- Mariana
Editorial: Por que não aprendemos com os erros cometidos?
Compartilhe:
A Agência Primaz vem acompanhando de perto todo o processo relacionado à reforma – ou revitalização, se preferirem – da Praça Gomes Freire, também conhecida como Jardim. Além de várias matérias publicadas em 2019, apresentando os detalhes do projeto original e relatando as reuniões, visita técnica e audiência pública, também divulgamos uma análise da questão, inserida em um texto-editorial publicado no dia 14 de novembro daquele ano, trazendo a público as Considerações e posicionamento da Agência Primaz a respeito da revitalização do Jardim.
*** Continua depois da publicidade ***
***
Naquela ocasião, afirmamos que “a ideia de implantar mão única de direção na Rua Dom Viçoso permitiria, conforme informações colhidas ao longo deste processo, eliminar a possibilidade de estacionamento de veículos na parte baixa do Jardim e a retirada da profusão de placas de trânsito ali existentes”. Também reconhecemos que “é obrigatório admitir que tornaria o ambiente mais agradável, bonito e acolhedor. Mas é preciso analisar a questão com mais profundidade, encarando todas as possíveis consequências no fluxo de nosso caótico trânsito. É fundamental que sejam consideradas todas as implicações, inclusive compatibilizando essa medida com o Plano de Mobilidade que está sendo desenvolvido pela Fundação Renova, juntamente com o georreferenciamento das áreas urbanas e dos distritos do município e com a revisão do Plano Diretor de Mariana”.
Ainda apresentamos alguns questionamentos: “Quais as implicações disso em nosso trânsito daqui há 5 ou 10 anos? As ruas Dom Silvério e/ou Barão de Camargos serão capazes de suportar o fluxo de veículos em um sentido? Só a Rua Dom Viçoso será suficiente para o deslocamento no outro sentido? As respostas são técnicas e precisam ser fundamentadas em dados confiáveis, aos quais a população deve ter total acesso”.
Praticamente dois anos depois, com a realização de nova audiência pública, estamos aqui para uma nova avaliação, infelizmente perguntando a razão de não termos aprendido nada, ou quase nada, com os erros do passado, ao constatar que nem os questionamentos anteriores foram respondidos ou levados em consideração nesta nova etapa.
A audiência realizada no dia 26 de outubro escancarou isso ao colocar em debate um projeto sem o nível de detalhamento esperado, resultando na reprovação total da proposta, sem que fossem apresentadas alternativas para resolver a importante questão da falta de acessibilidade, além de insistir em reabrir velhas feridas.
A calçada ao longo dos casarões da parte baixa do Jardim tem largura média de 1 metro, enquanto a via de tráfego mede aproximadamente 6,3 metros. Embora esses números não tenham sido apresentados na última audiência pública, a Agência Primaz apurou que a ideia era alargar a calçada para 3,8 metros, restando apenas 3,5 metros para a via de tráfego, obrigando a implantação de mão única de direção. Observem que essa modificação se daria apenas no trecho de alargamento da calçada, ao contrário da ideia vigente em 2019 que, supostamente, faria com que toda a Rua Dom Viçoso passasse a ter um único sentido de direção (Centro-Bairro).
A nova proposta, apenas modifica um pouco os questionamentos apresentados em 2019, ou seja, mantém o essencial e muda alguns detalhes. O tráfego de veículos e caminhões aumentou bastante na Rua Dom Viçoso, com a proibição de transito no sentido Praça de São Pedro – Praça Minas Gerais, mesmo sendo implantada mão única na Rua Barão de Camargos. Portanto, com a implantação de sentido único de direção no trecho em que se pretendia alargar a calçada no Jardim, todo o trânsito para acessar o Centro Histórico iria confluir para um gargalo na esquina das ruas do Seminário e Barão de Camargos, sem que esse impacto tenha sido estudado. Sem os números reais desse tipo de mobilidade, como acreditar que os problemas de conflitos de trânsito seriam resolvidos? Uma observação empírica do que acontece hoje resulta em conclusão contrária a isso!
E mais grave, o alargamento da calçada para 3,8 metros induziria, quase que naturalmente, à sua plena ocupação por mesas e cadeiras, pelo menos nos finais de semana, anulando praticamente todo o esforço por melhoria da acessibilidade. Aos céticos, oferecemos o exemplo que que ocorreu, ainda em 2019, quando foi liberado o uso da via para essa finalidade nos finais de semana. Embora a autorização exigisse que somente metade da via fosse ocupada por mesas e cadeiras, para possibilitar o trânsito em situações de emergência, o que se viu foi a utilização integral da largura da faixa de tráfego, já no segundo final de semana. A exceção ocorreu na extremidade da via situada na parte superior do Jardim, próximo ao Chafariz, onde houve a utilização de grades e cones para delimitação do espaço das mesas e cadeiras utilizadas pelos clientes dos estabelecimentos ali existentes. Para lembrar, basta observar as fotos da situação em julho de 2019.
E isso ainda nos levaria à situação de falta de isonomia em relação aos comerciantes da parte superior do Jardim, não é mesmo?
Pois bem, mesmo sem termos feito um estudo mais detalhado da questão, vamos colocar algumas sugestões que poderiam ser exploradas, partindo do princípio que a largura atual da calçada não permita a acessibilidade, principalmente se considerarmos a necessidade de sinalização vertical disciplinando a proibição de estacionamento. Para que esse objetivo seja atingido, obviamente que acompanhado da regularização da calçada e implantação de rampas adequadas, principalmente na extremidade próxima ao início da Rua Frei Durão, imaginemos que a calçada passe a ter 1,5 metros de largura. Sobrariam 5,8 metros para o tráfego de veículos, dimensão suficiente para o transito em dois sentidos de deslocamento sem espaço para estacionamento, utilizando a alternativa permitir carga e descarga no trecho entre a Praça Gomes Freire e a Rua do Seminário. As travessias elevadas poderiam ser instaladas nos pontos indicados na audiência pública, bem como nas imediações da entrada da Travessa Salomão Ibrahim, ocupando toda a largura desta, com prolongamento perpendicular à calçada, de modo a permitir a continuidade da calçada alargada, possibilitar outro ponto de travessia com acessibilidade plena e, ainda, introduzir na via um dispositivo que iniba o excesso de velocidade.
Obviamente trata-se de uma proposição que não foi analisada em profundidade, mas que, a princípio, parece atender razoavelmente bem ao propósito principal de melhorar a acessibilidade, sem criar maiores dificuldades aos moradores do entorno, ao trânsito e aos frequentadores do jardim. Sua viabilidade, portanto, demandaria um estudo mais detalhado, e a administração pública dispõe de profissionais mais que qualificados para isso.
Em relação à alegação de falta de acessibilidade em outros pontos da cidade, a Agência Primaz entende que cabe aos cidadãos e cidadãs marianenses, natos ou adotivos, a cobrança por soluções, entendendo que não é possível resolver todas as questões envolvidas ao mesmo tempo, mas considerando que é preciso fazer o que for possível, e o quanto antes.
Para finalizar, recorremos a um trecho da manifestação feita pelo advogado marianense Bernardo Campomizzi Machado, durante a audiência pública de 2019:
“Somos filhos daqueles que frequentaram o Jardim para comemorar vitórias, chorar derrotas, abraçar amigos, beijar na boca, tomar cerveja, recitar versos, ouvir música, trocar ideias, jogar conversa fora, rir de palhaços, deixar o tempo passar, simplesmente passear. Somos filhos do Jardim”.
E acrescentamos que isso inclui quem reside na praça ou em seu entorno, quem transita pelo local, quem o utiliza para lazer e, até mesmo, quem não reside em Mariana, mas visita a cidade e quer desfrutar desse espaço, sem qualquer tipo de obstáculo.