde que troquei as telhas.
Na casa de Dona Joana e seus filhos, não tinha banheiro. Há pouco tempo, um mutirão da cidade construiu um do lado de fora da casa. Mesmo na chuva, ela tem que ir e voltar com as crianças pelo quintal. “Senão, todo mundo dorme sem banho”, conta.
Quando chove, tudo fica mais difícil. As ruas parecem que ficam mais cheias, os ônibus se atrasam, as pessoas estão mal-humoradas… A Mari não pode ir à escola sem se afundar no barro e a Dona Joana sente a dor de ver um filho chorar. Dias cinzas. E o Brasil de hoje caminha para uma tempestade que parece estar longe do fim, entre armas e ignorância.
Jamylle Mol é jornalista e marianense