Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “Editoriais”
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Talvez o caro leitor já tenha experimentado a sensação que irei tentar descrever agora: um belo dia, acometido ou por experiência agradável, daquelas de se encontrar com um grande amigo, há muito distante pelos traçados que os caminhos que escolhemos em nossas vidas, nos levam a seguir, ou pela triste notícia de que uma pessoa que nos foi querida, recente ou em um pretérito mais distante, partiu desta para melhor.
Subitamente, uma ciranda de pessoas e contextos começam a nos impregnar de tal forma que se torna impossível não imaginar dos destinos que talvez tenham acometido pessoas que passaram pelas nossas vidas. E digo isto para tentarmos conhecer melhor a nós mesmos… Ao fazer tal exercício de reflexão, recordei-me de uma garota, quando ainda estava na longínqua 7ª série (ou seria a 8ª? Não consigo realmente me lembrar… apenas sei que era no Colégio Bernardo Monteiro – onde tive a oportunidade de criar uma boa amizade com o meu excelente amigo, Geraldo) que estudava em minha sala e sempre quando nossos olhos se encontravam, ela sorria para mim. Lembro-me dela pelo seu sorriso, seus olhos claros e seus cabelos loiros. Mas não me recordo do nome dela. Não me recordo de possuir qualquer lembrança contextualizada dela, onde interagimos de alguma forma significativa o suficiente para ter construído um caminho permanente para o cofre de minhas recordações permanentes no meu cérebro, talvez.
Mas, estranhamente, lembro de um passado ainda distante, desta vez com antigos colegas da 3ª ou 4ª série, ainda muito criança e lembro-me dos nomes deles: Jairo e Dalle.
E lembro-me destes nomes pois, na época, ao retornar do Colégio Regina Pacis, via ônibus escolar, eles passaram, sabe-se lá o motivo, a fazer o famigerado bullying comigo. Após vários episódios de chegar em casa machucado, preocupando minha mãe e enraivecendo o meu pai, finalmente fui motivado a acabar com a situação da única forma que ela pode ser cessada: reagindo. Mas o ponto não é este.
O ponto é: “Que diabos ocorre na nossa cabeça, quando ainda menores, que experiências péssimas ficam para sempre gravadas na nossa cabeça, mas que temos um desdém automático em prezar aqueles que nos querem bem? Será que somos tão duramente arquitetados para lembrarmos de ameaças, ainda que tão longínquas e tão neutralizadas pelo tempo, do que lembrarmos com mais detalhes das experiências agradáveis? Dos momentos de cálida ternura?”
Estes dias mesmo, estava realizando uma de minhas inúmeras reuniões e tive uma experiência muitíssimo agradável, em visita ao nosso Museu de Mariana “Casa Conde de Assumar”, que em breve estará disponível para todos visitarem – e eu indico MUITO que todos vão conhecer – onde, motivado pela beleza das paisagens, dos ambientes e do cuidado que está sendo observado tudo por lá, me recordei de alguns episódios.
O primeiro, quando Joshua Bell, famoso violinista, performou em uma das estações do metrô de Washington D.C., com seu violino Stradivarius caríssimo e de som impecavelmente límpido, durante duas horas. Neste intervalo de tempo, ele tocou a música de Bach, chamada Chaconne e que é considerada uma das músicas mais complexas e difíceis de serem tocadas, além de, obviamente, agradabilíssima. Neste episódio a cena mais corriqueira era a de pessoas, com seus cérebros no modo automático, andando robotizadas para seus afazeres. Alguns, deixavam algum dinheiro na caixa do violino, aberto ao chão e que custava mais que 2 milhões de dólares, para uma pessoa cujo assento mais modesto para presenciar sua apresentação, custa US$1.400,00 (quase R$7.000,00 hoje!). Cerca de 12 pessoas pararam para ouvir, durante estas duas horas. Várias e várias crianças tentavam parar para poder escutar, talvez ainda com os sentidos ordenados para buscar beleza e estupefação por todos os tesouros que o mundo ainda lhes tem a oferecer, mas, como disse, cerca de 99% das pessoas, absortas em seu cotidiano, com seus infinitos números de problemas mundanos, deixaram de apreciar esta oportunidade única.
Ali, naquele instante estava provado que a beleza, quando disputa com a rotina pela atenção, perde fragorosamente.
Antes de passar para a conclusão, gostaria tanto de convidar o leitor para procurar sobre a experiência de Bell no metrô, afim de se informar mais e melhor e também para convidá-los a ouvir a música Chaconne, de Bach. Acredite, mesmo não sendo fã de música clássica, esta obra é de tirar o fôlego.
Bem, seguindo com a nossa conversa, atento ao local da reunião, tão unicamente bonito pela paisagem agradável e inspiradora de nossa querida Mariana, falei de como o Museu havia sido tão feliz em sua concepção em promover esta experiência de ofertar tantas belezas a serem exploradas pelos seus futuros visitantes e, citando esta experiência de Bell para os demais participantes da reunião, iniciou-se uma conversa na qual todos começaram a ter uma certa epifania, recordando-se de alguns momentos interessantes que aquela experiência tão agradável que nos foi promovida nestes dias finais de inverno, tão excepcionalmente quentes. O que considerei, após vivenciar isto de que mesmo com a rotina tão poderosamente armada de nos retirar provisoriamente a sensibilidade da apreciação das coisas belas que nos cercam todos os dias, da percepção das pessoas bondosas, gentis e que nos querem bem, desaparecendo calidamente nas brumas do tempo em nossa memória, de que talvez, a beleza possa ter uma chance nesta batalha tão singularmente desequilibrada – se ao menos dermos uma chance a ela.
E eis, mais uma vez, um convite.
Experimentem Mariana e suas belezas neste final de semana de uma forma diferente. Observem as belezas naturais e de nossa tão única arquitetura. Apreciem a gentileza e os sorrisos que nossa gente espalha por aí. A curiosidade das crianças e de nossos turistas, dos olhos brilhantes que nós um dia tivemos, ao ver tanta cultura preservada com tanto esforço, e às vezes, com tão pouco incentivo e recursos para ter chegado até hoje, aos privilégios que temos em poder decidir, hoje, em deleitarmos.
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