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Hoje é terça-feira, 1 de abril de 2025

O Óscar brasileiro e a consagração da nossa vontade em louvar a derrota

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Cartaz de divulgação do filme premiado com o Óscar 2025

Ouça o áudio de "O Óscar brasileiro e a consagração da nossa vontade em louvar a derrota", do colunista Kael Ladislau:

O dia 02 de março foi especial para o Brasil: pela primeira vez, o país levou a estatueta do Óscar com o filme “Ainda Estou Aqui”.

Existiam mais duas categorias com representantes brazucas: a mesma película em melhor filme e Fernanda Torres em melhor atriz, mas em ambos saímos derrotados.

A verdade é que apenas em “melhor filme internacional” tínhamos chance. E levamos.

A euforia pela vitória em tudo fez com que as redes sociais virassem uma celebração a nossa derrota nas outras duas categorias.

Todos os posts dizendo que fomos roubados, comparando Mikey Maddison (a vencedora de melhor atriz em 2025) com Gwyneth Paltrow (vendedora em 1999, em cima de Fernanda Montenegro, mãe da postulante brasileira em 2025).

A derrota de Fernanda Torres inundou e inviabilizou a conquista inédita do Brasil.

É curioso, mas alguns dias antes algo parecido rolou com Milton Nascimento. O cantor foi indicado a Melhor Álbum de Jazz Vocal ao lado de Esperanza Spalding no Grammy. Injustamente, ele foi “barrado” de participar no espaço mais valorizado ao lado de sua parceira de álbum.

O episódio repercutiu muito mais por não concederem um espaço de “grandeza” a alguém lendário como Milton Nascimento do que o fato do evento não dar condições a uma pessoa idosa para assistir à cerimônia com acessibilidade para alguém com dificuldade de locomoção – como revelou a nota do cantor nas redes sociais.

Esse episódio repercutiu tanto e muito menos do que o fato de que o mesmo Milton seria protagonista em um enredo de escola de samba no Rio de Janeiro, pela Portela, em uma das maiores festas mundiais e genuinamente brasileira.

Tanto a derrota de Nanda, quanto o “esnobe” do Grammy a Bituca, ganharam louvores de mídia, público e intelectuais, passando batido os dois maiores feitos: a consagração do cinema nacional diante o maior mercado dessa indústria quanto a celebração de uma lenda junto a uma festa do povo brasileiro.

É revelador, talvez um pouco triste.

Fato é que uma obra nacional como “Ainda Estou Aqui” levará mais público brasileiro aos cinemas, brasileiros e internacionais. Bituca, mais do que um esnobe em uma premiação genuinamente estadunidense, foi celebrado ao lado de um público sedento de alegria e mais gente foi apresentado a essa figura já emblemática em nossa cultura.

É divertido e um ato patriótico – no melhor dos sentidos dessa palavra – querer ver nossos nomes em locais lá fora que deem tanto glamour como Grammy quanto o Óscar.

Mas, ainda mais consagrador é vê-los sendo ovacionados aqui, em solo nacional. Ver Fernanda Torres sendo boneca de Olinda, fantasias de carnaval, se impregnar ainda mais no nosso imaginário.

Bem como Bituca em um carro dourado de Sol sendo o centro de atenções no última e sacramentar alegoria dos desfiles da escola de samba.

Se é para nos espelhar no que é de fora, que façamos como a Letônia. O pequeno país europeu louvou a vitória de “Flow” no Óscar em “melhor filme de animação” com eventos de exibição, estatuas com o gato protagonista e uma grande festa que se já enraizou na memória dos letões.

E, curiosamente, o mesmo filme saiu derrotado justo em “melhor filme internacional”, vencido pelo Brasil.

Bituca e Fernanda Torres merecem o nosso chão, nossa alegria e nosso povo. Se alguém fora daqui achar conveniente celebrar ambos, cedemos humildemente a nossa festa e tempero para valorizarem o que, ‘pra’ nós, é inato.

Foto de Kael Ladislau
Kael Ladislau é Jornalista graduado pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
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