Reflexões a respeito do blackface
“Indiscutivelmente, não a qualquer forma ou expressão de racismo, mas também não a qualquer forma de extremado radicalismo” (Vasconcelos, 2022)
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Recentemente, tomou conta da mídia na Região dos Inconfidentes o fato ocorrido em três Repúblicas de Ouro Preto, as particulares Cravo e Canela e Xamego e a Federal, Território Xavante, durante a festa da “Miss Bixo”. A festa temática faz parte de uma comemoração tradicional já de longos anos nas Repúblicas Ouropretanas e celebra a chegada dos calouros da UFOP à cidade. O problema surgiu por que alguns estudantes pintaram o rosto de negro e as fotos viralizaram nas redes sociais, com diversas pessoas e movimentos entendendo como uma associação ao movimento Blackface, uma prática que tem pelo menos 200 anos. Acredita-se que ela tenha se iniciado por volta de 1830 em Nova York, na qual pessoas negras eram ridicularizadas para o entretenimento de brancos. Estereótipos negativos vinham associados às piadas, principalmente nos Estados Unidos e na Europa.
A prática continuou em programas de TV e no teatro por boa parte do século 20. A BBC mesmo teve por 20 anos, entre 1958 e 1978, um programa que usava Blackface. O show, que se chamava The Black and White Minstrel Show, era extremamente popular, com uma audiência que chegou a atingir 16 milhões de pessoas. O programa ganhou o prestigioso prêmio Golden Rose of Montreux, em 1961.
Conforme os movimentos antirracistas foram crescendo, o Blackface foi sendo eliminado do entretenimento e, atualmente, é algo visto como vergonhoso e lamentável. Felizmente!
Independentemente de qualquer radicalismo e posicionamento dualista exacerbado, a ocorrência merece algumas reflexões.
Antes que qualquer ativista extremado julgue de forma indevida minhas reflexões, considero importante ressaltar que sou contra qualquer tipo de discriminação quer seja por raça, cor, sexo ou qualquer outra particularidade similar.
Em primeiro lugar precisamos considerar algumas questões culturais. Se voltarmos na linha do tempo, em um passado não muito distante e, talvez, até atualmente, vamos encontrar algumas evidências de que manifestações semelhantes à evidenciada na ocorrência eram bastante comuns e normalmente aceitas, tais como:
“Boi, boi, boi, boi da cara preta, pega essa criança que tem medo de careta”, “a situação está preta”, “o lado negro da história”, “lista negra” etc., etc., etc…
Vale lembrar que “Macaca de carvão”, “Carne preta”, “Beiçuda”, “um frangalho de nada são termos que o escritor Monteiro Lobato, o pai do Sítio do Pica-Pau Amarelo, usava em suas obras para se referir a pessoas negras…
Evidentemente que tais expressões hoje já não são mais aceitas, mas seria justo demonizar, condenar ou punir todos que, inadvertidamente ou não, ainda fazem uso dessas ou de outras formas de expressão? Ou não seria melhor partir para um programa de conscientização através de um debate amplo com os envolvidos, envolvendo os meios acadêmicos e sociais?
Entendo perfeitamente que não podemos permitir que esses vícios do passado continuem existindo e admitir que os jovens que pintaram os rostos de preto foram infelizes com a essa iniciativa, mas será que tinham consciência do significado desse ato e, mesmo se tinham, devem ser punidos com severidade a ponto de serem marginalizados e afetar fortemente a vida acadêmica e profissional deles? Será que a atitude deles foi tão grave assim?
Disse e repito: não podemos admitir que atitudes racistas continuem ocorrendo de forma indiscriminada na nossa sociedade, mas precisamos tomar muito cuidado para não cairmos no extremismo com medidas radicais onde tudo é proibido, senão daqui a pouco vamos criminalizar Monteiro Lobato e outros grandes expoentes da nossa literatura e da nossa história e queimar em praça pública suas obras!
Quem tem ouvidos que ouça!
Cesarius Gestão de Pessoas, investimento permanente no desenvolvimento do ser humano!