Cartas pra Mãe: E aquela história de que aprenderíamos a lição?
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Mãe,
A senhora viu que começaram a vender restos de peixe em um supermercado? Num açougue, colocaram a placa “os ossos são vendidos e não dados”.
Me dá um nó na cuca entender certas coisas, sabe, Mãe. Entender que, no mesmo planeta, há um jogador de futebol que ganha milhões e há pessoas “comendo” ossos. Há milionários viajando pro espaço e crianças desnutridas.
Entender que, no mesmo país que exporta carne, famílias inteiras economizam pra comprar pés de frango. Entender que, enquanto a gente equilibra os nutrientes pra uma dieta da moda, milhões (sim, milhões) de pessoas não têm do que se alimentar.
A pobreza nunca deixou de existir no Brasil. Mas há muito tempo a desigualdade social não era tão extrema, tão explícita, tão escancarada. Na TV, estão ensinando a substituir o feijão e o arroz. Feijão e arroz, Mãe. E gás. E tantas outras coisas.
Não sairíamos melhores da pandemia? Não seriamos mais empáticos, pensando no outro, entendendo que (não) estamos todos no mesmo barco? Pra onde foram todas as promessas de aprendermos a lição?
Temos memória curta, Mãe. Nos esquecemos tão facilmente de tantas coisas. Nos esquecemos da tristeza de ver sinais lotados de pedidos pouco depois de virarmos a esquina. Nos esquecemos das filas para ganhar ossos minutos depois que desligamos a TV. Nos esquecemos.
E esse nó no peito continua, assim como a sensação de não poder fazer muito, diante de tanto.