Valorizar os professores sempre foi necessário

Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “editoriais”

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Neste mês de outubro, pensei bastante sobre a comemoração do Dia dos Professores. Celebrar ou não essa data? A pandemia da Covid-19 afetou, diretamente, também as pessoas ligadas de alguma forma à educação, e não tem sido fácil enfrentar os desafios diários. Por isso, resolvi abordar novamente sobre o ofício dos professores, ao qual tenho dedicado os meus dias, desde a década de 1990. Em um dos meus primeiros textos, nesta coluna, escrevi sobre a “suposta” vida folgada dos professores, quando uma fala grosseira a respeito dos pedagogos chamou a atenção de usuários na Internet. Agora, após sete meses de ensino remoto, penso ainda mais sobre esse descrédito dispensado aos docentes, e como ele revela significativamente a inação do Estado e de parte da sociedade com a educação.

Assim que o isolamento social foi imposto como medida necessária para o controle da pandemia, as escolas se depararam com o sério problema da reorganização urgente das atividades para não interromperem as aulas. E, como se sabe, o desdobramento disso tem sido penoso: muitas delas não conseguiram se adaptar e há vários alunos que, certamente, perderão o ano letivo. É efeito de um Estado absurdamente desigual, que reforça o abismo entre assistidos e desassistidos, e, nesse cenário desolador, muitos dirão: “O que tenho com isso? É o preço a ser pago com a quarentena”. Não é por aí, mas este já seria um tema para outro texto. Ressalta-se, ainda, que, na complexa teia de relações que o espaço da escola engendra, fato é que, quando se fala em educação, palpites pululam de todas as partes, importando menos a voz de quem está dentro dela.

Direcionadas, especificamente, aos professores, neste fatídico ano de 2020, duas falas têm se destacado: de um lado, a afirmação de que essas pessoas não querem trabalhar; e, do outro lado, a visão de que esses profissionais fazem o que podem. E volta a discussão de que ninguém quer a licenciatura, sobrando essa escolha, portanto, para os chamados “piores”.  Nesse ponto da reflexão, um adendo é necessário a ser feito: pessoas mais ou menos qualificadas para exercer um ofício nunca foi exclusividade de uma profissão, e bem sabemos disso, mas já é lugar comum a acusação aos professores, uma vez que a sala de aula, no Brasil, é um espaço de seleção, e romper com isso é muito difícil. Ainda, hoje, aceitamos ou engolimos narrativas de exclusão, e, por desdobramento, é mais fácil jogar a batata quente nas mãos daqueles que estão em contato direto e diário com os alunos. É sensato afirmar, nesse sentido, que as licenciaturas não aparecem no topo da lista dos sonhos dos futuros universitários, porém a questão vai muito além do que preconizam discursos preconceituosos e de zombaria propagados por aí.

No decorrer desta quarentena, com o ensino híbrido, é claro que muita coisa mudou, sobretudo, a forma de interagir através de uma tela. O contato direto tão caro à escola, foi interrompido, o que, por si só, já é um problema. Nada substitui a vida escolar. O encontro, as conversas, olho no olho… precisamos disso, alunos e professores, principalmente. No entanto, a necessidade mudou o rumo das coisas, e estabelecer uma nova rotina, da noite para o dia, pode ser muito difícil. Horas a mais de trabalho… Muitas horas a mais… Planejamentos, gravações, edições, plataformas, revisão do material na plataforma, aula on-line, devolutiva de trabalhos, atendimento de pequenos grupos e individuais, mensagens recebidas na plataforma e no telefone pessoal. Responder imediatamente. Respirar. Voltar à questão de um, responder aos demais. Quantas turmas? Quantas escolas? Na Educação Básica, principalmente, parte considerável dos docentes está sempre em trânsito, pois é preciso pagar as contas no fim do mês. Atender duzentos ou mais alunos e saber o nome de cada um deles. Pensar estratégias diferentes. Estudar. Ensino híbrido? Uma parcela com suporte adequado, um bom computador em casa, mais de um roteador, para garantir a realização da aula on-line, celular de última geração. Quem ficou de fora, pior para ele ou para ela, porque será necessário improvisar.

E assim seguem os dias… Professor não trabalha? Faz o que pode? Tem trabalhado demais. Se a questão de ser professor ficar restrita à falta de opção, pior para o Brasil. Aos professores que consideram não ter tido alternativa, eu lamento muito. Não deve ser assim. Aos apaixonados que se arrependeram, é preciso encontrar novos caminhos. Aos convictos, aqueles que acreditam no que fazem, diariamente, com a compreensão da importância do seu ofício, eu espero que lutem por melhorias das condições de trabalho e pela valorização do magistério, porque o nosso ofício é importante demais.

(*) Giseli Barros é professora, mestra em Literatura Brasileira pela UFMG, membro efetivo da ALACIB-Mariana

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