Pai morreu e deixou dívidas. O filho tem que pagar?
Insira o subtítulo
Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “Editoriais”
Compartilhe:
A única certeza da vida é a morte. Para alguns, a estadia neste plano é mais demorada. Para outros, nem tanto. O fato é que, em algum momento, “a indesejada das gentes”, nas palavras de Manuel Bandeira, bate à porta de todos. Por mais sombrio que possa parecer, ao se propor regular as relações entre as pessoas, o Direito tem que tratar de temas ásperos e a morte é um deles. Quando alguém falece, cabe à legislação determinar, dentre uma série de outras coisas, sobre quem recai a responsabilidade das obrigações contraídas pelo morto enquanto era vivo. Neste contexto, surge a pergunta: os filhos têm de assumir as dívidas dos seus pais falecidos?
Não. A dívida contraída por uma pessoa que morreu limita-se ao patrimônio por ela deixado, chamado de espólio. O espólio é um agrupamento de bens, direitos e obrigações, deixado por toda pessoa que falece. A legislação sobre isso é muito clara. Vejamos o artigo 796 do Código de Processo Civil:
Art. 796. O espólio responde pelas dívidas do falecido, mas, feita a partilha, cada herdeiro responde por elas dentro das forças da herança e na proporção da parte que lhe coube.
Ou seja, quando alguém morre e deixa dívidas, deve-se subtraí-las do patrimônio deixado pelo falecido, também chamado de cujus. Se o patrimônio (espólio) do falecido (de cujus) conseguir cobrir a dívida e restarem ativos, eles são repartidos entre os herdeiros. Se o patrimônio for insuficiente para cobrir a dívida, ele é utilizado para arcar com o que for possível, ficando os herdeiros desobrigados a empregarem seus próprios bens para honrar dívidas dos pais. Isso está expresso na primeira parte do artigo 1.792 do Código Civil, que diz:
Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; (…)
Quando o patrimônio deixado é insuficiente para saldar os passivos, inicia-se um processo para se analisar quais são os credores e quais deverão ser pagos prioritariamente, uma vez que não será possível pagar todos. A esse trâmite, dá-se o nome de ‘concurso de credores’. Quem não recebeu, que cobre o crédito no ‘próximo plano’. Do contrário, pais irresponsáveis poderiam contrair inúmeras dívidas sem o consenso dos filhos e deixá-los em situações extremamente complicadas ao falecerem.
Por fim, é possível que ocorram tentativas de burlar a lei, por exemplo, retirando todos os bens que estão em nome de um idoso altamente endividado. Essas tentativas, por vezes, realmente ocorrem. Acontece que nossa legislação é preparada para isso, trazendo institutos como a fraude contra o credor (art. 158 do Código Civil) e a simulação de negócio jurídico (art. 167 do Código Civil), podendo o magistrado no caso concreto anular negócios realizados de má-fé.