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Hoje é quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Produto anunciado com preço errado. Tenho direito de levar?

Os textos publicados na seção “Colunistas” não refletem as posições da Agência Primaz de Comunicação, exceto quando indicados como “Editoriais”

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Foto: Polina Tankilevitch/Pexels

Imagine que você está navegando no site de uma loja de tecnologia e encontra um telefone de última geração anunciado por R$ 900,00. Você toma os devidos cuidados para verificar se não digitou o endereço do site errado e se aquilo não se trata de um golpe. Quando confere que a loja é confiável, rapidamente finaliza a compra.

Você fica feliz quando o pedido é confirmado, e animado por estar adquirindo um telefone moderníssimo por novecentos reais. Eventualmente, até compartilha o link com um ou dois amigos, para que não percam a oportunidade. Por precaução, tira um print da página em que o produto está anunciado.

Algumas horas depois, você recebe um e-mail da loja dizendo que se equivocou no anúncio, que o valor do telefone é R$ 9.000 e não R$ 900,00, e que por isso estaria cancelando a compra e devolvendo seu dinheiro.

Naturalmente chateado, você pensa em processar a loja, ainda que desde o princípio tivesse estranhado que aquele aparelho estivesse sendo vendido por um preço muito inferior ao comum. Mas, se o produto estava anunciado e você tem como provar, a loja é responsável por garantir a entrega daquele celular a você e a quem mais tenha comprado. Do contrário, estaria realizando propaganda enganosa. Certo?

Errado. O ordenamento jurídico brasileiro sempre protegerá o consumidor, desde que esteja agindo de boa-fé. Neste sentido, o inciso III do artigo 4° do Código de Defesa do Consumidor é enfático ao afirmar que a legislação buscará a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo “sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações de consumidores e fornecedores”.  Dessa forma, o anúncio de um produto com um preço 900% inferior a seu valor de mercado se trata de um claro equívoco da empresa, que em nenhum momento buscou tirar vantagem da situação, apenas cometeu um erro grosseiro.

Assim, obrigar que a loja entregue os aparelhos a quem fez a compra nessas circunstâncias poderia causar sérios estragos financeiros para o estabelecimento, meramente em virtude de um erro de digitação. Além disso, uma medida como essa beneficiaria aqueles que, desde o primeiro momento, compraram o produto conscientes de que o preço estava absurdamente baixo, faltando com a boa-fé. Razão pela qual, portanto, a empresa tem direito a não entregar os aparelhos vendidos, contanto que devolva o valor pago pelos clientes.

Situação diferente seria se o caso não se tratasse de erro grosseiro por parte do fornecedor. Se o mesmo celular estivesse sendo vendido a R$ 8.900, ou se na prateleira de determinado mercado um produto esteja anunciado por R$ 20,00, mas no caixa custe R$ 25,00, é dever da empresa garantir a compra pelo preço mais barato, nos termos da lei 10.692/04, que diz em seu artigo 5°: “No caso de divergência de preços para o mesmo produto entre os sistemas de informação de preços utilizados pelo estabelecimento, o consumidor pagará o menor dentre eles”.

Nesses casos, não há o que se falar em má-fé parte do consumidor. Não há como imaginar que o preço anunciado daquele produto seja decorrente de um erro da empresa, motivo pelo qual a legislação protege o consumidor, que tem o direito de exigir que seja computado o menor dos preços. Em última análise, todo caso concreto vai girar em torno da boa-fé de ambas as partes. Era possível perceber que aquele preço muito inferior foi um erro claro de anúncio da empresa? É o que magistrado se perguntará, caso tenha que julgar um processo judicial neste sentido.

Por fim, àqueles que, durante a leitura desse texto, pensaram em alegar que jamais imaginariam que houvesse um equívoco no anúncio de um celular que trazia um preço 900% mais barato que o valor de mercado, é importante destacar que ‘boa-fé’ e ‘má-fé’ são conceitos presumíveis, ou seja, o juiz pode declará-los ainda que as partes aleguem o contrário. Por via das dúvidas, é sempre bom se manter razoavelmente antenado sobre as tecnologias do século XXI.

Picture of Vítor Morato
Vitor Morato é Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto e pós-graduando em Direito Público. Instagram: @vitormorato.

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