- Ouro Preto
Moradores reclamam dos impactos da Vale em distritos de Ouro Preto e Itabirito
Apesar de convidada, mineradora se ausentou do debate com a comunidade
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Os impactos gerados pelo funcionamento da mineradora Vale foram tema de uma Audiência Pública, realizada na quarta-feira (22), no distrito de Engenheiro Corrêa, em Ouro Preto. Tendo como requerente o vereador Naércio Ferreira (Republicanos), a reunião teve como objetivo ouvir e qualificar as demandas dos moradores a respeito dos impactos sociais, ambientais e econômicos da atuação da mineradora Vale nas localidades de Engenheiro Corrêa (Ouro Preto) e São Gonçalo do Bação (Itabirito). As principais reclamações são decorrentes da construção de um muro de 90 metros para contenção e descomissionamento das barragens do sistema Forquilha, da Mina de Fábrica.
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No encontro, que contou com a presença somente do vereador proponente, participaram o Secretário de Segurança e Trânsito, Juscelino Gonçalves, além de moradores e representantes de movimentos sociais. Citando uma reunião realizada com o Legislativo ouro-pretano, juntamente com representantes da Associação de Moradores e com a vice-prefeita Regina Braga – natural do distrito -, no dia 13 de março, a Vale enviou um comunicado à Câmara, explicando a ausência na Audiência Pública. “Agradecemos ao convite e ficaremos no aguardo das informações a serem encaminhadas à Vale através da promotoria municipal após Audiência”, pontuou sucintamente.
Convidado pelo vereador requerente, o Promotor de Justiça Municipal, Tiago Correa Afonso, também justificou a ausência no debate. No documento enviado ao legislativo, o promotor ainda ressaltou a pendência da resposta da Vale sobre os diagnósticos dos impactos da mineração no distrito de Engenheiro Correia. “Torna-se inviável se qualificar a real dimensão do impacto nos territórios”, mas segundo Afonso, a promotoria estará aberta ao diálogo assim que o levantamento for enviado pela mineradora.
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Construção de muro de contenção
A Mina da Fábrica é composta pelas barragens de Forquilhas I, II, III, IV e V, abrangendo distritos dos municípios de Ouro Preto, Itabirito e Congonhas, e o muro foi erguido como medida de proteção ao descomissionamento, uma vez que o rompimento de uma delas afetaria drasticamente, não só as localidades do entorno, mas o abastecimento de água da região metropolitana de Belo Horizonte.
De acordo com populares, “em momento algum a população se colocou contra a construção do muro de contenção”, mas devido ao início emergencial das obras, não foi feito, segundo os moradores, o estudo de medidas compensatórias, além ter afetado as vias de acesso ao distrito, a terrenos, e até mesmo o tombamento do patrimônio local.
Estradas de acesso são as principais queixas
A principal reclamação dos moradores foi do estado da estrada que liga o distrito ouro-pretano ao itabiritense. Após a intervenção da mineradora em Engenheiro Corrêa, populares relatam a dificuldade de acesso ao distrito vizinho devido a interdição da estrada municipal.
Outra demanda relacionada a estrada se refere à MG-030, que dificulta o ir e vir dos munícipes. A via foi interditada pela Vale há quase dois anos, devido ao risco de transbordamento pluviométrico em períodos de grandes chuvas. De acordo com os atingidos, além dos problemas físicos, a interdição também “dificulta as relações comunitárias entre os distritos”.
“O que a gente questiona, o que a comunidade questiona, é os prejuízos materiais, socioeconômicos, psíquicos que a comunidade sente até hoje, e principalmente com essa inoperância da Vale que perpassa o filtro de 2 anos, trazendo prejuízo no direito de ir e vir”, argumentou Naércio.
Há um ano, moradores do distrito ouro-pretano fizeram uma manifestação contra a mineradora, tendo como principal queixa a estrada, de cerca de 8km de extensão, que liga Engenheiro Corrêa a São Gonçalo do Bação, no município de Itabirito. De acordo com os relatos, o trajeto quase triplicou de distância, devido a inacessibilidade da estrada principal.
Diego Thomaz, que possui terreno a 1,5km do muro de contenção, expôs sua situação, que definiu como de “muito sofrimento”. O morador cita os impactos econômicos que os distritos vêm sofrendo devido a atual situação da estrada. “Perdeu muito a ligação que tinha com São Gonçalo, que tinha grandes negócios. Pessoas faziam negócio de boi, tinha a Festa do Brejo”, expôs o morador.
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Turismo e patrimônio também foram prejudicados
Paulo Braga, um dos moradores atingidos, relatou a dificuldade na preservação de bens históricos da localidade, como o tombamento da Capela de Santo Antônio. De acordo com o morador, a Secretária de Cultura do município, Margareth Monteiro, ligou diretamente para ele explicando os entraves para o tombamento do bem que agora está sobre uma propriedade particular. “Está proibido fazer qualquer melhoria na Capela de Santo Antônio, pois está na zona de salvamento”, reproduziu o morador sobre parte da conversa.
O secretário de Segurança e Trânsito, Juscelino Gonçalves, elucidou os trâmites de salvaguarda necessários para que o processo de tombamento possa ser continuado. Segundo ele, a capela está localizada em uma região na qual órgãos municipais devem emitir uma autorização especial para tráfego de pessoas, e que este requerimento ainda não foi feito pelos responsáveis técnicos do tombamento. “Existe uma Lei de Proteção de Barragens que impera no estado de Minas Gerais, que impede a entrada de pessoas sem acompanhamento e autorização dos Bombeiros e da Defesa Civil nas áreas que estejam evacuadas e áreas que estejam no nível 3 de segurança, que é o nível máximo”, explicou Gonçalves.
Encaminhamentos
Ao final da reunião ficaram definidos nove encaminhamentos de acordo com as principais demandas apontadas pela população. Como prioridades, os participantes definiram a pavimentação da MG-030 pela empresa Vale, como medida reparadora à interdição da estrada municipal, e o estabelecimento na intervenção na estrada vicinal bicentenária que liga Engenheiro Correia a São Gonçalo do Bação. Outra via que também foi citada nos encaminhamentos foi o trecho que liga Santo Antônio do Brejo a Engenheiro Correia, para o qual foi demandado o calçamento.
Além das demandas infra estruturais, a população do distrito também pediu a criação de um plano de recuperação turística da localidade e a reforma da Estação Ferroviária Sardinha. No quesito social, os munícipes requereram a construção de uma quadra poliesportiva comunitária e a promoção de um projeto socioambiental, pela Vale, na localidade afetada pela atuação.
A capela do distrito foi outro ponto de destaque nos encaminhamentos, tendo sido solicitada a intervenção do poder público para sua manutenção. O documento oficial vai ser encaminhado à mineradora Vale e à Procuradoria Municipal de Justiça, assim como a transcrição da audiência.
Nessa terça-feira (28), o projeto Câmara Itinerante 2023 chegou ao distrito de Engenheiro Corrêa, com rua do lazer, serviços gratuitos e a realização da 14ª reunião ordinária do legislativo municipal.
O que diz a Vale
Durante a Audiência Pública, Naércio Ferreira chegou a comentar sobre a falta de diálogo da mineradora com os moradores atingidos em sua área de abrangência. “A Vale não presta informações, as mínimas informações são negligenciadas. Isso traz um desconforto emocional, traz prejuízos na vida psicológica, principalmente dos moradores diretamente atingidos aqui de Engenheiro Corrêa e de São Gonçalo do Bação”, salientou o parlamentar.
Munícipes também relataram as falhas da empresa na comunicação com a comunidade. Procurada pela reportagem da Agência Primaz para esclarecimentos a respeito das denúncias sobre o impedimento das ações na Capela de Santo Antônio e os reparos nas estradas de acesso ao distrito, a mineradora Vale não deu retorno.
Um pouco mais sobre o distrito de Engenheiro Corrêa
Com população de cerca de 400 pessoas, de acordo com o último Censo, o distrito de Engenheiro Corrêa fica localizado a 38km de Ouro Preto e é banhado pelo Ribeirão Sardinha – que dá nome à estação de trem – como principal mantenedor do gado e da agricultura da região.
Terra natal da vice-prefeita Regina Braga (Republicanos), a localidade leva o nome do principal responsável pela estação Ferroviária, datada do século XIX, o engenheiro Manuel Francisco Corrêa Júnior.