Promessa de vida
Para Nivaldo Resende: Jornalista do Vale do Aço
Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “Editoriais”
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Frio no ar. Outono espalha folhas secas no chão. Novas folhas a caminho. Creio no milagre e rejuvenescimento da natureza. A ponta de minha alma anda despetalada, com folhas secas que se despedem do invólucro cíclico: nascer, florescer, morrer. Folhas esparramadas se mesclam e se unem ao solo. De volta à terra mãe, sendo terra-adubo. Vida celular, sustentação de novas flores, espinhos e folhas. Árvore troca de pelagem. Flores trocam de pétalas. Espinhos caem ressecados em voos calmos ou nevrálgicos. Vão renascer! Vão renascer! Minha alma anda desidratada; pele enrugada: são as tatuagens do tempo. Marcas no rosto postam experiências e lutas diárias no calendário. Carrego rugas com orgulho. São minhas marcas, ninguém as tira de mim. Ando de segunda a segunda numa esteira automática. Enfado necessário. Que milagre traz a tecnologia? Informação, comunicação, janelas abertas, dowlonds… Barulho rouba minha atenção. Um cão de rua choraminga fome. Abro o portão, dou água e comida. Não quer entrar, deseja andarilhar. Caminho por vales claros e escuros navegando na internet. Meu feed de notícias parece um obituário. Morrem conhecidos, famosos, parentes, amigos de fundo da cozinha. Mensagens de condolências vêm automáticas. O teclado capturou. Não capturou a tristeza do dedo que tecla em disparada. Luto de foice a foice para a tristeza não me pegar. Meu lenço anda carregado. Barulho de cá e lá. Martelete come solto os pisos estragados. Funcionário cansado, estou também. Centenas de mensagens na rede social. Os excessos arrepiam os cabelos do meu corpo, azedam meu estômago, enervam meus ânimos. Que falta faz o encontro presencial para aliviar a necessária carência da vaidade e dar um up no ego! Parece um pesadelo; não é pesadelo. É castigo mesmo! A rede está incendiada por trocas de farpas e comentários ofensivos. Ninguém está totalmente bem. Aprendi a rezar o terço-a quarta-a quinta, sem pedir nada em troca. A oração, por si, é clamor a Deus. Os velhos bons-dias são de Machado de Assis, que numa sentada de dedos causava pane e pânico. Os bons-dias são de Nivaldo Resende, que abria seu feed de notícias com doses generosas de poesia, cultura e lambadas bem dadas nos desgovernos. Doce na docilidade da vida, intenso na medida, liberto nesse mundão, que não acaba não. Que texto difícil, que fase ruim, que lentidão na chegada de vacina, Deus do céu! “Não são apenas números, são pais, mães, filhos, irmãos, tios…” Deus nos socorra e acuda! Deus nos livre e proteja! Estou ficando sem lágrimas, com temáticas emperradas ou na mesma direção: sangue e opacidade nos olhos. Nivaldo saiu a caminhar na madrugada outonal, encontrou a Lua redonda, fazendo trio com os raios do sol, e Francisco, que abriu os braços cantarolando: “bom dia cor, luz, flor, cheiro e amor do meu dia… Pois é, Francisco, esta vida num caba não! Vem em mim, mundão”, porque abril de poucas águas toca o outono com promessa de vida na cesta de frutas e flores que recebo no café da manhã.