Por que e como fazer uma testagem para COVID na população de Mariana?
Proposta de inquérito soroepidemiológico em Mariana/MG
- Adriana Lúcia Meireles (*)
- Carolina Ali Santos (*)
- Márcio Antônio Moreira Galvão (*)
- George Luiz Lins Machado Coelho (8)
- 23/06/2020
Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “editoriais”
Compartilhe:
A COVID-19 é uma doença produzida pelo Coronavírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS-CoV-2) que faz parte de uma ampla família de vírus que pode causar enfermidade em humanos e animais . Esse vírus se espalhou rapidamente pelo mundo e levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a classificar essa doença como uma emergência de saúde internacional e declarar em 11 de março de 2020, a pandemia de COVID-19.
Em nível global, a pandemia tem mostrado sérios impactos econômicos e sanitários, bem como na organização familiar, do trabalho e da sociedade como um todo. A velocidade da disseminação e alta letalidade representam urgentes desafios para os sistemas de saúde em todo o mundo.
No dia 19 de junho de 2020, no mundo eram mais de 8,5 milhões de casos confirmados com mais de 454 mil mortes no mundo. No Brasil, eram mais de 978 mil casos confirmados e 47,5 mil mortes.
Segundo os sites Dados Transparentes, IBGE e Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais:
Entretanto, esses dados acima não refletem a real prevalência da COVID-19 na população geral, pois os testes são realizados apenas nas pessoas com sintomas moderados a graves que buscam os serviços de saúde.
Sabe-se que 60% das pessoas infectadas pelo COVID-19 apresentam sintomas leves ou até nenhum sintoma (os chamados assintomáticos e pré-sintomáticos), porém eles têm importante papel na dinâmica da transmissão do vírus.
A pesquisa proposta pelos pesquisadores da UFOP permitirá ter uma boa estimativa da prevalência da infecção pelo novo coronavírus na população, avaliando os principais sintomas e analisando a velocidade de expansão da infecção em uma amostra representativa da população de Mariana/MG.
Em contextos de novas epidemias como a da COVID-19 na qual ainda não há prevenção por imunização, não há medidas profiláticas e o protocolo de tratamento encontra-se dinamicamente em construção, medidas de mitigação relativas ao distanciamento social e campanhas de comunicação de riscos para impedir ou desacelerar a expansão da epidemia tornam-se necessárias.
Assim, conhecer a magnitude real da doença, sua dinâmica de transmissão e sua distribuição demográfica, geográfica e social, por meio de indicadores precisos que possam predizer os riscos de adoecer, projetar seu comportamento no tempo, além da percepção do risco é chave para prevenção de novos casos e óbitos na população.
Além disso, conhecer o real cenário epidemiológico subsidia a tomada de decisão dos gestores no sentido da melhor organização adequada dos serviços de saúde e no equacionamento de suas carências, com vistas a qualificar a assistência e humanizar o cuidado. Além disso, dentro do quadro atual de políticas restritivas quanto ao contato social, conhecer a prevalência de infecção na população, e, em consequência, o número de suscetíveis, será essencial para planejar a volta gradativa às atividades normais da população.
Conhecer a real prevalência da infecção pelo novo coronavírus na população geral também irá auxiliar a uma busca ativa de contatos pela vigilância epidemiológica, uma assistência em tempo oportuno e a tomada de decisão pelos gestores.
Além das dificuldades inerentes ao processo de diagnóstico e notificação decorrentes da capacidade instalada deficitária e escassez de recursos humanos nos serviços de saúde, há de se considerar a determinação social da doença. Fatores relacionados às desigualdades sociais, como saneamento, moradia, trabalho, hábitos de vida e acesso aos serviços de saúde em tempo oportuno, podem se interagir e interferir na dinâmica da transmissão e na gravidade da doença, principalmente considerando as iniquidades sociais e urbanas que geram populações diferentes serem mais sujeitas ao risco da infecção.
Objetivos da pesquisa
A pesquisa tem como objetivo conhecer o total de residentes do município de Mariana que foram infectadas pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), sua distribuição geográfica por setor censitário/bairro, e seus efeitos socioeconômicos e na saúde da população.
Assim, será possível identificar a proporção de pessoas com teste positivo (teste rápido ou ELISA com soro) que foram sintomáticas leves e as assintomáticas; estimar a subnotificação na população; conhecer as características de idade, sexo, renda, profissão, cor da pele dos indivíduos infectados, local de residência; identificar o efeito da pandemia na alimentação, nos hábitos de vida e na saúde mental da população estudada diante da pandemia.
Como será realizada a pesquisa
A pesquisa será realizada em quatro etapas, com intervalo de 21 dias entre cada etapa. Em cada uma delas, 500 domicílios da sede do município de Mariana serão visitados, totalizando ao final das 4 etapas 2000 domicílios. A definição dos residentes de Mariana que serão convidados a participar se dará por três sorteios subsequentes realizados por software estatístico, e sob responsabilidade dos pesquisadores. Serão primeiramente sorteados os setores censitários por bairro (ver mapa) e em seguida, serão sorteados os domicílios dentro do setor censitário/bairro. Dentro de cada domicílio será sorteado um morador com idade maior ou igual a 18 anos para responder ao questionário e realizar o teste rápido (ou a coleta de sangue venoso). Se o resultado do teste for positivo, os outros moradores do domicílio serão testados.
A coleta de informações e de sangue venoso nos domicílios será realizada pelos Agentes Comunitários de Saúde da Estratégia de Saúde da Família e Flebotomistas da Secretaria de Saúde de Mariana, sob a coordenação de campo de pesquisadores ligados à UFOP. O processamento das análises sorológicas será realizado no Laboratório de Epidemiologia da Escola de Medicina da UFOP.
O questionário será aplicado no domicílio conterá perguntas sobre idade, cor da pele, profissão, escolaridade, renda familiar, relato de viagens no último mês, se tem ou teve contato com caso suspeito ou confirmado de COVID-19, sintomas gripais e se buscou o serviço de saúde no último mês, adoção de medidas preventivas (distanciamento social, uso de álcool em gel, máscara entre outros).
Os participantes da pesquisa serão convidados a responder outro questionário por telefone em momento posterior a ser agendado de acordo com sua disponibilidade, com o objetivo de investigar alimentação, hábitos de vida (prática de atividade física e comportamento sedentário), sintomas de ansiedade e depressão.
Benefícios para o município
Conhecer a dinâmica e o perfil de adoecimento pode contribuir para a prevenção de novos casos e, assim, diminuir sua letalidade, contribuindo para a qualificação do cuidado em saúde, tanto no Sistema Único de Saúde como na rede privada. A partir do fornecimento de informações qualificadas para a população, profissionais de saúde e os gestores poderão contribuir para o incremento da parceria entre estes atores sociais e a governança das cidades.
Além disso, os resultados obtidos poderão contribuir para aprofundar o conhecimento das desigualdades sociais nas cidades do estudo e para a instituição de políticas públicas que minimizem estas iniquidades e seus impactos na saúde e alimentação da população.
(*) Adriana Lúcia Meireles, Carolina Ali Santos, Márcio Antônio Moreira Galvão e George
Luiz Lins Machado Coelho são professores/pesquisadores da Universidade Federal de Ouro Preto – UFOP
Veja mais do Especial 100 dias de Covid-19 em Mariana