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Hoje é sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Crepúsculo de cores quentes

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Que céu avermelhado, mesclado de cores quentes. Laranja, vermelho e cinza-escuro, é o crepúsculo. Crepusculares espocam de uma ponta a outra. Portão de aço pintado com cores secundárias, remetem-me à infância. Vasilhas antigas de mãe ganharam novo espaço na casa: a chaleira, o caneco grande de ferver leite… Lavei as panelas, lembrando-me do apito musical da chaleira. Mãe avisava: “o leite ferveu!” A molecada rumava para a cozinha… Rosa tomou conta do muro alto. Rosa é cor do amor-purificador. Purifica-DOR. Jardim de casa coberto de flores; me perdi nas paletas diversificadas das pétalas. Minhas retinas alimentam meu espírito. Junho não chegou, mas indícios de solstício de inverno não esperam o calendário. Mudança de estação é mudança de rumo. Vou rumar para a poesia, perdão e cerimônia. Vou rumar para outra estação. Frio, roupas quentes lavadas e perfumadas. Somos criadores, inventamos muito mais do que cobertores. Inventamos armas terríveis. Inventamos parafernálias que facilitam e dificultam a vida. Todo excesso é prejudicial, ar e água em excesso fazem mal. Arrumo minhas roupas nas gavetas. Experimento-as. Que extraordinária sensação terapêutica: vestir-se bem! Penteio os cabelos, passo batom. Nunca fui excessivamente vaidosa. Olho-me no espelho. Sinto-me melhor. Calço sandálias. Ando de um lado para o outro da casa. Beberico água na taça de vidro. Passo café. Fervo leite na chaleira conservada. Coloco meio-pão no prato; com cerimônia. Não é nem cerimônia, é respeito e agradecimento ao alimento. Olho para o céu. O crepúsculo abriu asas para o infinito. Amanhã ele volta. Talvez nem tão crepuscular, nem tão intenso. Os milagres das estações nos surpreendem. Maritacas desfilam na fiação entre postes. Que parlamento natural auspicioso! Tenho medo de elas tomarem choque. Pássaros lançam voos sincronizados. Sinto as ausências da lagartixa e das formigas, assumo. Assumo que gosto de bicho e de plantas. Gosto de gostar e de voltar a gostar das pessoas, também. Outro dia propus a um desafeto que aprendêssemos a gostar um do outro. Temos bons planejamentos, intenções, iniciativas… Temos tanta coisa em comum. Perdoar é um ato de amor. Perdoar é resistir à tentação do eu-inimigo-de-mim-mesmo. Já fui inimigo-de-mim-mesmo; rumei para a redenção. Exercito a máxima: tentar dar o melhor de mim, sabendo de minhas fraquezas e tempestividades. Leio um artigo sobre orientações e gestão de centros escolares. Rumei para a Europa. Espanha tem o sistema de ensino similar ao brasileiro, apesar do gargalo enfrentado por imigrantes e pobres que não têm acesso a escolas subvencionadas. O que me agrada, no país europeu, são os educadores sociais, responsáveis por intermediar possíveis conflitos entre escola e família. Leitura técnica concluída. Peguei poesia, antes de trocar a roupa. Três doses farão bem ao espírito fatigado. Apago a luz da cozinha. Miro a chaleira e sorrio. Abraço meu corpo para me aquecer. Neste fim de maio já vivo intensamente o inverno; nem dou bola para o tal solstício agendado para zero hora e trinta e dois minutos do dia 21 de junho: é que a vida nos proporciona estações diversas para nos transformar, ciclicamente, em seres melhores/divinizados. Amanhã, quem sabe, toco o coração de um desafeto… Independentemente se crepúsculo de cores quentes ou frias, vou continuar a apreciar os milagres da natureza e a exercitar o perdão….

Picture of Andreia Donadon Leal
Andreia Donadon Leal é Mestre em Literatura, Especialista em Arteterapia, Artes Visuais e Doutoranda em Educação. Membro da Casa de Cultura- Academia Marianense de Letras, da AMULMIG e da ALACIB-MARIANA. Autora de 18 livros
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