- Mariana
Edital da Renova é cancelado por suspeita de irregularidades
Processo seletivo teria apresentado lacunas e incompatibilidade entre os critérios de seleção e os projetos aprovados.
- Marina Ferreira
- Supervisão: Luiz Loureiro
A 3ª edição do Edital Doce (Edital de Chamamento Público da Fundação Renova), aberto em maio deste ano, que seleciona projetos sociais de promoção da cultura, turismo, esporte e lazer, foi cancelado na última sexta-feira (10), durante a 63ª Reunião Ordinária da Câmara Técnica de Educação, Cultura, Lazer, Esporte e Turismo (CT-ECLET), órgão responsável por orientar, monitorar e fiscalizar as ações e os programas da Fundação Renova nessas áreas. O cancelamento se deu após denúncias de supostas irregularidades no processo seletivo, como falta de clareza nos critérios de seleção, incompatibilidade entre os requisitos e os projetos aprovados e suspeitas de parentesco entre proponentes e participantes da comissão avaliadora. Em Mariana, documento denúncia foi protocolado na própria Fundação Renova, tendo sita também acionado o Ministério Público.
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“Viemos, por meio deste, repudiar o resultado do processo seletivo classificatório referente à última Edição do Projeto Edital Doce 3ª Edição – 2023/2024” era o que constava no e-mail apresentado durante a reunião da CT-ECLET, do dia 10 de novembro. O momento serviu para que os participantes questionassem a subjetividade dos critérios do processo seletivo, uma vez que não seria possível identificá-los com clareza, além de grande número de projetos aprovados para a realização de eventos, em detrimento de propostas de maior perspectiva de continuidade no futuro, voltados ao lazer, esporte ou de relevância ambiental e social.
A surpresa e a insatisfação dos participantes da Câmara Técnica, em relação ao lançamento da 3ª edição do Edital Doce, já haviam sido demonstradas em junho deste ano, durante reunião realizada em Mariana, uma vez que a 2ª edição ainda estava em discussão. Na ocasião o lançamento de mais um ciclo do programa foi duramente criticado, uma vez que a Fundação Renova, mesmo diante de problemas identificados na edição anterior, fez o lançamento do edital sem discutir seus termos e critérios com a Câmara Técnica.
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Irregularidades denunciadas no edital da Renova
Uma participante da reunião, do território de Governador Valadares (MG), denunciou suposto grau de parentesco entre quem estava na comissão avaliadora do edital e a entidade recebedora do recurso. Além disso, Gustavo Leite, representante de Mariana no CT-ECLET, alegou que havia sido informado a respeito de um pedido de impugnação da 3ª edição do Edital Doce, devido à aprovação de uma empresa que não está estabelecida no município, e tem CNPJ registrado a menos de dois anos, o que não atende aos critérios exigidos pelo processo.
Ao levar em conta todos os depoimentos, ligações, mensagens, e-mails e o reconhecimento de problemas pelos próprios representantes da Fundação Renova, a coordenação da CT-ECLET, após cogitar, de início, suspender a edição, submeteu o tema à votação, com resultado unânime pelo cancelamento.
Ministério Público
A Agência Primaz apurou que, em Mariana, com base em um documento elaborado por pessoas físicas, Microempresas Individuais (MEI’s) e empresas que submeteram projetos ao Edital Doce, um advogado teria acionado o Ministério Público denunciando supostas irregularidades no processo de aprovação das propostas, uma das quais era a incompatibilidade entre o que o edital exigia e as propostas aprovadas, na categoria de Projetos Sociais de Promoção da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer.
Nas condições de participação, existe a especificação de que uma empresa com finalidade lucrativa deve possuir sede há pelo menos um ano ou atuação comprovada em algum dos 35 municípios listados pelo edital há pelo menos três anos, o que não seria o caso de uma empresa contemplada com a aprovação de dois eventos ligados à área do esporte.
Outro problema identificado foi na exigência em relação a eventos voltados à cultura e esporte/lazer, de que só devem ser promovidas atividades abertas e gratuitas ou com ingressos de, no máximo, R$15 por pessoa. Essa exigência, de acordo com a denúncia, também estaria sendo descumprida por projetos aprovados que têm inscrições com valores significativamente superiores.
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“(…)no entanto ela [empresa] não atendeu os pré-requisitos deste presente edital. E, por ter sido contemplada 2 vezes, com propostas grandes, impossibilitou a entrada de vários outros suplentes”, ressalta um trecho do documento, que também denunciava a falta de clareza a respeito das notas dos projetos aprovados, a aprovação de mais de um projeto por proponente e relação de aprovados contendo apenas propostas com valor superior a R$100 mil, sendo que o edital era destinado a propostas a partir de R$25 mil.
“Aproveitamos para solicitar mais transparência na divulgação das ações da Fundação Renova, tendo em vista que a mesma que é como o próprio nome diz, uma Fundação, demonstrando as notas e valores repassados aos projetos aprovados, dando ciência a toda população a qual foi atingida”, finalizou o documento, que também foi protocolado na Fundação Renova, na véspera da reunião da CT-ECLET.
Repercussão do cancelamento
A reportagem da Agência Primaz fez contato com duas pessoas que tiveram projetos aprovados na relação oficial divulgada pela Fundação Renova. A primeira a ser procurada foi a jornalista Thalia Gonçalves, que apresentou o projeto “Mãos que contam histórias: vida e obra de artesãos cachoeirenses”, mas preferiu não se manifestar a respeito porque, até o momento da entrevista, ainda não havia sido notificada oficialmente pela Fundação Renova sobre o cancelamento do edital
Xisto Siman, proponente dos projetos “Encontros no Jardim” e “Circo é Escola – 2ª edição”, entretanto, declarou que a decisão da Câmara Técnica de cancelar a edição foi incompreensível. “‘Pra’ se inscrever no edital você fica pelo menos um mês, um mês e meio se dedicando a construir um projeto, pensar uma planilha, conseguir cartas de anuência, pensar equipe, assinar carta de anuência de todo o mundo da equipe, fazer orçamento de material gráfico de equipe. Isso deveria ter sido pensado antes, porque depois que o processo já está em vias de liberação, de assinatura de documento, de contrato para liberar os recursos, esse cancelamento vem agora. É simplesmente absurdo”, desabafou.
Segundo Xisto, a Câmara Técnica também desconsiderou o impacto negativo sobre a economia criativa de Mariana e das cidades abrangidas pelo edital, e completou reforçando a quantidade de pessoas envolvidas nos projetos. “A gente acabou de ter um projeto realizado nas escolas, em que a gente atingiu mais de 4 mil pessoas. Eu acho que quando eles pensaram nisso [no cancelamento], eles não pensaram, em momento nenhum nessa cadeia produtiva das artes, do esporte, do turismo. Como também não pensaram no público beneficiado por isso”.
Todos receberam a notícia de cancelamento com indignação, afirmou Xisto, considerando que o comitê técnico tomou a decisão “baseada em achismos”.
Posicionamento da Fundação Renova
A Agência Primaz encaminhou à Fundação Renova os seguintes questionamentos:
- A Fundação Renova vai acatar a deliberação do CT-ECLET ou pretende adotar alguma medida para reverter esse quadro. Nesse caso, quais seriam essas medidas?
- Qual o procedimento a ser adotado para a apuração das denúncias de supostas irregularidades, tanto no território de Mariana, quanto nos demais territórios, em especial quanto à formulada por uma representante de Governador Valadares, relativa ao envolvimento de pessoas integrantes da equipe de análise e julgamento das propostas, com grau de parentesco com proponentes. Independentemente do local em que as denúncias ocorrerem, a Fundação Renova pretende averiguar a possibilidade de terem ocorrido em todos os territórios abrangidos pelo edital?
- Qual é o cronograma previsto para a análise das denúncias e de elaboração e publicação de novo edital?
Sem apresentar respostas a cada item específico, a Renova encaminhou nota às 16h28 desta terça-feira (14) à redação da Agência Primaz, na qual informa que, no momento, o procedimento de contratação dos projetos está suspenso e que a confirmação do cancelamento do edital ainda depende de apreciação do Comitê Interfederativo (CIF), ao qual é subordinada a CT-ECLET.
Confira a íntegra da nota de posicionamento da Fundação Renova:
“A Câmara Técnica (CT) de Educação, Cultura, Lazer, Esporte e Turismo debateu, votou e aprovou recomendação ao Comitê Interfederativo (CIF) de cancelamento do 3º Edital Doce, em 10/11/23. Assim, o início da assinatura de contratos dos selecionados na 3ª edição do Edital Doce está suspenso, até a submissão e apreciação do CIF. A Fundação Renova se manifestará junto ao CIF em momento oportuno.
Em eventual cancelamento do 3º Edital Doce por parte do CIF, a Fundação Renova apresentará um plano de trabalho para possibilitar a realização, em acordo com a CT e o CIF, no menor tempo possível, da 3ª edição do edital.
A seleção dos projetos e a indicação dos julgadores é realizada por uma empresa contratada e independente. Primando sempre pela transparência e lisura de seus processos, a Fundação Renova esclarece que casos de denúncias e/ou possíveis irregularidades podem ser enviados ao Canal Confidencial (0800 7210717) ou nos Canais de Relacionamento da Fundação Renova para apuração”.
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