Compartilhe:
O noticiário e as atenções estão voltadas para a situação excepcional que vivenciamos atualmente. Contam-se mortos e infectados, criticam-se políticas e ações públicas, lavam-se as mãos. Sem esquecer a importância da preservação da saúde e da vida dos concidadãos, não podemos deixar de lado quem somos e o que produzimos.
A sociedade marianense, mineira por excelência, é formada, não exaustivamente, por índios, negros, brancos, africanos, portugueses, italianos, ingleses e brasileiros constituindo um hibridismo cultural que construiu e constrói, de forma peculiar, ao longo de mais de três centenas de anos, modos de viver, formas de expressar, músicas, danças, edifícios, obras, documentos, vestígios e paisagens denominados, pela lei, como bens, materiais e imateriais.
De acordo com a Constituição do Estado de Minas Gerais (artigos 207 e 208), todos esses bens portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade mineira sob as diversas formas culturais, constituem patrimônio cultural e devem ser identificados, publicizados, protegidos e incentivados.
Mineiros que somos, vivemos sobre ruas de pedras, sob altares de ouro, diante de igrejas barrocas, casarios coloniais e edifícios modernos, entre festejos de folias e rodas de capoeira. Tradicionalmente, comemos queijos e quitutes, bebemos café, cultuamos o modo de vida rural, bucólico. Trazemos a contação de histórias, a conversa de pé de ouvido, a música de viola e violão, a palavra própria, a introspecção, a poesia, a simbologia. Nossos sinos falam, nossas almas saem em procissão. Somos Rebeldes, quando necessário. Nadamos em cachoeiras, subimos montanhas. Com a pedra, construímos panelas e utensílios. Com a madeira, fazemos esculturas e móveis. Com a tinta, retratamos as Gerais. Da terra, extraímos a matéria e manejamos a substância. Temos bonecos gigantes, palhaços no jardim. Uma Folhinha nos orienta sobre o tempo. Nosso longe é perto. Entre encontros e despedidas, nos apegamos ao trem, a quem vai e a quem fica, à travessia, à vida no nosso lugar. Estudamos o passado e interpretamos as relações de poder. Deixamos registrado.
Esse é nosso patrimônio cultural que devemos proteger. Outro ainda temos que identificar.
Nossa cultura mineira instiga o prazer e a dor, a compreensão de si mesmo e dos outros, a imaginação. Cultiva os sonhos. E os sonhos, por sua vez, frutificam a cultura, numa simbiose que não se sabe o que gerou o quê.
São os sonhos que devemos perseguir em busca de realizar algo melhor que o presente.
São os sonhos feitos de ilusões positivas, de esperanças que dão sentido à vida, de imaginações que geram futuro, sem esquecer do passado. Esse passado longínquo e recente de muito sofrimento.
As pessoas são várias, a cidade muda, com sol e chuva o tempo passa, voa, mas os sonhos não. Eles não envelhecem.
(*) Bernardo Campomizzi Machado é advogado, especialista em Direito Ambiental e Minerário.