- Ouro Preto
Em Ouro Preto, municípios cobram dívida bilionária da Vale: “Não vai virar calote”
O evento contou com representantes de 28 municípios minerários
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No ato feito na Praça Tiradentes, os prefeitos das cidades que compõem a AMIG assinaram uma carta que será encaminhada aos poderes Judiciário, Legislativo e Executivo do país. De acordo com a associação, são mais de 20 anos de espera dos municípios para receber a quantia que a mineradora deve. “O ato de cobrança pública foi a solução para tentar resolver esse calote de mais de 20 anos que transformou essa dívida. É uma cobrança justa e necessária, sobretudo após a pandemia em que os municípios sofreram muito. Ouro Preto representa a síntese de Minas Gerais, dos valores que este ato representa, de liberdade de receber aquilo que é justo e necessário. A Vale utiliza de subterfúgios para adiar uma cobrança líquida e certa dos municípios onde ela já retirou e vendeu o minério”, declarou José Fernando, prefeito de Conceição do Mato Dentro e presidente da AMIG.
De acordo com a Prefeitura Municipal, a Vale deve R$ 411 milhões a Ouro Preto e a demora para o início da quitação dessa dívida preocupa Angelo Oswaldo (PV), prefeito da cidade. De acordo com o mandatário, a empresa utiliza de subterfúgios para se esquivar dos pagamentos. “À medida que passa o tempo, vai diminuindo a dívida, pela prescrição dos anos que vão correndo. Eu estive com o vice-presidente da Vale no início deste ano, em São Paulo. Fui lá conversar com ele por indicação do presidente da Vale e ele já não é mais vice-presidente da Vale. Ela substitui constantemente os dirigentes para ganhar tempo. Os funcionários da Vale são excelentes e temos um bom diálogo com eles, mas quem decide é uma diretoria que toda hora está em mutação para toda vez ter um interlocutor diferente e recomeçar um diálogo que não leva a lugar nenhum. Então, nos cabe esse protesto”, contou.
Angelo Oswaldo foi ainda mais incisivo ao falar sobre a demora para receber os recursos da multinacional prescritos no CFEM. “A Vale sonega o diálogo, porque o que ela fala em um dia, ela não cumpre no outro. O presidente da Vale esteve numa videoconferência com toda a direção da AMIG, disse uma coisa, não cumpriu e mandou um vice-presidente conversar conosco. Então, nós temos que protestar. É mais fácil falar com o Papa do que com o presidente da Vale. A Vale agride toda a humanidade com o que ela tem feito com relação aos recursos devidos aos municípios”, complementou.
De acordo com o ex-prefeito de Itabirito e consultor da AMIG, Valdir Salvador, a Vale perdeu embates na Justiça sobre essas dívidas do CFEM por 13 vezes em primeira instância e uma em segunda. Ao mesmo tempo, segundo ele, a mineradora alega falta de convencimento jurídico para pagar os valores devidos. “Na hora que as barragens são questionadas em relação às suas seguranças, as mineradoras, em especial a Vale, diz que está seguindo as determinações da Agência Nacional de Mineração, a chamando de séria e coerente, mas é só para barragem, para a CFEM não é. É a mesma agência, que possui as mesmas regras. Não se justifica, ainda mais com os resultados espetaculares que ela tem”, relatou.
Ouro Preto não possui mais o mesmo poder minerário como antigamente e, por isso, requer o recurso do CFEM para o fomento do turismo, da educação, do meio ambiente, da cultura, para a diversificação econômica e para a infraestrutura. Enquanto isso, a administração municipal pensa em formas de diversificar sua economia com a criação da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Tecnologia, chefiada por Felipe Guerra, neste segundo ano de mandato do governo Angelo Oswaldo.
A Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Tecnologia de Ouro Preto trabalha com cinco eixos para a diversificação da economia municipal: turismo, cultura, agropecuária, inovação e tecnologia e empreendedorismo. Os secretários do ramo, na Região dos Inconfidentes, junto do SEBRAE, tem se reunido para tratar do tema. A Cidade Patrimônio, no entanto, é a que mais tem arrecadação própria, em comparação com Mariana e Itabirito.
“É extremamente necessário que haja uma diversificação econômica para além da mineração em Minas Gerais como um todo, não só em Ouro Preto. A nossa secretaria foi criada recentemente e acho que com muito atraso, ela deveria ter sido criada bem antes em Ouro Preto. A mineração é muito importante para Minas, está no nosso nome, mas temos que encontrar uma mineração mais sustentável, mais consciente e mais segura. Sabemos que temos anos de mineração pela frente, mas precisamos mudar o modelo que é feito essa mineração. Já vimos tantos desastres que aconteceram e isso tem que acabar”, afirmou Felipe Guerra, à Agência Primaz.
Reconhecimento como atingido
Em julho deste ano, o Juiz Federal Substituto da 12ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais (SJMG) reiterou e ratificou o reconhecimento de Ouro Preto como impactado pelo rompimento da Barragem de Fundão. Ao legitimar o município como integrante dos programas de reparação e compensação, ficou determinado que a Cidade Patrimônio seja contemplada com R$7 milhões a serem utilizados na educação.
“Nós temos feito um grande movimento, em primeiro lugar com o município sendo reconhecido como vitimado pelo desastre da Samarco. Eles queriam excluir Ouro Preto das compensações sendo que a sede da Samarco é em Ouro Preto. Tudo que era produzido com o minério de Ouro Preto, tinha o rejeito encaminhado para essa barragem que se abriu em Mariana. Nós estamos lutando para o reconhecimento pleno de Ouro Preto, acabamos de receber R$7 milhões para a educação, por uma determinação judicial, e estamos esperando mais recursos que foram destinados para o saneamento básico”, declarou Angelo Oswaldo.
O Juiz da 12ª Vara Cível e Agrária da Seção Judiciária de Minas Gerais, Mário Franco Júnior, determinou que Ouro Preto seja incluída no Eixo 2 – Meio Ambiente, em especial no Programa de Coleta e Tratamento de Esgoto e Destinação de Resíduos de Sólidos, referente às ações de recuperação da Bacia do Rio Doce, envolvendo as empresas Samarco, Vale, BHP e Fundação Renova.
A Renova, no entanto, recorre na Justiça sobre tal decisão que pode levar mais de R$ 60 milhões para Ouro Preto poder destinar ao serviço de saneamento.
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Itabirito
Atualmente, a Vale deve R$90 milhões a Itabirito. O prefeito da cidade, Orlando Caldeira (Cidadania), esteve no ato em Ouro Preto na tarde de quarta-feira e contou à Agência Primaz sobre o seu plano para diversificar a economia do município e não ficar dependente da mineração. “O minério é finito e nós temos que aproveitar para que, neste momento em que ele está sendo extraído, a gente possa fazer melhorias nas nossas cidades. Itabirito vem trabalhando a diversificação econômica há um bom tempo. Não é fácil atrair empresas, hoje, precisa de ter parques industriais e de estradas. Então, esse recurso que precisamos receber da Vale é para isso mesmo”, salientou.
O que diz a Vale
Por meio de nota, a Vale informou à Agência Primaz que efetua regularmente o recolhimento do CFEM, observando tanto as normas aplicáveis, quanto os limites constitucionais existentes. Quanto aos questionamentos mencionados na reportagem, a Vale aguarda uma manifestação definitiva pelo Judiciário. De acordo com a mineradora, R$17,6 bilhões em CFEM foram recolhidos e distribuídos aos municípios pela ANM nos últimos cinco anos.
“A Vale continua empenhada em gerar valor compartilhado e sustentável para todos os Municípios onde atua, bem como contribuir para o crescimento das economias locais, nacionais e global, por meio de suas operações, investimentos, tributos e royalties. O recolhimento de suas obrigações é parte fundamental da relação com a sociedade e divulgada de forma transparente em seu TTR – Relatório de Transparência Fiscal“, informou.