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Hoje é terça-feira, 3 de dezembro de 2024

“Isolaram o Rei! Isolaram o Rei!”

Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “Editoriais”

A queda do rei no xadrez
Foto: GR Stocks/Unsplash

Ouça o áudio de "Isolaram o Rei! Isolaram o Rei!", do colunista Alexandre Amorim:

Era possível ouvir os brados dos dois cavaleiros enquanto partiam velozes para tentar proteger o Rei. Da distância longa, era possível ver as torres devastadas. Elas já não mais ofereciam qualquer segurança ao Rei. Estavam imóveis e não poderiam fazer mais nada.

Enquanto lutávamos com a horda de soldados inimigos em nosso flanco, podíamos todos ouvir as discussões da alta corte, com alguns de seus integrantes distantes pelo campo de batalha, outros cortesãos inertes e alguns chegando tarde demais para ajudar.

Disseram que houvera donzela gentil, branca e cuidadosa, que havia ofertado ao Rei algo de suave para beber e o que de melhor havia encontrado nas cercanias para se comer. Também haviam dito que isto havia acontecido já há alguns dias.

Alguém havia dito que ela havia sido recolhida para fora do campo de batalha com algumas lágrimas que corriam velozes do seu rosto cálido, em direção à terra calcinada dos conflitos que havia existido ali.

Não há quaisquer relatos indicando que ali nasceu qualquer flor, como dizem os poemas.

Somente paramos de lutar quando ouvimos distantes a canção que um bardo se pôs a tocar. Houve silêncio. O metal e a dor pararam por algum momento.

No desnecessário cortejo do Rei, houve aqueles que desrespeitaram o momento com vozes altas, conversas inoportunas e tentativas de humor flácido e descartável. Mas vários da corte seguiam em silêncio. Damas e cortesãs seguiam em suas carruagens, seja para poupá-las das amarguras dos últimos passos para acompanhar o Rei, seja para poupar aqueles que seguiam em silêncio de suas maquiagens deslocadas e das rugas espirituais que ficavam tão evidentes à luz da dor da partida. A velhice de suas almas, presas em suas faces jovens, não mais enganavam ninguém da corte.

Os peões sempre seguem a pé. É da natureza deles guardar e proteger. E não havia muito mais do que proteger ali além do respeito e carinho que sempre haviam partilhado. Era um rei calado, mas bondoso. Deveras distante, é verdade. Mas fazia-se conhecer presente com imensa facilidade.

Alguém disse que havia visto a donzela branca a chorar em algum lugar daquela praça de descanso. Disseram que ela chorava com os olhos tristes e perguntava: “Deram-lhe o que comer? Ele estava fraco de tanto batalhar!”

Mas o marasmo, diferentemente do que a sabedoria popular dita, não se trata de inação ou da ação covarde daquele que prosta-se face peleja mortal. A verdade é bem pior e muito mais silenciosa do que mereceria um dia ser escrito aqui.

Não sei se lhe deram resposta ou se o choro foi causado pela mesma. Não sei dizer.
Sou um peão de casa distante. Lutei batalha diagonal ao lado dele.

Resta-me agora ver em qual jogo posicionarei, pois batalhas, meu caro Rei. Ah… estas são imortais.

Este pequeno texto é uma homenagem ao Sr. Almério Amorim Castro. Meu tio partiu deixando um coração calado e triste em meu peito. Até um dia, querido tio. Obrigado por tudo.

Picture of Alexandre Amorim
Alexandre Amorim é mineiro, pai e defensor da utilização de novas tecnologias em prol da liberdade, educação e desenvolvimento cultural da comunidade de Mariana. Estudante perpétuo, é orgulhosamente um bibliotecário e acredita no impacto positivo da leitura para o futuro.
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