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Hoje é quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Imagem de São Roque é entregue com procissão em Mariana, após passar por restauração

O projeto, responsável por retornar a imagem do santo à sua originalidade, foi patrocinado pelo Conselho Municipal de Patrimônio Cultural (Compat)

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Sobre fundo branco, a logomarca da Agência Primaz, em preto, e a logomarca do programa Google Local Wev, em azul, com linhas com inclinações diferentes, em cores diversasde cores diversas
A imagem restaurada de São Roque, Anjo e Cachorro, no interior da Catedral da Sé, horas antes da procissão. Foto: Kaio Veloso/ Agência Primaz
O Dia de São Roque (16 de agosto) pôde enfim ser comemorado em plenitude, após dois anos sob restrições sanitárias devido à pandemia de Covid-19. Às 18h30, a imagem de São Roque, Anjo e Cachorro foi acompanhada por músicos e uma grande quantidade de fiéis católicos, que saíram da Catedral Basílica Nossa Senhora da Assunção (Catedral da Sé), em direção à Igreja Nossa Senhora do Carmo, seu santuário até a conclusão das obras na Igreja São Francisco de Assis, local original de sua permanência. Seguindo uma tradição iniciada há algumas décadas, a festividade deste ano tem como provedores o casal Jussara e Marcílio Queiroz. Além de marcar o retorno da celebração religiosa, a data serviu também como entrega oficial da restauração da imagem, de 252 anos, viabilizada pelo Conselho Municipal de Patrimônio Cultural (Compat), através de verba do Fundo Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural de Mariana (Fumpac).

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Quando foi escolhido como provedor, ainda em 2020, Marcílio, que atualmente ocupa o cargo de secretário de Patrimônio Histórico, Cultura, Turismo e Lazer de Mariana, percebeu a necessidade de restauro da imagem. Segundo ele, as peças que compõem o conjunto possuíam diversas marcas da passagem do tempo. Construídas em madeira, as estátuas de roca apresentavam rachaduras e orifícios causados por insetos.

Além disso, havia vários sinais de ações humanas, possíveis tentativas de lidar com os desgastes anteriormente. Diversos dedos das mãos da imagem de São Roque estavam quebrados; eram visíveis diferentes camadas de tinta aplicadas de forma irregular nas esculturas; a ferida em uma das pernas do santo havia sido aumentada; o anjo possuía marcas em sua cabeça provenientes de tentativas de fixar a peruca com pregos, visa sua desproporcionalidade em relação à estátua; haviam problemas relacionados às articulações das estátuas, e eram visíveis tentativas em unir os membros com fita adesiva e tecidos.

Outro detalhe apontado por Marcílio foi quanto à vestimenta do anjo, que encobria a visão do movimento de seus pés. Ela foi substituída, valorizando mais as características da peça. A escultura do cachorro também possuía desgastes visíveis em sua policromia. Estes e outros problemas podem ser conferidos nas fotografias feitas pela equipe da empresa Ânima Conservação, Restauração e Artes Eireli, de São João Del Rei, e por Marcílio, incluídas no projeto final de conservação e restauro.

Original de Mariana, Marcílio é parte de uma família fortemente ligada à religiosidade, tendo uma relação muito próxima à figura do santo. Sentindo-se honrado ao ser escolhido como provedor, cuja função é patrocinar e organizar a festividade, ele não esperava se deparar com o estado de desgaste da imagem. “Quando eu vi aquilo, eu fiquei muito sensibilizado, e resolvi deflagrar uma campanha local para a gente estar angariando fundos para poder  recuperar o conjunto”, ele conta. Foram feitos cinco projetos, com orçamentos distintos, a partir dos quais se optou pelo serviço oferecido pela Ânima, especializada em restauração. Para conseguir o suporte financeiro, Marcílio, que possui em sua trajetória uma passagem como representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Compat, procurou o Conselho em busca de apoio. 

Compat

Criada pela lei 1.728/ 2003, o Conselho Municipal de Patrimônio Cultural é vinculado à Secretaria Municipal de Patrimônio Histórico, Cultura, Turismo e Lazer, e tem dentre suas competências a elaboração de políticas de proteção do patrimônio cultural e a deliberação quanto aos bens que deverão ser protegidos, através do tombamentos (para bens materiais), registros (para bens imateriais), ou com a produção de inventários (para ambos). Os pedidos para a proteção ocorrem através de ofícios que podem partir do poder público ou da sociedade civil. Eles são entregues ao Conselho que, em reunião, analisa as justificativas e decide quanto à proteção. Abre-se então um processo, onde uma empresa é contratada para fazer o estudo sobre o valor cultural daquele bem. Ao ser finalizado, o Conselho delibera novamente sobre a conclusão ou não do processo de tombamento. 

Bernardo Machado é advogado e conselheiro do Compat, e conta que tanto a edificação da Igreja São Francisco de Assis quanto os elementos artísticos contidos nela já haviam sido tombados a nível federal, o que inclui a imagem de São Roque, Anjo e Cachorro. Como a irmandade responsável não possuía os recursos financeiros necessários, Marcílio, através de um ofício, entrou com o pedido para que o Conselho destinasse recursos do Fundo Municipal para a restauração. “A lei do Fundo Municipal de Patrimônio Cultural prevê que todo recurso que existe no Fundo só pode ser destinado para bens culturais protegidos […] Então, o Conselho, ao receber esse ofício na reunião, deliberou pela destinação de recursos para essa imagem, que é [parte de] uma festa tradicional de Mariana, reconhecida pelo Conselho como um bem cultural”, explica Bernardo à Agência Primaz. 

Após aprovação, o projeto foi repassado à Ânima em março de 2021. A execução teve duração de quase um ano, e a imagem foi entregue pouco antes da procissão. 

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A relação entre São Roque e Mariana

Apesar de ter como padroeira oficial Nossa Senhora do Carmo, a cidade de Mariana possui uma forte relação com São Roque. Como relata João Vicente, atual ministro da Ordem 3ª de São Francisco de Assis, quando a cidade ainda era a Vila de Nossa Senhora do Carmo, no final do Século XVIII, havia altos índices de contágios por doenças, dizimando grande parte da população. A Ordem foi criada em 9 de agosto de 1758, e agregou a figura de São Roque, ainda que ele não se tratasse de um franciscano, mas sim, de um irmão leigo. 

Segundo Marcílio, o ministro daquela época, Thomaz Florêncio Teixeira, teve uma visão de São Roque durante um sonho, inspirando a Ordem a encomendar a imagem. Com base em relatos feitos por Alphonsus de Guimarães, conhecido poeta simbolista que residiu em Mariana, a encomendada feita à França levou cerca de dois anos para chegar à cidade, sendo transportada do Rio de Janeiro à Mariana no lombo de um burro, em um trajeto que levou 90 dias. Ao chegar ao seu destino, em 29 de fevereiro de 1770, a imagem foi benta e, pouco depois, passou em peregrinação pelas ruas da vila das 8h da manhã às 22h da noite, quando enfim retornou à Igreja de São Francisco de Assis. “Quando a imagem vem e percorre a cidade até às 22h, logo depois a endemia aplaca. Então eles atribuem o término da endemia ao milagre de São Roque. A partir daí, São Roque passa a ser venerado como o santo da cidade”, conta Marcílio.

Nesse sentido, João Vicente explica que, em outros momentos, como na década de 1970, em meio a um surto de meningite, a imagem motivou atos penitenciais em busca da cura para a doença. “Agora, no período da Covid-19, também, a imagem  visitou vários distritos aqui da nossa cidade, percorrendo todas as ruas e conseguimos aos poucos o impedimento desse mal em nossa região”, declara. 

O culto a São Roque teve início no século XV, na região de seu nascimento, a cidade francesa de Montpellier. Ao se tornar órfão, ele herdou uma fortuna, mas optou por seguir uma vida simples, como a de Cristo, fazendo uma peregrinação à Roma, onde se tornou enfermeiro. Segundo as histórias, Roque teria sido acometido pela peste que assolava a região e, a fim de não sobrecarregar os hospitais, se retirou para uma floresta, para viver seus últimos dias em oração. Sozinho, passou a receber as visitas de um cachorro, que lhe levava alimento. Uma nascente surgiu no local e ele se curou com suas águas, sendo encontrado pelo dono do animal logo depois. De volta à cidade, visitou diversos hospitais e pouco com pouco tempo, a epidemia teve um fim. Porém, Roque foi confundido com um espião, falecendo na prisão após cinco anos de cárcere. 

Segundo relata João Vicente, há historiadores que discordam desta conclusão, afirmando que, na realidade, ele teria retornado à sua terra natal após a prisão. Na imagem, a presença do anjo serve como representação da mensagem divina, que afirma que Roque é o patrono contra a peste. O ministro conta que, antes, a troca do manto era feita pela própria Ordem, mas com o tempo, aqueles que creem no milagre da cura passaram a se encarregar da troca. Neste ano, o ato foi realizado por uma conhecida do ministro, curada de um câncer. Assim, uma nova tradição vem surgindo dentre os devotos do santo protetor dos doentes, e contra epidemias e pestes.

Confira, abaixo, fotos da procissão, seguida pela missa solene em louvor ao santo: 

A imagem restaurada foi levada em procissão pelas ruas. A festividade contou com a participação do provedor de Honra da Festa de São Roque 2020. Foto: Kaio Veloso/ Agência Primaz
A imagem foi levada até a Igreja Nossa Senhora do Carmo, onde foi celebrada uma missa. Ela permanecerá na edificação temporariamente. Foto: Kaio Veloso/ Agência Primaz

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