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Hoje é sábado, 23 de novembro de 2024

Luiz Loureiro/Agência Primaz

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Reportagem da Pública, Agência de Jornalismo Investigativo, divulgada nesta segunda-feira (04), informa que laudo técnico contratado pela Fundação Renova classifica localidades dos municípios de Mariana e Barra Longa, inclusive a própria área urbana desta cidade, atingidas pela lama da barragem de Fundão, como locais de perigo Categoria A, ou seja de “perigo urgente para a saúde pública”. A reportagem ainda aponta para omissão do Governo de Minas e da Fundação Renova, pelo adiamento da divulgação dos resultados do estudo.

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A empresa Ambios foi contratada pela Fundação Renova, atendendo solicitação da Câmara Técnica de Saúde (CT-Saúde), uma das instâncias do Comitê Interfederativo (CIF), encarregado de orientar, fiscalizar e validar os atos da fundação instituída pela Samarco e suas controladoras (Vale e BHP Billiton). De acordo com a reportagem da Pública (clique aqui para ter acesso à matéria completa), o resultado do estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana (ARSH), realizado em Mariana e Barra Longa, teria sido entregue à Renova em 22 de março deste ano, sendo encaminhado à Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais em 17 de maio. Segundo a reportagem, o estudo concluiu que a poeira das casas e a superfície do solo nos municípios de Mariana e Barra Longa está contaminada com metais pesados tais como cádmio, níquel, zinco e cobre, com concentrações superiores aos limites toleráveis admitidos pela legislação brasileira. A análise foi feita em amostras coletadas nos distritos marianenses de Bento Rodrigues, Camargos, Ponte do Gama, Paracatu de Baixo, Paracatu de Cima, Pedras, Borba e Campinas, bem como na cidade de Barra Longa (cuja sede sofreu invasão da lama) e nas localidades de Barretos, Mandioca, Gesteira e Volta da Capela.

Esta exposição pode determinar a ocorrência de efeitos lesivos

sobre a saúde das mesmas, imediatos ou de longo prazo, devendo

ser objeto de recomendações de ações de saúde pertinentes para

sua prevenção e assistência (Relatório ARSH – Ambios)

Diante dos resultados obtidos, a empresa Ambio incluiu no relatório (clique aqui para acesso ao texto completo) uma série de recomendações de ações de saúde e de ações ambientais, justificadas pela constatação de “perigo para a saúde das populações expostas aos contaminantes definidos através da ingestão, inalação ou absorção dérmica das partículas de solo superficial e/ou da poeira domiciliar contaminadas”.

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O laudo da Ambios não aponta contaminação em alimentos em contato direto com a lama de rejeitos de minério ou provenientes de animais, como leite e ovos, assim como considera que não foram encontradas concentrações relevantes de metais pesados na água do Rio Doce. Os pesquisadores, entretanto, fazem um alerta sobre a possibilidade de contaminação futura.

Atingidos não são comunicados

A mencionada reportagem informa que havia sido estabelecido um cronograma de apresentação dos resultados aos atingidos de Mariana e Barra Longa entre os dias 22 e 25 de setembro, o que não teria ocorrido em função de omissão da Renova e do governo estadual, cuja Secretaria de Saúde teria solicitado à CT-Saúde um adiamento dessa atividade por 90 dias.

Essas informações foram confirmadas à reportagem da Agência Primaz pelo Procurador da República, Edmundo Antonio Dias, que encontra-se em Mariana, participando da reunião mensal da CT-Saúde e declarou ver com extrema preocupação o adiamento da divulgação dos resultados do estudo. “O Ministério Público Federal sempre entendeu que as devolutivas [comunicações dos resultados] deveriam acontecer o quanto antes”, afirmou Edmundo Dias, lembrando que havia solicitado, ainda em agosto, durante audiência pública na Assembléia Legislativa, que o Sub-secretário de Vigilância em Saúde de Minas Gerais antecipasse as datas. Edmundo confirmou, ainda, ter recebido como resposta a informação do pedido de adiamento “por até 90 dias”, encaminhado ao ex-coordenador da CT-Saúde, Kleber Rangel Silva, que deixou o posto em setembro, sendo posteriormente substituído por Gian Gabriel Guglielmelli.

A preocupação do representante do Ministério Público Federal (MPF) é compartilhada pelo Secretário Municipal de Saúde de Mariana, Danilo Brito, que também concedeu entrevista à Agência Primaz. Ele considera que a situação é “extremamente desconfortável”, uma vez que o governo estadual, que deveria ser o responsável pelas devolutivas, “tentou tirar isto da câmara técnica (…), alinhar com a Renova e fazer essa devolutiva”. Danilo ressalta, inclusive, que são 42 municípios afetados e o estudo somente foi feito, até agora, em Mariana e Barra Longa, sem que se consiga completar a finalidade da análise, ou seja, informar a população envolvida e construir com ela um plano de ação eficaz. “Para você ter uma ideia, nós temos três estudos. Três estudos com metodologias diferentes. Nós temos o da Ambios que, (…) por incrível que pareça, não deu contaminação na água, não deu contaminação nos alimentos, não deu contaminação no ar”, declara Danilo, informando que também foram feitos dois outros estudos, desenvolvidos pela TecnoHidro e pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). Desse último, o secretário diz que tomou conhecimento por intermédio da Cáritas (entidade contratada para assessoramento aos atingidos). “E esse me preocupou muito, porque deu contaminação no ovo, no leite, na carne de boi. Mas eles não fizeram análise no frango, na carne de porco”, afirmou Danilo, enfatizando que é preciso entender e conhecer melhor as metodologias utilizadas, embora discorde da não divulgação dos resultados. Danilo ainda levanta a questão da representatividade desses estudos, em especial o desenvolvido pela Ambios. “Quando esse estudo foi contratado pela Câmara Técnica, ele foi contratado de uma metodologia, de uma forma, e foi realizado de outra” contesta o secretário, sob a alegação da Renova que o valor seria muito alto.

Questionado sobre como trabalhar com vários estudos, desenvolvidos com metodologias diferentes, o procurador Edmundo Antônio Dias não vê problemas, desde que seus resultados sejam efetivamente analisados dentro de suas respectivas metodologias, sem que um estudo seja usado como contraponto a outro, de acordo com a conveniência de cada um dos interessados. Além disso, comentando sobre a não realização do estudo da Ambios na amplitude solicitada, levanta um outro questionamento: “A preocupação de fato é com o custo do estudo que ela [Renova] não quer bancar em sua integralidade, ou é com o custo da reparação das pessoas atingidas?” questiona o procurador, ressaltando que, na hipótese de comprovação dos riscos à saúde das pessoas, as empresas precisarão custear todas as medidas de tratamento e de prevenção de adoecimentos que se façam necessárias, dentro do princípio do “poluidor pagador”.

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Posição do Governo de Minas e da Renova

A reportagem da Pública, em atualização feita na terça-feira (05), disponibilizou nota do Governo de Minas (clique aqui para acessar a íntegra do posicionamento governamental) a respeito do assunto. De acordo com o documento, assinado Comitê Gestou Pró-Rio Doce, “em 7 de agosto de 2019 foram protocolados junto à Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES/MG) os relatórios e íntegra dos documentos referentes ao EARSH produzido pela Ambios, contratada pela Fundação Renova”, e que, estando o relatório em análise por uma equipe setorial da SES/MG, está sendo “elaborado um Plano de Ação que contemple a adoção de todas as medidas de curto, médio e longo prazo necessárias para minorar os danos causados. Ambos os materiais serão publicizados assim que as análises sobre eles forem concluídas”. Afirma ainda que “foram definidas ações de curto prazo com objetivo de direcionar a atuação da Fundação Renova, que se pronunciará sobre os prazos apresentados para implementação das ações até a próxima sexta-feira (8/11)”.

De sua parte, a Fundação Renova divulgou nota informando que os estudos “estão sendo complementados para se tornarem conclusivos. Os dados estão sendo avaliados juntamente com o governo do estado de Minas Gerais e as prefeituras de Mariana e Barra Longa”, ressaltando que “todos os dados, informações e relatórios produzidos pelo estudo são proibidos de serem publicados pelas instituições contratadas e pela Fundação Renova, sem autorização das autoridades públicas”. A nota é finalizada com a informação que, de posse desses dois estudos [o outro foi desenvolvido pelas empresas TecnoHidro e Grupo EPA], “se faz necessário discutir, junto ao Poder Público, os resultados encontrados e o aprofundamento dos mesmos para definição de eventuais ações nas áreas de saúde e do meio ambiente”.

Leia abaixo a íntegra da nota da Fundação Renova:

“A Fundação Renova informa que contratou estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana e ao meio ambiente que estão sendo complementados para se tornarem conclusivos. Os dados estão sendo avaliados juntamente com o governo do estado de Minas Gerais e as prefeituras de Mariana e Barra Longa.

Os estudos têm por objetivo identificar se há concentração de elementos químicos no ambiente que possam representar potenciais riscos à saúde da população e sua relação com o rompimento da barragem de Fundão. Os resultados ajudarão na definição de ações e responsabilidades junto às regiões impactadas pelo rompimento da barragem de Fundão. A Fundação Renova esclarece que o Estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana foi realizado nos termos da Deliberação CIF 106 de 2017.

Em cumprimento à Nota Técnica 11/2017, todos os dados, informações e relatórios produzidos pelo estudo são proibidos de serem publicados pelas instituições contratadas e pela Fundação Renova, sem autorização das autoridades públicas.

A Fundação esclarece ainda que os estudos apresentados pela Ambios foram realizados nas áreas diretamente atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana e Barra Longa, e não tiveram por objetivo estabelecer correlação entre os resultados encontrados e o rompimento.

O estudo integrado de avaliação de risco à saúde e meio ambiente, realizado pelas empresas TecnoHidro e Grupo EPA, por sua vez, analisou áreas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão e regiões que não foram atingidas, mas que têm condições físicas semelhantes e apresentou um número de amostras maior. Foi incluída, ainda, a avaliação de concentrações históricas da região.

A partir desses dois estudos — que passaram por uma revisão por pares para controle de qualidade — se faz necessário discutir, junto ao Poder Público, os resultados encontrados e o aprofundamento dos mesmos para definição de eventuais ações nas áreas de saúde e do meio ambiente.