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Hoje é sábado, 26 de abril de 2025

Dias Perfeitos: uma ode à rotina bem aproveitada e sem metas

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Arte para a crítica do filme Dias Perfeitos

Ouça o áudio de "Dias Perfeitos: uma ode à rotina bem aproveitada e sem metas", do colunista Kael Ladislau

Hirayama é um faxineiro japonês que passa os dias limpando banheiros públicos em Tóquio. Dias Perfeitos, filme do consagrado diretor Wim Wenders acompanha o trabalhador e nos apresenta o que há de melhor em sua vida: a apreciação da rotina.

Quem assiste a Dias Perfeitos sem tomar o cuidado de colocar o filme em seu devido lugar poderá chamá-lo de tedioso, chato. Mas, com alguma boa vontade, é preciso reconhecer o seu poder em transformar a rotina como algo proveitoso e bom.

Não dá para julgar o espectador que chama Dias Perfeitos de chato, no entanto. Nós, neste momento, passamos por uma época de vídeos acelerados, pílulas de produtividade, lista de prioridades, metas a serem atingidas.

É tudo muito imediato e rápido. Cada minuto importa para uma meta a ser batida.

O protagonista do filme passa por momentos que até podemos julgar assim. Afinal, com seu carro ele percorre Tóquio e precisa manter os banheiros limpos, com o máximo de perfeição.

Além de acompanhar sua jornada que aparece, sim, exaustiva e não muito longe do que qualquer outro trabalhador ao longo do mundo, nós conseguimos ver um pouco além da vida de Hirayama.

Ele gosta de ler, aprecia músicas – o filme tem uma bela trilha sonora, diga-se – fotografa árvores enquanto almoça, toma banho em banheiros privados na cidade.

O filme faz esse registro e tudo parece muito cronometrado. Em determinado momento, podemos dizer exatamente o que o protagonista fará em seguida. E acertar.

Dias Perfeitos não é aquele filme que possa surpreender pela dinâmica de suas ações, mas por mostrar como podemos nos satisfazer com o que possuímos de mais valor: nosso tempo, nossa rotina.

Existe um trecho de uma canção da banda brasileira O Terno chamada Tudo Que eu Não Fiz em que Tim Bernardes, o vocalista, canta: “eu quero me sentir exatamente onde estou”.

É um trecho que me fez pensar muito em Dias Perfeitos: será que essa ânsia pelo futuro, por bater metas, por querer ser melhor amanhã me faz não aproveitar o agora?

É claro que todo mundo tem e deve melhorar de vida. Mas será que não é um pouco desrespeitoso com o nosso passado não aproveitar o agora?

Dias Perfeitos mostra uma pessoa que limpa banheiros públicos, que tem questões familiares a resolver, que dorme em um colchão em um cômodo que é sua casa.

Não é o que convencionalmente se poderia chamar de melhores condições de vidas.

Mas, por que não?

Wenders mostra Hirayama completamente satisfeito com o que faz e com o que vive. Sua rotina é satisfatória e a cada página de livro que lê, cada foto que tira de uma árvore é como se houvesse uma meta batida.

A chegada de uma sobrinha a sua casa parece interromper esse fluxo de acontecimentos completamente bem regrado, ou mesmo o amigo de trabalho um pouco estúpido parece convergir contra esse dia perfeito de Hirayama.

Mas o que fica, na verdade, é a apreciação do nosso tempo presente. É que a simplicidade pode ter a complexidade de satisfação que todos nós, tanto no passado quanto no presente, buscamos.

Dias Perfeitos está disponível na Mubi e pode ser alugado via Amazon. E deve ser apreciado aos poucos, como qualquer coisa que você tem ao seu lado.

Foto de Kael Ladislau
Kael Ladislau é Jornalista graduado pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
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